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“As conversões ao Islã podem ser vistas como algo suspeito”

Muçulmanos orando em uma mesquita.
A oração muçulmana, como vista aqui na quebra do jejum no Centro Comunitário Islâmico em Regensdorf, segue um ritual muito preciso que deve ser aprendido antes de ser praticado. KEYSTONE/© KEYSTONE / MICHAEL BUHOLZER

Um estudo se debruça pela primeira vez sobre o apoio oferecido às pessoas que se convertem ao Islã na Suíça. Um suporte é necessário, principalmente para desconstruir determinados conhecimentos que podem ser obtidos na internet, sublinha o pesquisador Federico Biasca.

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Em teoria, para se converter ao islamismo, basta pronunciar duas vezes, diante de testemunhas muçulmanas, uma profissão de fé (chahada) na qual se reconhece que “não há outro deus além de Alá e que Maomé é seu profeta”. Mas, claro, há outras coisas para saber e aprender.

Na Suíça, as pessoas que desejam se converter geralmente recorrem às várias associações muçulmanas. Em um estudo inovador, Federico Biasca, pesquisador do Centro Suíço para o Islã e SociedadeLink externo (CSIS) da Universidade de Friburgo, analisou as atividades oferecidas por quinze associações muçulmanas na Suíça latina.

swissinfo.ch: O que sabemos sobre o número de convertidos na Suíça e seu perfil?

Federico Biasca: Não há estatísticas precisas sobre conversões ao Islã e a outras religiões. Deduzimos esse número a partir do número de pessoas que se declaram como pertencentes ao Islã suíço, mas que não têm origem migratória. Isso corresponderia a 2 a 3% dos muçulmanos na Suíça.

Não há perfis típicos. Mas o que posso dizer com base nas entrevistas que realizei é que a maioria das pessoas que batem à porta das associações muçulmanas são adultos jovens ou muito jovens e, às vezes, menores de idade também. Há uma proporção igual de homens e mulheres.

Clique no link abaixo para ler o estudo integral de Federico Biasca (em francês)

«La prise en charge des personnes converties à l’islam par les associations musulmanes en Suisse latine»

Download:«La prise en charge des personnes converties à l’islam par les associations musulmanes en Suisse latine»

swissinfo.ch: O que atrai essas pessoas ao Islã?

F.B.: Constatamos que muitas pessoas se interessam pelo Islã porque conhecem muçulmanos em seu círculo, e que entram em contato com o Islã por um ângulo mais social. Outras adotam uma abordagem mais intelectual, estudando os textos e viajando para países muçulmanos. Portanto, existem vários caminhos de acesso ao Islã.

Como outras religiões, o Islã também pode responder às perguntas que os jovens, em especial, têm sobre questões importantes, como o sentido da vida.

swissinfo.ch: Estudos na Europa mostram que a proporção de convertidos é maior no Islã radical. Você também observa isso na Suíça?

F.B.: Não tenho dados precisos, mas é, de fato, o que a pesquisa indica. Há 20 ou 30 anos, os convertidos ao Islã eram principalmente pessoas interessadas em versões místicas e intelectuais do Islã, como o sufismo. Hoje, elas também se interessam por versões políticas e, às vezes, conservadoras do Islã.

Nota-se que o número de convertidos é alto entre as correntes conservadoras e está desproporcionalmente representado entre grupos radicais em relação à população muçulmana em geral. E isso também afeta a Suíça.

Um homem cruzando os braços
Federico Biasca

swissinfo.ch: Daí a importância das associações, que podem atuar como salvaguardas…

F.B.: Sim. As associações certamente não podem resolver tudo, mas são espaços físicos onde os convertidos podem encontrar outros muçulmanos e criar formas de sociabilidade, o que é importante. Elas também ajudam as pessoas convertidas a viver sua nova fé em um contexto suíço.

Eles também têm um papel a desempenhar na desconstrução do que pode ser transmitido pela internet e redes sociais, das quais os jovens são ávidos consumidores. Não é incomum tropeçar em versões radicais do Islã quando se busca informações nesses canais.

Líderes de associações me disseram que pessoas que querem se converter podem aparecer com uma gama de conteúdos encontrado na internet, e então é necessário fazer todo um trabalho de desconstrução a fim de evitar desvios radicais.

swissinfo.ch: Na prática, esses responsáveis frequentemente são imãs.

F.B.: Neste estudo, uso o termo “agentes de conversão”, porque parece que as associações identificam as pessoas-chave para orientar os candidatos à conversão. Nem todos têm as competências necessárias. Em treze das quinze associações analisadas, são os imãs que assumem esse papel. O que também constitui um fardo adicional em suas agendas já bastante ocupadas.

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Photo de groupe dans une mosquée

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swissinfo.ch: Muitas vezes se pensa que a conversão ao Islã é simples, mas seu estudo mostra que esse não é necessariamente o caso…

F.B.: O ritual de entrada é relativamente simples. Basta pronunciar duas vezes a profissão de fé diante de testemunhas muçulmanas. Mas há uma grande diferença entre a simplicidade do ritual e o que a pessoa realmente precisa adquirir em termos de competências dogmáticas e práticas.

É um processo que pode levar muito tempo. É preciso conhecer os principais textos e preceitos do Islã e ser capaz de agir como uma pessoa muçulmana. O aprendizado da oração, em particular, não é tarefa fácil, pois é altamente codificado, com gestos e invocações precisas em árabe.

swissinfo.ch: A pessoa que deseja se converter é primeiramente acolhida. Verifica-se se ela tem “boas motivações”. Do que estamos falando concretamente?

F.B.: Alguns agentes de conversão tentarão testar a sinceridade da intenção. A pessoa deve estar realmente motivada por um interesse na religião. Os agentes de conversão são particularmente atentos às chamadas conversões instrumentais, cujo objetivo é obter algo. O exemplo mais frequentemente mencionado é o de uma conversão feita apenas para poder se casar com uma pessoa de fé muçulmana.

swissinfo.ch: No entanto, as recusas são raras…

F.B.: De fato, porque as motivações também podem ser trabalhadas. Se o relato que a pessoa que deseja se converter apresenta ao agente de conversão não corresponder aos padrões da associação, o agente de conversão a ajudará a desenvolver um relato mais alinhado com os objetivos da associação.

swissinfo.ch: Quando a conversão passa a valer?

F.B.: Não há exame escrito ou diploma. Como a maior parte do acompanhamento se dá bilateralmente, isso leva tempo. São sobretudo as habilidades práticas que são exigidas: saber quando a pessoa é capaz de respeitar os cinco pilares do Islã e de praticar, notadamente, a oração.

swissinfo.ch: As conversões nem sempre são bem recebidas pela sociedade e, principalmente, pelas famílias.

F.B.: Isso é algo que os convertidos costumam relatar aos agentes de conversão. Pode haver tensões, principalmente em relação à conversão de pessoas mais jovens.

De modo geral, as conversões podem ser vistas como algo suspeito na sociedade secular de hoje. As conversões ao Islã levantam ainda muitas questões por se tratar de uma religião que tem sido objeto de muito debate político e na mídia nos últimos anos. Quando um jovem deseja se converter, seus entes queridos podem temer que ele esteja se dirigindo a versões radicais.

É preciso trabalhar essas questões para aliviar as tensões. Considero importante que as associações muçulmanas levem em conta a possibilidade de incluir os familiares no acompanhamento oferecido aos convertidos, o que não é feito de maneira sistemática hoje em dia. Elas deveriam fazer isso mais, especialmente quando os jovens vivem sob o mesmo teto que os pais.

swissinfo.ch: E do lado dos muçulmanos de nascimento, como é a recepção?

F.B.: Os responsáveis das associações tendem a enfatizar que os convertidos são bem ou muito bem recebidos. Mas vários estudos mostram que, às vezes, as coisas são um pouco mais complexas, no sentido de que sabemos que os convertidos têm de passar bastante tempo se justificando, inclusive dentro das associações. Eles não são imediatamente considerados muçulmanos. Pode haver atritos. Portanto, as boas-vindas podem ser entusiásticas ou sobremaneira frias.

swissinfo.ch: Seu estudo também mostra que as associações são acolhedoras, mas não buscam ativamente a conversão...

F.B.: De fato, parece que não existe nenhuma forma de proselitismo. Trata-se mais de receber pessoas que batem à porta das associações. Mas sabemos que, no Islã, há correntes que são mais missionárias do que outras, inclusive na Suíça. Mas esse não é o caso das associações que estudei.

swissinfo.ch: Seu estudo diz respeito apenas à Suíça latina. Os resultados poderiam ser diferentes se ele fosse estendido à Suíça germânica?

F.B.: Penso que este estudo pode ser considerado representativo, pelo menos quanto aos desafios que a conversão levanta para as associações, ou seja, a necessidade de se organizar para saber como melhor acompanhar as pessoas que se converteram. Tudo sugere que, se analisássemos todas as outras associações muçulmanas na Suíça com características semelhantes às do meu grupo de amostra, os desafios seriam os mesmos.

swissinfo.ch: Houve algo que o surpreendeu em seu estudo?

F.B.: Como este é um estudo exploratório, tudo me surpreendeu um pouco. Até agora, pouca atenção havia sido dada ao aspecto institucional da conversão ao Islã. Devo admitir que não achei que as associações levassem o fenômeno da conversão tão a sério. Existe uma forma de responsabilização, já que elas desenvolveram um discurso e atividades direcionadas a essa população específica. Isso é algo digno de nota.

Adaptação: Karleno Bocarro

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