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Eleições no Parlamento: crise no governo suíço

O deputado Hugo Fasel (Partido Cristão Social) comemora a não reeleição de Blocher. Keystone

Choque no Parlamento helvético: durante as votações para a formação de um novo gabinete federal, a até então desconhecida política Widmer-Schlumpf é eleita no lugar do seu correligionário e atual ministro da Justiça e Política, Christoph Blocher.

A União Democrática do Centro (UDC, direita nacionalista) faz pressão para que ela abdique em prol de Blocher, a figura de proa do partido. Nunca o modelo helvético da democracia de consenso esteve tão ameaçado.

Raras vezes os parlamentares suíços manifestaram tão abertamente suas emoções: membros dos partidos de esquerda pularam e se abraçaram de alegria; os deputados e senadores da direita não conseguiam se levantar das cadeiras e mostravam, em silêncio sepulcral, a consternação com a situação inesperada.

Poucos minutos depois a atenção se voltava para a personagem que havia se transformado no pivô de uma quase revolução na política suíça. Ela era uma desconhecida do público: Eveline Widmer-Schlumpf, a mulher que terminou sendo eleita para Conselho Federal no lugar do atual ministro da Justiça e Polícia, Christoph Blocher.

Os dois são do mesmo partido. Porém a derrota de Blocher tira do cenário um dos mais importantes líderes políticos da Suíça nas últimas décadas, uma personalidade que, como nenhuma outra, impregnou e revolucionou a forma de se fazer política no país dos Alpes.

Toda a nação se pergunta: quem é essa mulher? Ela vai aceitar a nomeação pelo Parlamento ou irá abdicar, para que a UDC possa apresentar mais uma vez Christoph Blocher? Afinal, o partido da direita nacionalista é a mais importante força política. Nas últimas eleições eles conquistaram 29% dos votos. O segundo partido mais forte, os sociais-democratas, apenas 19,5%.

Manobra estratégica

Eveline Widmer-Schlumpf é ministra das Finanças do cantão dos Grisões, uma região de montanhas localizada ao leste do país. Aos 51 anos, ela é membro de uma ala mais liberal da UDC, o que a tornou mais simpática para os partidos de esquerda e centro como alternativa a Blocher.

O recém-eleito deputado Ricardo Lumengo, o primeiro parlamentar de origem africana na Suíça e membro do Partido Social-Democrata, explica os motivos da forte rejeição do ministro da Justiça. “A não reeleição de Blocher foi uma expressão da democracia. No meu partido havia muitas críticas contra ele por não respeitar o sistema de colegialidade. O voto pode ser visto como uma sanção. Nós demonstramos que defendemos a concordância democrática na Suíça”, declara.

A estratégia costurada secretamente pela esquerda funcionou. Ao invés de apoiar o candidato apresentado pela UDC, seus parlamentares votaram maciçamente em Widmer-Schlumpf apesar de ela não ter se apresentado. Possivelmente também não estava ciente que poderia ser utilizada como alavanca para o golpe contra o Blocher. Ela recebeu 125 votos, contra 115 para o ministro da Justiça.

Agora a pressão é imensa sobre ela. Seu partido recusa a aceitar o resultado e ameaça ir para a oposição. Widmer-Schlumpf preferiu solicitar tempo para tomar uma decisão. Na quinta-feira (13 de dezembro), às oito horas, a política irá comunicar frente aos colegas do Parlamento se aceita ou não o cargo de membro do Conselho Federal.

Recusa inflexível

Se a UDC conseguir convencer Widmer-Schlumpf a ceder espaço para uma nova candidatura de Blocher, a oposição será enorme. “Iremos nos opor contra a reapresentação da candidatura dele. Isso seria um comportamento pouco democrático por parte da UDC, de tentar colocar uma pessoa que não conseguiu ser eleita e que se candidata pela segunda vez. Iremos apoiar qualquer outro candidato desse partido, com exceção dele”.

Os sociais-democratas, na figura do seu presidente Hans-Jürg Fehr, fala de “uma performance excelente do Parlamento”. A deputada do PS Chantal Galladé, explica o principal objetivo da esquerda. “Com a eleição de Widmer-Schlumpf ao invés de Blocher mostramos que o nosso partido apóia o princípio helvético da concordância, onde os membros do governo dirigem o país em comum acordo. Mas não podemos aceitar qualquer um. Blocher ultrapassou os limites do tolerável”.

Polarizador

Christoph Blocher, seja como parlamentar ou membro do governo federal, sempre foi uma figura polarizadora. Suas posições são vistas por muito como radicais. Por outro lado ele sempre conseguiu conquistar a simpatia do eleitor pelos seus trejeitos de camponês e abordagem simplista e direta de problemas complexos.

Durante toda a vida política ele lutou contra a adesão da Suíça à União Européia, por um Estado enxuto, restrições à imigração e uma política liberal favorecedora da economia. Há quatro anos Blocher foi eleito para o Conselho Federal. A esperança de outros partidos era de que ele se adaptasse à concordância no governo federal, um sistema que seria capaz de “domar” seus impulsos.

Na prática, a experiência de Blocher no governo foi recheada de polêmicas. Nos últimos anos, muitos foram os casos de discordância entre o ministro e seus colegas no Conselho Federal que terminaram transparecendo na imprensa, um precedente único na história do país.

Os adeptos da linha de Blocher na UDC temiam sua não reeleição. Porém poucos esperavam que o resultado fosse tão radical. Para alguns dos parlamentares como o estrategista Christoph Mörgeli, a culpa está nos adversários. “Foi a vingança daqueles que perderam as últimas eleições parlamentares”, declarou.

Revolução na política

Se Eveline Widmer-Schlumpf aceitar o cargo, ela poderá revolucionar a política do país. Analistas acreditam que a ala mais forte da UDC não irá reconhecer a ministra e poderá ir para a oposição. Esse passo pode representar o fim da democracia de consenso, um sistema que governa o país dos Alpes desde 1959, quando a Suíça passou a ser governada pelos quatro maiores partidos acabando com a noção clássica da oposição e situação no Parlamento.

Com a crise atual, o segundo representante da UDC no governo e atual ministro da Defesa, Samuel Schmid, também fica numa situação desconfortável. Por pertencer a ala dos moderados, ele é visto com desconfiança por parte dos correligionários. Muitos analistas não descartam sua renúncia, caso a direita nacionalista entre para a oposição.

Com seu apelo político e força parlamentar, a UDC pode bloquear diversos projetos em andamento ou lançar iniciativas para colocar em votação popular as suas idéias. Essa seria a melhor resposta à derrota do seu mais importante nome.

swissinfo, Alexander Thoele

Foram eleitos para o Conselho Federal (gabinete de ministros) na quarta-feira:

– Moritz Leuenberger: 157 votos
– Pascal Couchepin: 205 votos
– Samuel Schmid: 201 votos
– Micheline Calmy-Rey: 153 votos
– Hans-Rudof Merz: 213 votos
– Doris Leuthard: 160 votos
– Eveline Widmer-Schlumpf: 125 votos (a política ainda não aceitou a sua eleição – existe uma forte possibilidade que ela renuncie)

Pascal Couchepin foi nomeado presidente da Confederação Helvética para 2008 por 197 votos.

Raramente o Parlamento suíço deixa de eleger o candidato apresentado oficialmente pelo seu partido para entrar ou continuar no gabinete federal.

Desde 1959 essa situação ocorreu apenas oito vezes. E a cada uma delas, tratava-se de um movimento para substituir um ministro que partia e não para descartá-lo, como ocorre no momento com o ministro da Justiça, Christoph Blocher.

Em dezembro de 2000, para suceder o ministro Adolf Ogi (UDC), o candidato Samuel Schmid conseguiu ser eleito na frente dos dois concorrentes – Rita Fuhrer e Roland Eberle – que haviam sido apresentados pelo grupo de partidos do centro.

Fora da UDC, os sociais-democratas também já enfrentaram a mesma situação por quatro ocasiões. O Partido Democrata-Cristão a viveu duas vezes e os radicais, uma.

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