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Suíça entra na mira do leão da receita alemã

Doris Leuthard (esq.) e sua colega de pasta de Liechtenstein, Rita Kieber-Beck, falaram sobre escândalo fiscal. Keystone

Escândalo de sonegação de impostos via Liechtenstein provoca troca de farpas entre Alemanha e Suíça, onde contribuintes alemães teriam depositado 150 bilhões de euros.

Ex-ministro alemão da Economia acusa país helvético de “proteger criminosos alemães”. Em visita a Vaduz, Dóris Leuthard defende a soberania fiscal suíça, mas prevê mais críticas.

O megaescândalo fiscal envolvendo sonegadores alemães que desviaram dinheiro dos impostos para o Principado de Liechstenstein coloca também o sistema financeiro suíço no foco das atenções da receita federal da Alemanha.

É o que sinalizam declarações feitas nos últimos dias por lideranças políticas em Berlim. “A Suíça protege criminosos alemães”, disse o ex-ministro da Economia, Hans Eichel, em entrevista ao jornal Sonntagszeitung.

Seu sucessor na pasta, Peer Steinbrück, foi mais diplomático, mas não menos incisivo. “Não se trata apenas de Liechtenstein. Estamos falando também da Suíça”.

O motivo dos ataques é que o fisco alemão perde 30 bilhões de euros por ano por sonegação. Dois terços desse dinheiro vão para a Suíça e a Áustria, informou o jornal NZZ AM Sonntag, de Zurique. A arrecadação total da Alemanha em 2007 foi estimada em 534 bilhões de euros.

Contas na Suíça

De acordo com o Sindicato dos Fiscais da Receita Alemã, instituições financeiras suíças administram depósitos no valor de 150 bilhões de euros de clientes alemães.

Segundo o jornal sensacionalista Sonntagsblick, nos bancos suíços estão depositados 3,1 trilhões de francos suíços pertencentes a clientes estrangeiros. Em 2006, a Suíça vendeu serviços bancários a estrangeiros no valor de 14,7 bilhões de francos, o que geraria 26 mil empregos.

Eichel acredita que a Suíça, mais cedo ou mais tarde, terá de ceder à pressão da União Européia (UE) e acabar com o sigilo bancário. Uma pressão que, segundo o jornal Le Temps, deverá aumentar através de iniciativas alemãs em nível europeu.

O ministro suíço das Finanças, Hans-Rudolf Merz, porém, não acredita que ocorrerão investigações na Suíça e avisa: “Nosso sigilo bancário tem sete vidas”.

Soberania fiscal

O escândalo Alemanha-Liechtenstein também foi abordado pela ministra suíça da Economia, Dóris Leuthard, em visita que fez na segunda-feira (25/02) à sua colega de pasta em Vaduz, Rita Kieber-Beck.

Segundo Leuthard, tanto Liechtenstein quanto a Suíça tentam combater a sonegação de impostos. “Mas cada estado deve poder definir e aprimorar sua legislação fiscal de forma autônoma”, disse.

Ela lembrou que a Suíça assinou um acordo de combate à fraude fiscal a UE, mas este só teria sido ratificado por 14 dos 25 países-membros do bloco – a Alemanha ainda não o assinou.

Leuthard afirmou ainda que na luta contra a lavagem de dinheiro a Suíça e Liechstenstein estão entre os Estados que adotam as diretrizes mais rígidas para manter a credibilidade de seu sistema financeiro.

Segundo a ministra, os Estados que agora atacam Liechstenstein também têm outros países na mira. “Por isso, podemos nos preparar para receber críticas”, disse.

“Métodos da Gestapo”

Enquanto o governo em Berna reage com relativa tranqüilidade às críticas, o presidente de Associação dos Bancos Suíços, Pierre Mirabaud, comparou a ação da receita alemã contra Liechtenstein com “métodos usados pela Gestapo”, a polícia secreta dos nazistas.

O fato de o serviço secreto alemão ter comprado por 4 a 5 milhões euros um DVD roubado do banco LGT Treuhand, de Vaduz, com dados sobre sonegadores alemães também foi criticado pela imprensa suíça.

“Os cidadãos trabalham metade do tempo para o Estado, o Estado vigia o contribuinte através do serviço secreto. O irritante é que os alemães ainda queiram exportar seu Estado vigilante”, escreve a revista Weltwoche, de tendência direitista.

Fim do sigilo bancário?

Segundo a revista, oásis fiscais como Liechtenstein só podem florescer porque a Alemanha é um deserto fiscal, onde o Estado embolsa, através de impostos e contribuições sociais, 53% da renda de seus cidadãos – uma das cotas mais elevadas entre os países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento (OCDE).

“Liechtenstein ou a Suíça dão mais peso à discrição e à esfera privada do indivíduo do que ao interesse do Estado em arrecadar impostos, vêem a sonegação como delito menos grave e confiam nos seus contribuintes: o dinheiro do imposto aqui não é a priori um bem do Estado e, sim, uma oferta do cidadão”, escreve o Weltwoche, atacando a “arrogância do Estado alemão”

A Suíça já fez concessões à fiscalização alemã. Ela não revela o titular da conta, mas, através de um acordo de taxação dos juros com a UE, transfere para o tesouro de Berlim um imposto na fonte (15%) sobre os rendimentos das aplicações alemãs.

Na avaliação de Roger de Weck, ex-editor-chefe do semanário alemão Die Zeit e atual colunista do Le Temps (Suíça), o sigilo bancário pode estar com os dias contados. As lideranças alemãs estariam dispostas a tudo na luta contra a evasão fiscal na Europa. A ponto de justificarem o recurso aos serviços secretos para infiltrar bancos e preparar ataques surpresas do leão da receita.

swissinfo, Geraldo Hoffmann (com agências)

No dia 14 de fevereiro, o presidente do grupo Deutsche Post (Correios), Klaus Zumwinkel, é detido sob suspeita de haver sonegado pelo menos 1 milhão de euros. Ele é solto cinco horas depois mediante pagamento de caução e renuncia ao cargo no dia seguinte.

O serviço secreto alemão teria pago 5 milhões de euros por um DVD contendo documentos sigilosos sobre supostos sonegadores de impostos clientes do banco LGT Treuhand, de Vaduz, capital de Liechstentein.

A Justiça liechtensteinense procura o informante das autoridades alemãs. Desde segunda-feira (18/02), a polícia alemã faz buscas em várias cidades. No dia seguinte, procura informações sobre um suposto sonegador cliente da filial do banco suíço UBS em Munique.

Segundo a mídia alemã, cerca de mil pessoas encontram-se na mira das autoridades. Liechtenstein critica a ação da receita alemã, que investiga um segundo banco do Principado e teria oferecido as informações contidas no DVD roubado a outros países.

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