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Derrota para a direita nacionalista

Manchetes dos jornais helvéticos dão destaque para a derrota da UDC nas urnas. swissinfo.ch

Os partidários da União Democrática do Centro (UDC, direita nacionalista) queriam utilizar o plebiscito de domingo para se firmar como força de oposição. A derrota nas urnas mostra que seu polêmico líder, Christoph Blocher, utilizou a falsa estratégia.

A proposta de colocar o processo de naturalização de estrangeiros em votação pública foi rechaçada pelo eleitor suíço, que prefere posições mais moderadas.

A revista semanal alemã “Spiegel” vai ao ponto na manchete de segunda-feira: “Revés para Christoph Blocher”. Já o jornal alemão “Sueddeutsche Zeitung” destaca a decisão do eleitor: “Suíços impõem derrota aos nacionalistas”.

O “NZZ”, o principal diário da Suíça, explica em editorial as conseqüências do triplo “não” dado pelos eleitores durante o plebiscito de domingo. “No papel auto-escolhido de partido de oposição, a UDC foi reprovada pelo povo no seu primeiro teste. Não que eles tenham perdido absolutamente, mas a decisão das urnas os obriga a fazer uma reflexão, sobretudo pelo fato de terem o costume de dizer que estão tão próximos do eleitor”.

Das três iniciativas populares apresentadas no plebiscito, seja de autoria da UDC ou apoiada por ela, uma era a mais polêmica. Intitulada “Por naturalizações democráticas”, ela pedia que as comunas ganhassem o direito de definir, de forma autônoma, os procedimentos e os órgãos de competência para a cessão da nacionalidade suíça.

O eco internacional foi tão grande – algo incomum em se tratando de temas da política interna – que mesmo o “New York Times” publicou uma longa matéria falando do assunto. Para ilustrar ao leitor as intrincadas questões da iniciativa, o jornalista começou a reportagem contando a seguinte história.

“Milikije Arifi vive na Suíça há mais de trinta anos. Ela chegou ao país aos dezoito. Sua família também cresceu aqui. Ela é fluente em alemão – o principal idioma nessa região no norte do país – e fala com o mesmo sotaque suíço com seus vizinhos. Ela também passou pelos testes de conhecimento sobre a Suíça e sobre a história local e o sistema político”.

“Em abril, pela terceira vez, o governo local dessa comuna, quase um subúrbio de Zurique, negou seu pedido de naturalização, assim como o do marido. Embora a lei incentive a votação em público e uma justificação completa, os representantes tomaram a sua decisão a portas fechadas e se recusaram a dar uma justificação, além do tradicional ‘problemas ligados à insuficiente integração'”.

Maioria foi contra

Em outros editoriais publicados um dia após o plebiscito, a maioria dos comentaristas ressalta que o principal objetivo da UDC era provar que conseguiria aglutinar o povo contra todas as outras forças políticas. “Que sem ela nada funciona no país e que foi um grande erro dos outros partidos ter derrubado o ministro da Justiça, Christoph Blocher, a eminência parda da UDC, em dezembro passado”, escreveu a “Spiegel”.

Agora a direita nacionalista se encontra na incômoda situação de estar solitária na oposição. Ela perdeu a aposta política com as suas propostas e isso mais claramente do que os cientistas políticos haviam previsto: com quase 64% dos votos contrários à iniciativa das naturalizações, ela não conseguiu convencer o eleitor a reverter a decisão do Tribunal Federal Suíço (a maior instância jurídica), que havia proibido em 2003 as votações “públicas” de pedidos de naturalização. Apenas um dos 26 cantões aceitou a proposta: o pequeno e conservador cantão de Schwyz, no coração da Suíça.

Já a proposta “Soberania do povo sem propaganda governamental”, também de autoria da UDC, foi recusada nas urnas por 75% dos eleitores. Ela queria proibir a utilização de recursos públicos pelo governo federal no trabalho de comunicação das suas posições em períodos de votação popular. E finalmente, o eleitor suíço também reprovou uma proposta de reforma do sistema de seguro de saúde, que era apoiada fortemente pelo partido de Blocher, com 69% dos votos.

Erros estratégicos

Os resultados foram uma grande decepção para a UDC que, em dezembro, praticamente saiu do poder. Apesar da legenda ainda ter dois ministros no governo federal, estes pertencem a correntes moderadas, distantes politicamente das lideranças do partido. Quando Blocher deixou de ser reeleito, seus correligionários ameaçaram fazer política através de plebiscitos populares.

A campanha de naturalizações foi acompanhada por uma forte campanha publicitária e de presença na mídia. Com o tema polarizador dos estrangeiros na Suíça, a UDC esperava mobilizar facilmente o eleitor. Como avaliam os analistas e cientistas políticos na imprensa helvética, a derrota mostra que o suíço é mais moderado do que se imaginava.

Para Christoph Blocher, o resultado do plebiscito provou ser uma derrota pessoal. Nas últimas semanas, ela havia participado de várias apresentações públicas da iniciativa – exigindo muitas vezes a presença da polícia para protegê-lo, como chegou a ocorrer em Lausanne. Muitos dos seus correligionários tentam apresentá-lo como um “mártir”, que sofreu uma traição durante a eleição no Parlamento Federal. No domingo, a direção da UDC reuniu-se para excluir, por 81 votos contra 5, a atual da ministra da Justiça (que substituiu Blocher no poder), Eveline Widmer-Schlumpf, do partido.

Durante a campanha do plebiscito, ela havia declarado várias vezes que era contra a proposta da UDC. Os resultados mostram que ela convenceu o eleitor. De fato, processos de naturalização através de votação pública são problemáticos do ponto de vista jurídico, pois um voto negativo na urna não precisa ser justificado. O estrangeiro que vê negado seu pedido também não pode entrar com recurso. O principal argumento de defesa da UDC era de que a iniciativa iria impedir o aumento abusivo no número de naturalizações e que “criminosos potenciais” pudessem ter o passaporte da cruz.

Tema polêmico

A questão da naturalização é extremamente sensível na Suíça. Ainda em 2003, o eleitor recusou pela terceira vez consecutiva nas urnas a cessão automática da nacionalidade suíça para jovens estrangeiros da segunda geração.

Porém o plebiscito de domingo mostra que a maioria dos eleitores está insatisfeita com a UDC. Temas como criminalidade de estrangeiros, problemas de integração, dos conflitos com o Islã, a religião de muitos dos imigrantes, continuam ser relevantes para a maior parte dos suíços, porém a maioria se opõe à forte polarização adotada pelo partido nos últimos anos.

Também a briga interna na UDC é vista por muitos como contrária à tradição política helvética. Nela o consenso ainda é visto como um dos maiores valores e garantidor da paz social. Um exemplo disto é visto na chamada “Fórmula Mágica”, onde todos os partidos relevantes recebem cargos no governo federal. Os ministros tomam as decisões em colegiado e não deixam transparecer oposição interna. Christoph Blocher foi o primeiro a não se ater às regras.

A derrota da UDC não significa que o partido está descartado. A próxima grande luta irá ocorrer em 2009, quando o eleitor suíço será convocado para aprovar ou não a continuação do acordo de livre-circulação de mão-de-obra com a União Européia. Sobretudo a sua extensão aos mais recentes membros, Romênia e Bulgária, é visto com muita crítica pela direita nacionalista, mas também por sindicatos ou outros setores da população. A luta continua.

swissinfo, Alexander Thoele e agências

Naturalizações “democráticas”
“Não”, 63,8% – “Sim”, 36,2%

Iniciativa “Soberania popular sem propaganda governamental”
“Não”, 75,2% – “Sim”, 24,8%

Artigo sobre o sistema de saúde
“Não”, 69,5% – “Sim”, 30,5%

Participação do eleitorado: 44,1%

1. A iniciativa popular “Por naturalizações democráticas” pede que as comunas possam definir de forma autônoma os procedimentos e os órgãos de competência para a cessão da nacionalidade suíça. O governo recomendou rejeitá-la.

2. A iniciativa popular “Soberania do povo sem propaganda governamental” exigia que o governo não utilizasse mais dinheiro dos contribuintes para fazer “propaganda” através de campanhas relativas aos plebiscitos federais. O governo também havia recomendado a sua rejeição.

3. O artigo constitucional denominado “Qualidade e eficácia econômica nos seguros de saúde” visava incluir alguns princípios fundamentais do sistema de seguros de saúde na Constituição. O governo recomendou a sua aprovação.

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