Viticultores suíços nos arredores da Cidade do Cabo
Dois suíços expatriados produzem sua própria seleção de vinhos no "Hemel-en-aarde", um "paraíso na terra", a leste da Cidade do Cabo, na África do Sul.
Uma estrada de terra castanho-avermelhada é o último trecho da viagem para as vinhas de Jean-Claude Martin e Kaser Christoph, situada a alguns quilômetros da pitoresca cidade costeira de Hermanus.
Um portão com bandeiras da África do Sul e da Suíça indica a entrada para a fazenda de produção de vinhos Creation Wines. Por estar situada a 350 metros de altitude, pode-se sentir a diferença de temperatura e o frio do local. No entanto, ainda está quente para um dia de inverno na África do Sul.
Os sons dos sapos e grilos, vindos do reservatório de água próximo, saúdam os visitantes. Pairam no ar da tarde o perfume da sala de degustação e o cheiro dos jardins ao redor da adega.
JC, como Martin é chamado por seus funcionários, encontrou as condições ideais para a viticultura neste pedacinho do paraíso.
“Foi amor à primeira vista”, lembra-se Martin. Juntamente com outro suíço, seu parceiro nos negócios, ele comprou as terras em 2002.
Ovelhas pastavam nesta terra virgem antes de os dois produtores de vinho decidirem transformá-la em vinhedos. O terreno fica entre duas cadeias de montanhas que recebem, ocasionalmente, uma pincelada de neve na estação fria.
“As condições meteorológicas são estáveis ao longo do ano, mas as temperaturas na fazenda podem cair abaixo de zero durante a noite, o que é bom para a vinha”, diz Martin.
Os 22 hectares produzem hoje cerca de 200 toneladas de uvas e 120 mil garrafas de vinho por ano. Para as dimensões da África do Sul, é uma produção pequena, mas notável se comparada com a da Suíça.
O vale está situado no meio de um território montanhoso e longe do barulho da cidade. Neste lugar paradisíaco, o silêncio só é interrompido pelo som de um carro distante de um fazendeiro ou pelo zumbido do sistema de ventilação do porão.
Produção
Martin reconhece que, do ponto de vista econômico, cultivar mais de dez variedades de uvas para vinhos brancos e tintos, incluindo o Sauvignon Blanc, o Chardonnay, o Pinot Noir, o Syrah e o Merlot num terreno deste tamanho, pode não ser a melhor coisa.
“Mas o que conta é a qualidade. Hoje em dia estamos preocupados em descobrir quais as melhores variedades adaptadas a este local”, explica.
Os primeiros vinhos só foram produzidos há quatro anos e, na safra 2009-2010, a fazenda atingiu seus níveis máximos de produção.
Martin e Kaser estão cientes de que o processo pode demorar até dez anos para que os investimentos comecem a dar retorno. Contudo, desde sua chegada até hoje, não houve um dia sequer no qual Martin lamentasse a decisão de deixar a Suíça e se estabelecer no país de sua esposa sul-africana.
O empresário
Martin, hoje com seus 37 anos, tem consciência do risco assumido como jovem empresário. Para ele, foi importante ter dado este passo. “Você não sabe como as coisas vão funcionar ao final, mas nós vivemos uma grande experiência por aqui”, diz.
Apesar das tensões entre negros e brancos, da enorme diferença social entre ricos e pobres e dos problemas que assolam o país, Martin é bastante otimista quanto ao futuro da África do Sul.
Desde que se estabeleceu no país, o empresário suíço criou oportunidades de empregos que podem alimentar cerca de 30 famílias da região.
“Sem fazer distinção entre pessoas de diferentes origens, empregamos pessoas da região nas vinhas, na adega, em nossas instalações de degustação de vinho. É o trabalho deles que conta. Pago salários justos e, em vez de utilizar máquinas, mantenho o trabalho manual nas vinhas e adegas”, explica Martin.
Suíço ou sul-africano?
Martin diz conhecer outros vinicultores suíços da região, mas não sente necessidade especial de estreitar laços com eles. “Todos nós temos nossas próprias vidas atarefadas e nossos próprios clientes”, comenta.
O objetivo de Martin e Kaser é o mercado internacional. Eles já exportam o vinho para dez países. A adega de “Hemel-en-aarde” atrai também um número crescente de apreciadores do vinho sul-africano.
Como vinicultor e empreendedor, Martin sente um maior grau de independência na região da Cidade do Cabo do que na entrelaçada sociedade suíça, onde os projetos podem ser bloqueados pela demora dos procedimentos administrativos e denúncias de vizinhos invejosos. Ele está convencido de que pode viver em muitos outros lugares no mundo, pois ele se adapta facilmente a novos ambientes.
Ele tem uma visão pragmática quando se trata da Copa do Mundo de Futebol. “Acho que minha família não torcerá para a África do Sul nem para a equipe suíça. Juntamente com nosso filho, vamos torcer para a Espanha”, comentou às vésperas do Mundial, quando swissinfo.ch o visitou.
Urs Geiser na Cidade do Cabo, swissinfo.ch (com participação de Stéphane Gabioud, RSR)
(Adaptação: Alexandre Hill-Maestrini)
De acordo com os dados de 2009 do Ministério das Relações Exteriores da Suíça (EDA), existem pouco mais de 9.000 suíços vivendo na África do Sul, sendo mais de dois terços são cidadãos com dupla cidadania. Entre as comunidades suíças do continente Africano, a comunidade da África do Sul é a maior.
Na segunda metade do século 16, os primeiros suíços que chegaram na região da Cidade do Cabo eram soldados e funcionários da Companhia Holandesa das Índias Orientais. Ao longo dos séculos ocorreram várias ondas de imigração, dentre os que chegaram vieram missionários, cientistas e empresários. Antes de voltar a decrescer, a comunidade suíça de expatriados na África do Sul atingiu seu ápice na década de 70.
Jean-Claude Martin, 37, estudou na escola da cidade de Biel/Bienne no noroeste da Suíça alemã. Ele fez seu treinamento como produtor de vinho tanto na parte francesa como na parte alemã da Suíça.
No final de 1990 Martin fez fama pessoal com um pinot noir de uma vinha no Lago de Neuchâtel.
Em 2002, Martin e seu sócio Christoph Kaser, compram um terreno na região de “Hemel-en-aarde” a 120 quilômetros a leste da Cidade do Cabo para fundar a Creation Wines.
Em 2004, Martin muda-se para a África do Sul com sua esposa sul-africana, com quem tem dois filhos.
Em 2006, colhem a primeira mas ainda pequena safra.
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