“Trabalhador pobre é um escândalo para sociedade rica”
Os sindicatos suíços lançaram uma nova campanha pela introdução de um salário mínimo. O perito em ética econômica Peter Ulrich considera a reivindicação justa, mas defende a fixação de uma renda mínima.
Dezoito dos 25 países da União Européia já adotam salários mínimos ou regras semelhantes para combater o dumping salarial, um fenômeno que na Suíça leva trabalhadores a necessitar de auxílio social.
“Working poor” e precarização das relações trabalhistas são dois fenômenos que têm o mesmo significado: pessoas que trabalham, mas não ganham o suficiente para sobreviver. O Estado é obrigado a cobrir o furo do orçamento familiar através da assistência social.
O comércio varejista, a gastronomia e hotelaria, a construção civil e a agricultura são clássicos setores de baixos salários. Segundo o Departamento Federal de Estatísticas, 150 mil trabalhadores suíços são considerados pobres.
“O fenômeno em si é um escândalo numa sociedade que em princípio é rica”, diz Peter Ulrich, professor de Ética Econômica da Universidade de St. Gallen. Ele aponta como causa a economia de mercado, que submete a economia nacional à concorrência internacional.
“Esta dita o nível salarial competitivo, o que cada vez mais leva a salários inferiores aos custos de sobrevivência”, afirma Ulrich.
Trabalho “barato”
Segundo ele, o trabalho que não exige qualificação praticamente não vale mais nada. Essa tendência começa a ser observada também em profissões de classe média, acrescenta.
Diante a internacionalização da economia, os salários mínimos têm a função de proteger os padrões salariais nacionais. As campanhas dos sindicatos suíços já tiveram sucesso ao impedir salários inferiores a 3.000 francos no comércio, exemplifica Ulrich.
Isso porque a maioria da população considera o baixos salários do setor escandalosos, levando em conta as “margens de lucro extraordinariamente elevadas” das empresas suíças em comparação internacional.
Ulrich adverte, porém, que a reivindicação de um salário mínimo pode também se transformar num bumerangue, “se a caravana do capital de investimento passar ao largo do país”.
Um exemplo: recentemente a finlandesa Nokia fechou sua fábrica de celulares altamente rentável em Bochum (na Alemanha) e a transferiu para a Romênia. “Ao mesmo tempo, a empresa anunciou lucros recordes”, lembra Ulrich.
Por isso, ele não vê o salário mínimo como saída para escapar da armadilha da concorrência internacional por investimentos e dos desníveis salariais globais. “A solução para o futuro será uma renda mínima. Isso não é uma proposta de política econômica e sim de política social, que supõe um contrato social”, explica.
De acordo com esse princípio, todos os cidadãos que vivem cinco ou dez anos num país teriam o direito garantido a uma renda mínima, cujo valor poderia ser fixado democraticamente. Quem ganha o suficiente financia a renda mínima através da declaração de impostos.
Vantagens da renda mínima
A vantagem dessa renda mínima garantida, segundo Ulrich, é que é uma solução administrativa enxuta, que elimina qualquer estigmatização da ajuda social.
E todos ganham em termos de liberdade real. “Isso seria um solução extremamente liberal, mas os partidos liberais hoje não pensam mais liberal-socialmente e sim de autoritariamente”, constata.
Segundo Ulrich, essa renda mínima não poderia ser introduzida numa data pré-estabelecida. Ela teria de ser implementada progressivamente ao longo de, por exemplo, trinta anos.
Com isso, as contribuições aos seguros sociais se tornariam supérfluas, o que já cobria cerca de um terço dos custos. A principal fonte para financiar a renda mínima seria o aumento da produtividade da economia.
Mas isso é uma visão futurística. Ulrich presume que a idéia da renda mínima só seria aceita pelos setores “burgueses” se o Estado de bem-estar social, em conseqüência do aumento do fosso social, se tornasse realmente impagável para amplas parcelas da população.
Por isso, o professor da Universidade de St-Gallen reconhece que, no momento, essa idéia ainda é mais uma “utopia concreta” do que uma proposta pragmática. “Na Alemanha, no entanto, ela já é intensamente discutida e quase atingiu a política real”, diz.
swissinfo, Renat Künzi
Ninguém deve ganhar menos de 3.500 francos por mês ou 20 francos por hora na Suíça. É o que pede a União Sindical Suíça (USS) numa nova campanha pela introdução de um salário mínimo no país.
A reivindicação baseia-se no mínimo necessário para a sobrevivência de uma pessoa na Suíça, ou seja, 3.570 francos mensais. Trabalhadores formados teriam direito a um salário bruto de no mínimo 4.500 francos.
A USS já havia lançado uma campanha semelhante em 1998. Na época, havia pedido um salário mínimo de 3 mil francos.
Aproximadamente 200 mil pessoas trabalham na Suíça por salários que ficam abaixo da linha da pobreza. Segundo estatísticas oficiais, 11% dos trabalhadores têm uma renda bruta mensal inferior a 3.500 francos suíços.(Fonte: SGB).
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