Uma medicina que considera questões de gênero também beneficia os homens
Aumentar a diversidade de gênero em pesquisas médicas e no desenvolvimento de medicamentos é uma das apostas para resolver a falta de conhecimento sobre a saúde das mulheres. Mas entender as diferenças de gênero na medicina também beneficiará os homens.
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O corpo masculino tem sido o modelo padrão para pesquisas e para o desenvolvimento de novos medicamentos ou vacinas. Muitos remédios que tomamos hoje foram testados apenas em animais machos ou em humanos do sexo masculino. Por cerca de 15 anos, mulheres em idade fértil foram impedidas de participar de ensaios clínicos de fase inicial, após decisões judiciais dos Estados Unidos. Restrições semelhantes vigoraram em outros países até a década de 1990.
Mesmo com novas medidas que encorajam e até mesmo exigem diversidade de gênero em ensaios clínicos, as mulheres ainda são sub representadas em muitas áreas da pesquisa biomédica. Algumas das razões: preconceito, preocupações com segurança, custos e simplesmente “a maneira como sempre fizemos as coisas” explicam por que as mulheres seguem marginalizadas.
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Desenvolvimento de medicamentos passa por revisão de sexo e gênero
Não há dúvida de que a desigualdade de gênero no mundo médico tem sido uma má notícia para a saúde das mulheres. Mais mulheres são diagnosticadas incorretamente ou medicadas em excesso porque as ferramentas de diagnóstico e os medicamentos não foram desenvolvidos pensando em seus corpos. Muitas mulheres grávidas param de tomar seus medicamentos regulares porque não sabem se são seguros para elas ou para o feto. Também são as mulheres que relatam com mais frequência efeitos colaterais adversos de medicamentos disponíveis no mercado.
Buscando resolver esses problemas históricos, vemos agora um movimento amplo que visa integrar diferenças de gênero e sexo no atendimento aos pacientes, diagnósticos e desenvolvimento de medicamentos. Esses esforços devem ajudar a garantir que os medicamentos disponíveis sejam seguros e eficazes para as mulheres.
Mas a medicina baseada em gênero não beneficiará apenas as mulheres. Ao ignorar as diferenças de sexo (biologia) e gênero (identidade) na medicina e no desenvolvimento de medicamentos, também fizemos um desserviço aos homens. O foco nos homens em ensaios clínicos deixou buracos enormes em nossa compreensão de doenças que afetam tanto mulheres quanto homens.
Este é o caso, por exemplo, da esclerose múltipla. Pesquisadores vêm tentando há décadas entender o que causa essa doença debilitante, que afeta cerca de 2,9 milhões de pessoas no mundo, acometendo cada vez mais pessoas. As mulheres correm um risco três vezes maior de contrair a doença do que os homens. Os hormônios masculinos ou a gordura corporal dos homens podem ser chaves para compreender melhor a doença?
Da mesma maneira, a doença de Parkinson, que afeta o sistema nervoso, atinge desproporcionalmente os homens, mas, novamente, os pesquisadores não têm certeza se isso se deve à genética ou a fatores ambientais, como exposição a pesticidas.
Há também algumas doenças em que os homens são marginalizados na pesquisa. Carole Clair, que chefia a unidade de saúde e gênero no Centro Universitário de Medicina Geral e Saúde Pública (Unisanté) em Lausanne, destaca que a maioria das intervenções de saúde mental são adaptadas para mulheres porque as estatísticas mostram que as mulheres sofrem mais de depressão, ansiedade e outras condições de saúde mental.
“Os homens também sofrem de problemas de saúde mental, mas geralmente os casos são subnotificados”, disse Clair. “Se continuarmos a fazer a maioria das pesquisas de medicamentos antidepressivos em mulheres, nunca descobriremos as especificidades masculinas.”
As desigualdades de gênero em saúde se tornaram ainda mais visíveis durante a pandemia da Covid-19. As taxas de mortalidade por Covid foram maiores para homens do que para mulheres. As mulheres, no entanto, são mais acometidas com a Covid longa. Além disso, as mulheres relataram mais efeitos colaterais adversos das vacinas da Covid-19. Identificar essas diferenças pode auxiliar os profissionais de saúde a definirem as melhores condutas para cada paciente.
É visivelmente necessário corrigir a desigualdade de gênero e incluir mulheres em pesquisas básicas bem como em ensaios clínicos. Mas não devemos ver isso apenas como uma forma de melhorar a saúde das mulheres, mas sim a saúde de todos.
Edição: Virginie Mangin/fh
(Adaptação: Clarissa Levy)
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