“A Europa precisa falar a verdade sobre as prisões”
Encarregado no ano passado pelo Conselho da Europa de investigar as prisões secretas da CIA, o senador suíço Dick Marty reage às revelações feitas por George W. Bush.
O presidente americano admitiu que pessoas suspeitas de apoiarem o terrorismo foram interrogadas e mantidas presas fora dos EUA. Dick Marty pede que países europeus falem a verdade sobre o caso.
Na quarta-feira (6 de setembro), o presidente americano George W. Bush admitiu pela primeira vez que os serviços secretos americanos detêm e interrogam membros importantes da Al Qaeda em prisões secretas no exterior e que os EUA querem continuar a manter o sistema, apesar da forte crítica internacional.
Em Genebra, o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) declarou que, nos próximos dias, terá acesso aos 14 homens (incluindo o presumido idealizador do atentado de 11 de setembro), cuja transferência para a prisão na base de Guantánamo depois de detenção em prisões secretas foi anunciada pelo presidente americano. Hoje, a entidade com sede em Genebra anunciou que a viagem de seus funcionários deve ocorrer na próxima semana, mas admitiu que não sabe ainda onde estão as prisões secretas mantidas pelos americanos.
As revelações feitas por George W. Bush confirmam as suspeitas do senador suíço Dick Marty, que pergunta onde estariam os locais secretos de detenção.
Na sua opinião, as declarações do presidente americano irão levar os governos implicados a falar toda a verdade sobre a questão?
Dick Marty: Primeiramente, a confirmação da existência das prisões secretas não constitui uma surpresa para mim. Eu sempre estive convencido disso. Em segundo lugar, o fato do governo americano ter admitido finalmente que detinha e interrogava os prisioneiros fora dos Estados Unidos, com métodos extremos, é mais um motivo para pressionar os governos europeus a fazer o seu dever e revelar o que realmente se passava nos seus territórios. Estamos ainda muitos distante de saber toda a verdade.
Esse pedido também envolveria a Suíça, que no seu relatório foi denunciada por ter fechado os olhos para o trânsito de aviões suspeitos no seu espaço aéreo?
D.M.: Não só a Suíça, mas também todos os países onde as pistas mais do que concretas mostram que o espaço aéreo, os aeroportos e outras infra-estruturas foram colocadas à disposição desse sistema secreto de detenções, que implica uma logística e um sistema de transporte importante.
Em fevereiro, a Suíça decidiu renovar a autorização anual de utilização do espaço aéreo para aviões americanos. Essa decisão poderia ser reavaliada dentro do contexto das declarações feitas pelo presidente dos EUA?
D.M.: Na minha opinião, a Suíça renovou essa permissão rápido demais. Só é necessário avaliar os atos da justiça italiana para descobrir que existe um grande número de indícios mostrando que o nosso espaço aéreo foi utilizado para transporte pelo menos uma pessoa seqüestrada ilegalmente.
Eu acredito que nós deveríamos exigir, de uma forma muito mais vigorosa e formal, explicações do governo americano. Porém nos contentamos apenas com uma declaração verbal de um funcionário da administração dos EUA.
Após as declarações de George W. Bush, poderíamos levar à sério as declarações americanas de que nenhum prisioneiro chegou a transitar pela Suíça?
D.M.: Não, eu penso que nesse caso – assim como para tudo o que está relacionado com a guerra no Iraque – muitas mentiras foram contadas. Temos de ser mais rigorosos no pedido de informações e esclarecimento.
O Senhor acredita que o governo americano vai revelar mais detalhes sobre o programa de detenção ou os locais onde estariam baseadas essas prisões secretas?
D.M.: Não. Porém devemos continuar pressionando. Essas primeiras revelações só foram obtidas graças ao notável trabalho feito por várias ONGs e jornalistas de investigação nos Estados Unidos. Também não podemos esquecer do importante papel tido pela justiça americana, que tomou decisões importantes para defender a sociedade civil.
O Senhor vai continuar suas próprias investigações?
D.M.: Em junho, a assembléia parlamentar do Conselho da Europa decidiu que as investigações iriam continuar. Eu concordo em continuar com o meu trabalho, mas não nas condições atuais. Eu preciso de mais recursos.
Até agora eu tinha somente à minha disposição um jovem assistente e seu contrato não deverá ser prolongado por questões burocráticas. Eu considero isso grotesco. Em particular, se levarmos em consideração a importância desse trabalho.
swissinfo, Adam Beaumont
Em novembro de 2005, a Human Rights Watch (ONG que “monitora” os direitos humanos) alegou a existência de prisões secretas na Europa e de seqüestros de suspeitos de terrorismo pela CIA.
O Conselho da Europa convocou o senador suíço Dick Marty para iniciar investigações sobre o caso.
Dick Marty é membro da assembléia parlamentar do Conselho da Europa, onde ele preside a comissão de questões jurídicas e dos direitos humanos.
Marty apresentou em 7 de junho de 2006 um relatório, onde acusava 14 governos europeus de estarem colaborando com a CIA na manutenção de prisões secretas e transferências de suspeitos de terrorismo.
O relatório também acusava o governo suíço de ter fechados os olhos para as alegações trânsito de aeronaves suspeitos no espaço aéreo do país.
O Departamento Federal de Aviação Civil confirmou o pouso de seis vôos suspeitos da CIA na Suíça.
Ao mesmo tempo, 76 aviões americanos suspeitos sobrevoaram o espaço aéreo da Suíça entre 2001 e janeiro de 2006.
O governo declarou que esses vôos haviam sido registrados como não-comerciais.
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