A dura batalha pela visibilidade das mulheres nas ruas de Genebra
![imagem](https://www.swissinfo.ch/content/wp-content/uploads/sites/13/2025/01/nom-rues-feminisees.jpg?ver=211f76b0)
Genebra está em uma encruzilhada: um debate acirrado sobre tradição, inclusão e visibilidade das mulheres na história paira sobre a cidade após autoridades municipais pressionarem para renomear ruas com nomes femininos.
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Nos últimos cinco anos, a cidade de Genebra trabalhou para ter mais nomes femininos em suas ruas. O esforço foi desencadeado por uma constatação preocupante: de todas as ruas com nomes de pessoas na cidade, apenas 7% eram dedicadas a mulheres. Hoje, o número dobrou para 15%, colocando Genebra à frente de cidades como Paris (8,6%) e Berlim (12,1%), mas ainda atrás de Estocolmo (19,5%) ou Madri (18,7%).
Mas os esforços da cidade não aparecem apenas em números. O que torna a estratégia de Genebra diferente é o foco em renomear ruas no centro histórico. A medida se afasta da prática comum de somente dedicar nomes de mulheres a ruas em áreas periféricas ou recém-desenvolvidas.
De acordo com Frédéric Giraut, professor de geografia na Universidade de Genebra, essa abordagem envia uma mensagem mais forte. “Nem todas as ruas são iguais em termos de visibilidade”, ele disse à SWI swissinfo.ch em entrevista. Mas também torna o processo mais controverso, pois implica a renomeação de ruas antigas, gerando resistência nas pessoas apegadas à história da cidade, além de implicar mais ajustes administrativos do que apenas nomear uma nova rua.
“É por isso que a maioria das cidades evita essa estratégia”, acrescenta.
Para Laure Piguet, uma das historiadoras envolvidas no projeto, essa era a única maneira de realmente causar uma mudança. “Não queríamos relegar as mulheres a becos, ruas sem saída e bairros remotos”, ela diz.
O projeto lançado em 2019 começou como uma iniciativa temporária, para conscientizar sobre a disparidade de gênero nas ruas de Genebra. Em parceria com uma associação feminista, l’Escouade, a cidade adicionou cem placas de identificação celebrando mulheres ao lado das placas oficiais de rua.
“Isso desencadeou um debate sobre a invisibilidade das mulheres no espaço público”, diz Heloïse Roman, que liderou o projeto e se lembra dele como um sucesso.
Como resultado, o parlamento local decidiu renomear 100 ruas em homenagem a mulheres em todo o cantão (unidade administrativa suíça, equivalente a um estado), dessa vez de maneira permanente. Seguindo a nova lei, a cidade de Genebra pretendia renomear 30 de suas ruas. Para serem elegíveis para nomeá-las, as mulheres deveriam ter morrido há pelo menos dez anos e terem contribuído para a história ou influência da cidade.
![Placa em uma rua de Genebra](https://www.swissinfo.ch/content/wp-content/uploads/sites/13/2024/12/100elles-20190624_Avenue_Elma_Palme-Dutt_-_Avenue_de_la_Jonction_160810.jpg?ver=fabe1560)
Expandindo o escopo
Piguet e outros historiadores encarregados de propor nomes decidiram repensar esse último critério para incluir não apenas figuras de destaque, mas também pessoas que contribuíram anonimamente para a história de Genebra.
“No passado, as ruas foram nomeadas em homenagem aos autores de feitos militares, descobertas científicas ou obras-primas artísticas”, diz o historiador. “Mas ao longo da história, tem sido difícil para as mulheres, especialmente aquelas de origem social mais vulnerável, participar dessas atividades celebradas.”
“Para representá-las, tivemos que ampliar o escopo do que era considerado importante para a cidade”, ela explica. “Por exemplo, nomeamos uma rua em homenagem a três lavadeiras que morreram em 1913, em um acidente em seu barco-lavanderia. A morte dessas mulheres levou à criação de barcos-lavanderia mais seguros e, nesse aspecto, foi essencial para o desenvolvimento de Genebra.”
A cidade também priorizou a diversidade, selecionando figuras como Annie Jiagee, advogada e ativista ganesa, e a jornalista Marie-Claude Leburgue, defensora dos direitos LGBTQ.
Crítica e resistência
A abordagem inclusiva foi recebida com reação negativa entre certos historiadores, políticos e associações locais. Críticos como a historiadora Isabelle Brunier argumentam que alguns novos nomes de ruas, particularmente aqueles com origens estrangeiras, são difíceis de pronunciar, e questionam se figuras com breves conexões com a cidade merecem reconhecimento.
“Eles escolheram pessoas que vieram dos Estados Unidos ou da África, defensoras da causa lésbica, pessoas que trabalharam talvez seis meses em Genebra, em uma certa comissão das Nações Unidas e que ninguém conhece. É isso que chamamos de contribuir para a história de Genebra?”, ela pergunta.
Objeções práticas também surgiram. Moradores expressaram preocupações sobre os custos logísticos de mudança de endereço, interrupções comerciais e potenciais provocações ligadas a certos nomes. Por exemplo, moradores da Rue Sautter se opuseram à renomeação de sua rua em homenagem a Henriette Saloz-Joudra, a primeira mulher de Genebra a abrir um consultório médico, argumentando que seu sobrenome lembrava um insulto francês.
Além dos desafios logísticos, os defensores da tradição histórica lamentam a perda de nomes de ruas ligados ao passado de Genebra. “Rue de la Scie (Rua da Serra) é uma lembrança das serrarias históricas de Eaux-Vives (um bairro no centro de Genebra)”, diz Brunier. A rua mencionada, que seria renomeada para rue Annie Jiaggee, acabou seguindo com seu nome original.
O papel do sexismo
Por trás de muitas objeções está a resistência à ideia de que as mulheres devem ser representadas no espaço público. Cathy Jaquier, uma vereadora eleita pelo Partido Popular Suíço (SVP) de direita, tem feito uma oposição forte à feminização das ruas.
“Estamos apagando o passado porque queremos dar destaque às mulheres em detrimento dos homens que poderiam ter sido mais adequados”, diz ela, acrescentando que se considera feminista, mas que considera a iniciativa dogmática e sem serventia para as mulheres.
Brunier também insiste que é feminista, mas acha que nomes de ruas não são importantes. “Meninas não seguem os passos das mulheres que veem nas placas de rua”, ela argumenta, acrescentando que as que ela conhece estão mais interessadas em princesas de contos de fadas. Piguet, que trabalhou no projeto original, está convencida do contrário. “Quando as meninas veem nomes de mulheres nas ruas, isso mostra a elas o que elas podem alcançar”, ela diz.
Quando se envolveu no projeto, Piguet não tinha ideia de que a iniciativa seria recebida com tanta hostilidade. “Eu pensei que era uma ideia mainstream”, ela relembra.
Piguet e seus colegas historiadores do grupo de trabalho da cidade frequentemente se perguntam qual o papel do sexismo na reação que enfrentaram. “Fomos chamadas de ‘irracionais’ e nossas habilidades foram questionadas. Isso teria acontecido se fôssemos homens?”, ela se pergunta.
Um passo à frente, mas ainda uma longa jornada adiante
Apesar das controvérsias, o grupo comemorou a finalização dos trabalhos com sucesso em dezembro de 2024. A cidade renomeou uma praça homenageando Grisélidis Réal, trabalhadora do sexo e escritora, superando a resistência de dois bairros separados. Com o projeto inicial terminado, provavelmente a cidade vai focar no futuro em homenagear as mulheres nomeando novas ruas, ao invés de renomear as antigas, opina Roman.
Apesar de seus esforços, Genebra continua longe de atingir a paridade de gênero em suas ruas. Um relatório da European Data Journalism Network alerta que, no ritmo atual em que as cidades se desenvolvem, mesmo que todas as novas ruas recebessem nomes de mulheres daqui em diante, levaria séculos para atingir a paridade.
Edição: Virginie Mangin/fh
(Adaptação: Clarissa Levy)
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