Fim da iniciativa pela pena de morte na Suíça
Uma iniciativa para reintroduzir a pena de norte na Suíça acabou antes de começar. Um dia depois do aval da Chancelaria Federal para a coleta de assinaturas, os responsáveis pela iniciativa anunciaram quarta-feira (25) que retiram o texto.
A proposta tinha provocado severas críticas na mídia e da classe política.
Intitulada “pena de norte em caso de assassinato com abuso sexual”, a apresentação dessa iniciativa popular era apenas o primeiro passo na democracia direta suíça para coletar 100 mil assinaturas num determinado prazo e, em caso de serem validadas, a questão é levada às urnas para os cidadãos decidirem.
Terça-feira, (24/8) o governo anunciou que, de acordo com a regulamentação em vigor, o texto reunia as condições técnicas de uma iniciativa popular e que poderia ser iniciada a coleta de assinaturas. No entanto, como a apreciação é técnica, não implica qualquer apoio político ao texto.
Porém, dado apenas o primeiro passo, os autores do texto decidiram na manhã seguinte (25) retirar o texto e renunciar, por conseguinte, à coleta de assinaturas.
Em seu sítio internet, os autores explica que esta era a única forma de que dispunham para chamar atenção para a questão de estupro de menores em um sistema jurídico que, julgam eles, favorece os criminosos em detrimento de suas vítimas.
Marcel Graf, membro do comitê da iniciativa, advertiu quarta-feira que a ideia era sensibilizar a população sobre as disfunções da justiça e caso de assassinatos de caráter sexual.
“O Estado de direito atual está totalmente ao lado do criminoso”, escreve no site internet da iniciativa, agora retirada.
“As pessoas próximas das vítimas no têm possibilidade alguma de se defender e seu papel se reduz a espectadores do processo.”
Indignação unânime
Será que os autores da iniciativa popular se retrataram devido às reações que provocaram? Eles não querem fazer comentário algum, segundo escrevem em seu site internet.
O certo é que o texto que buscava restabelecer a pena de morte, abolida na Suíça em 1942, provocou uma onda de indignação na classe política, na mídia, nas organizações de defesa dos direitos humanos e de especialistas do assunto.
Um tema tão polémico suscitou debates em fóruns de discussão “on line”. Segundo alguns jornais como o Tages Anzeiger de Zurique, os autores do texto foram motivados por uma vontade de vingança pessoal. A cunhada de Marcel Graf, autor principal da iniciativa, foi assassinada em abril de 2009 por seu parceiro. O assassino está preso, mas ainda não foi julgado.
O jornal acrescenta que “aquele que queria ter uma imagem de autor da iniciativa, fica nas trevas.”
Sem apoio político
A agência de notícias Reuters afirmava terça-feira (24) que “nenhum partido político apoiou o grupo, o que reduz as possibilidades de que consigam aprovar a iniciativa”. Acrescentava que entre os opositores a essa ideia estava Christoph Blocher, ex-ministro da Justiça e líder da União Democrática do Centro (UDC, na sigla em francês, SVP, em alemão), maior partido do país.
“Em 1985, um grupo lançou uma iniciativa similar para restaurar pena de norte para traficantes de droga, mas não conseguiu coletar as assinaturas necessárias. Ler detalhes na coluna à direita.
A agência de noticias Efe também relatou terça-feira que “todos os partidos políticos suíços – inclusive a UDC, que promoveu iniciativas controvertidas como a proibir a construção de minaretes nas mesquitas e expulsão de delinquentes extrangeiros da Suíça – se mostraram escandalizados com a proposta acerca da pena de morte.”
Debate sobre os critérios de validação de uma iniciativa
Essa iniciativa reacendeu o debate de adotar critérios mais rigorosos para validar uma iniciativa popular, antes do processo de coleta de assinaturas. O deputado federal Dick Marti declarou ao jornal Le Temps, de Genebra, que a Chancelaria Federal não deveria limitar-se a critérios técnicos para dar seu aval a um texto.
Uma iniciativa parlamentar nesse sentido foi apresentada pela deputada federal Isabelle Moret. Ele deverá ser debatida pelo Parlamento dentro de alguns meses. A proposta da deputada afirma que, “em caso de dúvida sobre a validade de uma iniciativa popular, a questão deve ser encaminhada a uma instância judicial (por exemplo a Corte Constitucional ou a Corte Plenária do Supremo Tribunal Federal), antes da coleta de assinaturas.”
Os 24 parlamentares signatários da proposta estimam que a questão de uma eventual anulação de uma iniciativa popular (ndr: um dos instrumentos mais utilizados da democracia direta suíça) deve restringir-se unicamente a elementos jurídicos. O objetivo é evitar que uma iniciativa popular, quando aprovada, não seja incompatível com tratados internacionais multilaterais assinados e ratificados pela Suíça.
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A primeira abolição da pena capital ocorreu em 1874. Mas cinco anos mais tarde, uma iniciativa popular para reintroduzi-la na Constituição federal foi aprovada pelos eleitores. Os promotores dessa iniciativa justificaram a volta da pena capital devido à crescente criminalidade. Através desse impulso, dez cantões incluíram a pena de morte no seu código penal.
Foi o Código Penal de 1937, que entrou em vigor em 1942, que aboliu definitivamente a pena de morte. A última execução ocorreu em 18 de outubro de 1940 em Sarnen, no cantão de Obwalden. Um zuriquense foi decapitado pelo triplo homicídio que havia cometido, dos quais uma das vitimas era um policial.
O Código Penal Militar, pelo contrario, conservou até 1992 a possibilidade de aplicar a pena de morte em tempos de guerra para crimes como a traição, assassinato ou pilhagem. Durante a Segunda Guerra Mundial, das 33 condenações pronunciadas, 17 foram aplicadas. A última ocorreu em 1944.
Em 1985, uma iniciativa pedindo a reintrodução da pena de morte para os traficantes de drogas foi lançada. Ela não recolheu o numero mínimo de assinaturas para permitir que fosse votada.
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