“O Irã não fará concessões em questões nucleares se não for forçado”
Em Genebra, representantes do Reino Unido, França e Alemanha – os três signatários europeus (E3) do acordo nuclear iraniano de 2015 – se reuniram mais uma vez com representantes do Irã para discutir as crescentes preocupações sobre o programa atômico do país muçulmano.
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Como ativista iraniana, eu já vi essa cena várias vezes. Reuniões marcadas por causa de outras reuniões. Negociações sem fim enquanto os mulás [clérigos do alto escalão considerados lideranças muçulmanas], se aproximam cada vez mais da construção de uma bomba nuclear. Em seu último relatório, de novembro de 2024, a Agência Internacional de Energia Atômica declarou que a República Islâmica agora detém urânio enriquecido suficiente para abastecer diversas ogivas nucleares se for enriquecido ainda mais.
A reunião do dia 13 de janeiro dependia do otimismo coletivo sobre a possível reimplementação do Plano de Ação Global Conjunto (JCPOA), o acordo nuclear assinado entre as potências mundiais e o regime iraniano.
Mas agora, até mesmo o E3 [referência às potências europeias França, Itália e Alemanha], que ainda não aceitou que o acordo nuclear está há muito tempo para ser reativado, levantou dúvidas sobre a viabilidade de um tratado.
Em uma conferência anual de embaixadores franceses focada nos objetivos de política externa para 2025, o presidente francês Emmanuel Macron descreveu o Irã como o principal “desafio estratégico e de segurança” para a França e a Europa.
“A aceleração do programa nuclear nos leva quase ao ponto sem retorno”, disse Macron.
A urgência da situação não é o único parâmetro que mudou.
A influência do regime iraniano em tais negociações só diminuiu como resultado de perdas sérias para o chamado Eixo da Resistência, que ocorreram na esteira da revolta de 2022 e de outras manifestações civis locais. No entanto, não há nenhum indício de que a postura de Teerã nas negociações nucleares tenha mudado de direção.
Muitos críticos e oponentes do regime iraniano, incluindo o National Council of Resistance of Iran (NCRI), têm argumentado por muitos anos que os mulás, alto escalão do clero muçulmano, usam as negociações diplomáticas como uma tática para atrasar ações firmes da comunidade internacional. Esta conclusão tem sido evidenciada pela falta de progresso significativo em todas as rodadas de negociações nucleares desde que o JCPOA foi escanteado e, sem dúvida, até mesmo pelas negociações que levaram a esse acordo em primeiro lugar.
Devemos nos preocupar com a repetição do mesmo padrão. Não há praticamente nenhuma chance dessas negociações produzirem um avanço sobre o futuro do JCPOA ou a questão nuclear de forma mais ampla, mas é quase certo que elas levarão alguns formuladores de políticas ocidentais a adiar a questão e recomendar mais e mais negociações, mesmo que o Irã potencialmente busque mais e mais atividades ilícitas.
Pior ainda, essas negociações ameaçam servir como uma distração para os vários outros problemas que afligem a República Islâmica e como uma das respostas mais perigosas do regime. O anúncio das negociações ocorreu em um momento em que o Líder Supremo do Irã, Ali Khamenei, não escondia os esforços de seu regime para recuperar algum poder na Síria após a queda de Bashar al-Assad. Isso enquanto o NCRI relatava que o Irã foi responsável em 2024 por Link externomais de 1.000 execuçõesLink externo, incluindo 34 mulheres, sete jovens e 119 pessoas da minoria étnica Baluch – maior número dos últimos 30 anos e que ilustra a tendência do regime em suprimir a dissidência por meio da intimidação pública.
Neste cenário, refletindo sobre a resistência patológica de Teerã a mudanças políticas significativas, o E3 não deve desperdiçar seu tempo com mais negociações, a menos que pretenda mudar sua abordagem drasticamente. Ou seja, antes de se aproximarem da mesa de negociações, os países precisam aumentar a pressão sobre o regime iraniano, por exemplo, expandindo sanções, fechando instituições ligadas ao Irã no Ocidente e classificando o Corpo da Guarda Revolucionária Islâmica, a agência militar e de contrainteligência iraniana, como uma organização terrorista.
Esse tipo de medida, somado a exigências mais assertivas e diretas, incluindo o fim de todas as execuções na República Islâmica, indicaria ao regime e ao mundo que o E3 entende o fato essencial sobre a posição do Irã nas discussões internacionais: que o regime nunca fará concessões por conta própria e precisa ser forçado a fazê-lo.
Edição: Virginie Mangin/fh
(Adaptação: Clarissa Levy)
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