Morre opositor preso na Venezuela entre denúncias de “crise repressiva” após eleições
Um militante da oposição na Venezuela faleceu nesta quinta-feira (14) sob custódia das autoridades, em meio a denúncias de uma “crise repressiva” após a contestada reeleição do presidente Nicolás Maduro.
Jesús Martínez, de 36 anos, morreu em um hospital de Barcelona (estado de Anzoátegui, leste) devido a um problema cardíaco, associado a complicações por uma diabetes tipo II. No dia anterior, sua família havia denunciado o estado crítico de uma perna com necrose, que precisava ser amputada.
Ele era militante do partido Vente Venezuela, liderado pela opositora María Corina Machado, que denuncia fraude na proclamação de Maduro e assegura que seu candidato, Edmundo González, venceu nas eleições de 28 de julho.
“Isto é um crime, é um assassinato”, disse à AFP Machado, que vive na clandestinidade.
“Os próprios companheiros que estavam presos imploraram para que o levassem a um hospital, sua mãe passou dias e dias rezando para que o levassem. Quando chegou ao hospital (…) ele já praticamente não tinha possibilidade de salvação”, acrescentou a opositora, que em comunicado no X responsabilizou Maduro pelo ocorrido.
Martínez foi detido em 29 de julho, poucas horas após a contestada proclamação de Maduro, que a oposição e diversos países do mundo não reconheceram, gerando protestos severamente reprimidos.
Ele fazia parte do grupo de testemunhas que a oposição organizou para monitorar os votos, e sua prisão foi considerada política.
Ele foi preso “sem ordem de busca e apreensão e sem motivo algum”, relatou Machado. “O transferiram para celas desumanas em Anzoátegui, foi severamente maltratado e mantido em condições de higiene tão precárias que desenvolveu necrose em ambas as pernas”.
“Os médicos viram as pernas gangrenadas, disseram que era preciso amputá-las, mas com poucas chances de sucesso”, explicou.
– “Um número enorme” –
Os protestos pós-eleitorais também resultaram em 28 mortos e mais de 200 feridos, segundo o procurador-geral da Venezuela, Tarek William Saab, que inicialmente mencionou mais de 2.400 detidos, incluindo menores de idade.
Saab, acusado de servir ao chavismo, disse esta semana à AFP que “muitos já foram libertados”, embora sem fornecer números exatos. O presidente indicou pouco antes que “se houver algum caso a retificar e revisar, [peço] também que se faça justiça”.
A ONG Foro Penal – que registra os detidos por razões políticas – contabilizou 1.979 presos.
É “um número enorme”, disse Alfredo Romero, presidente do Foro Penal, que monitora os presos políticos. “Estamos falando do número mais alto de presos políticos no século XXI, o mais alto de presos políticos em todo o continente americano”.
A maioria dos presos na crise pós-eleitoral encontra-se nas prisões de segurança máxima Tocorón (Aragua) e Tocuyito (Carabobo).
Antes de 28 de julho, data das presidenciais, o Foro Penal tinha registrado 305 presos políticos.
Desde 2014, ao menos uma dúzia de “presos políticos” faleceu sob custódia do Estado, segundo ativistas.
– “Mãos no coração” –
Entre as prisões confirmadas pelo Foro Penal desde 29 de julho, dia em que estouraram os protestos pela reeleição de Maduro, há 69 adolescentes e 10 pessoas com algum tipo de deficiência.
Gonzalo Himiob, vice-presidente do Foro Penal, destacou que 10 dos detidos têm deficiências, como um jovem de 17 anos no espectro autista e outro de 27, surdo, que não sabe ler, escrever ou se comunicar em língua de sinais.
Saab afirmou que os adolescentes presos estavam em instituições para menores e “com seus direitos humanos assegurados”. “Na Venezuela, crianças não ficam detidas, isso é mentira”, insistiu.
Um grupo de cerca de cem familiares de detidos se reuniu nesta quinta-feira em frente à procuradoria para pedir a Saab sua libertação. “Que coloque as mãos no coração e veja o caso, que são jovens inocentes”, disse à AFP Jenny Barrios, cujo filho de 22 anos foi preso na oficina mecânica onde trabalhava em Maracaibo (estado de Zulia, oeste).
Além do aumento das detenções, há violação da presunção de inocência, negativa ao direito de defesa particular e falta de acesso aos detidos, informou Romero.
“O mais característico é a quantidade de pessoas que passaram a ser presos políticos, estamos falando de seis vezes mais do que a quantidade inicial de presos políticos”, detalhou o defensor de direitos humanos.
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