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O paraíso está longe: a falta estrutura para acolher jovens refugiados na Suíça

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96 menores desacompanhados vivem no salão do Paradiso. Alguns deles ficam aqui por três ou quatro anos, em uma estrutura que agora é inadequada. RSI

No Ticino, na Suíça italiana, os centros de acolhimento para requerentes de asilo estão quase sem vagas.

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N. escapou do Afeganistão ainda criança. Depois de uma longa e cansativa viagem, foi recebido no Ticino. Hoje vive no abrigo Paradiso (em portuquês, Paraíso) para menores desacompanhados, localizado no distrito de Lugano.

Ele é um dos quase cem hóspedes que este centro acolhe. Um em cem… Um em muitos porque, quando falam, os educadores e operadores não escondem: há uma escassez permanente de profissionais para cuidar dos acolhidos.

No entanto, um olhar mais atento à rede de centros de acolhimento para quem precisa de asilo no Ticino revela problemas mais profundos.

Centros de acolhimento: insuficiência que dá para sentir

Novecentas pessoas que precisam de acolhimento, muitas das quais menores desacompanhados, para serem alocadas nos 24 centros de acolhimento mostram que a estrutura disponível nunca é suficiente.

E para piorar, o Conselho de Estado (governo estadual) decidiu cortar verbas que vão para estes centros. Este é o cenário com que o cantão (estrutura administrativa regional suíça, que equivale a um estado) de língua italiana recebe os requerentes de asilo atualmente.

Cerca de 4% de todos que fogem do seu país para procurar refúgio na Suíça chegam para pedir ajuda no cantão italiano. A proporção está estipulada na tabela de distribuição entre os cantões – um sistema complicado e mutável, dividido entre sucessos e fracassos, esforços e desafios, que envolve também o Ticino.

E o cantão continua a lutar contra as condições locais adversas.

Um cantão dividido em dois

Encontrar alojamento para quase mil pessoas não é uma tarefa fácil. Seja moradia para menores não acompanhados, centros para adultos ou famílias, pensões ou apartamentos, no geral, os locais de acolhimento para requerentes de asilo quase não têm lugares disponíveis.

Há anos que o cantão procura novos espaços. No entanto, muitas vezes esbarra na oposição da população ou das autoridades municipais.

O resultado é que o Ticino parece dividido em dois. As zonas de Lugano e Sopraceneri abrigam a maior parte dos centros de acolhida, enquanto a região de Sottoceneri quase não tem nenhum centro: em vez das estruturas cantonais, porém, conta com os centros federais de Chiasso e Balerna.

O resultado? Vários alojamentos estão superlotados.

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O alojamento para menores em Paradiso está prestes a se tornar inutilizável. Seu fechamento foi anunciado há anos, mas o cantão não consegue encontrar alternativas para substituí-lo. RSI

Um prédio em ruínas

Superlotação é o caso especialmente do Paradiso, que acolhe jovens até aos 18 anos. O alojamento deveria ter fechado as portas há cerca de dez anos, mas ainda está lá, empoleirado com seus seis andares de varandas sustentadas por postes de madeira.

Atualmente, o centro acolhe 96 adolescentes, alguns há anos, em quartos coletivos que oferecem um nível mínimo de conforto. O prédio deverá ser desocupado, enfim, na primavera do próximo ano quando deve ficar pronto o novo edifício, após uma série de adiamentos e atrasos.

Mas a nova construção ainda não será suficiente. Portanto, a assistência social seguirá precisando fornecer alojamentos temporários, como pensões e hoteis. Mesmo que não sejam apropriados, pelo menos são uma alternativa para oferecer o essencial.

A Cruz Vermelha, sempre presente

“Às vezes tenho vontade de dizer que fazemos pequenos milagres”, diz Debora Banchini Fersini, diretora da Seção Sottoceneri da Cruz VermelhaLink externo, organização que há décadas lida com a primeira fase de acolhimento de requerentes de asilo no Ticino.

Alimentação, hospedagem, integração e cursos de idiomas: tudo é fornecido pela Cruz Vermelha via um contrato de prestação de serviços que se renova ano após ano. Em 2023 o valor da contratação subiu para 20,2 milhões de francos suíços.

O Soccorso Operaio SvizzeroLink externo (SOS Ticino, contrato de 2,9 milhões de francos suíços no ano passado), por sua vez, é responsável pela chamada segunda fase de acolhimento, a de acompanhar os requerentes de asilo ao emprego e fornecer apartamentos na região.

Há também espaço para outras associações: no Ticino, muitas outras lidam com o acolhimento e as necessidades dos requerentes de asilo. Essas entidades propõem projetos e recebem uma pequena quantia de financiamento do cantão. Mas muitas vezes pedem uma participação maior. “Queremos ajudar”, explica Lara Robbiani, diretora da Link externoAssociação DaReLink externo, à RSI, “mas parece que somos um incômodo, enquanto no resto da Suíça esse não é o caso”.

Acolher requerentes de asilo no Ticino significa também ter de receber críticas, muitas vezes críticas fortes, e até do mundo político.

Há poucos dias, foi agendada uma visita (acordada há meses) a alguns centros da Cruz Vermelha por uma delegação da Comissão de Assuntos Sociais e Segurança Social do Parlamento. Segundo nossa apuração, aparentemente nenhum representante dos partidos de centro-direita apareceu para verificar pessoalmente as condições das pessoas que precisam de asilo.

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A bandeira do país de origem, neste caso o Afeganistão. Às vezes, esse emblema é uma forma de se sentir menos distante da família. RSI

O desconforto de quem trabalha e de  quem mora nos centros 

Para perceber a inquietação e o descontentamento que tomam conta da atmosfera desses centros, basta conversar com as pessoas e convidados que frequentam essas instituições. Muitos relatos revelam as dificuldades de quem ainda vive na incerteza e na angústia devido à sua situação temporária enquanto espera por um documento de permissão de moradia que pode chegar depois de anos. Ou que talvez nunca chegue.

“Não sei por que os educadores não nos ajudam. Há muita burocracia, eles têm que fazer muitas tarefas e não vêm aos nossos quartos”, afirma um acolhido do Paradiso. “Eles não entendem o que temos na cabeça, que temos problemas… Somos muitos e os educadores são poucos. Talvez seja esse o problema.”

Esta é, sem dúvida, uma das questões críticas. O problema é confirmado por quem já trabalhou lá: “A quantidade de trabalho era demais para os educadores. Saí porque não tinha ferramentas suficientes para ajudar as crianças. E aos poucos todos foram embora”. A rotatividade chama atenção, principalmente no Paradiso. Para compensar a evasão, são contratados educadores da Itália. O que complica a gestão dos recursos é a imprevisibilidade do número de requerentes de asilo.

“Não podemos contratar agora um educador para cuidar de cinco crianças se ainda não os acolhemos… mas quando eles chegam não tenho um educador de prontidão”, admite Debora Banchini Fersini. “Estamos sempre com falta de pessoal”. Também pesa muito o corte de recursos decidido pelo Conselho: de 1 assistente social para cada 37 adultos requerentes de asilo, a proporção agora caiu para 1 para cada 59.

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O Ulivo em Cadro, na área de Stampa. No centro, uma grande torre de onde a equipe de segurança monitora os requerentes de asilo. RSI

Um centro de acolhimento entre uma prisão e dois aterros

Problemas críticos afetam não apenas o Paradiso, mas também o UlivoLink externo, centro para adultos e famílias em Cadro, Lugano, onde vivem 178 pessoas.

No centro deste complexo existe uma torre de concreto a partir da qual os agentes de segurança monitoram os hóspedes. “Eles nos observam de perto”, diz uma pessoa que mora lá há meses.

O Ulivo, construído em 2017, está localizado próximo a um prédio de incineração de carcaças de animais, a pelo menos dois aterros e próximo à penitenciária cantonal.

O centro tem poucas ligações à cidade por transportes públicos. Garantir o transporte das crianças de lá até diferentes escolas é um desafio logístico que obriga a Cruz Vermelha a gerir um complexo sistema de vans.

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O centro para jovens adultos em Castione. Sua trajetória também inclui autonomia no gerenciamento de alimentos. RSI

Portas fechadas?

Centros como os de Paradiso ou Cadro são insuficientes há anos. O cantão está constantemente à procura de instalações alternativas, como hoteis e pensões. Mas às vezes as portas permanecem fechadas.

A ideia de transformar o abrigo da pequena vila de Cresciano em um centro para menores não acompanhados foi rejeitada pela comunidade local. Após um abaixo assinado, o projeto foi bloqueado. Mas o Cantão não desistiu e está buscando alternativas legais.

“É importante saber disso e tentar não estimular o medo nas pessoas, para que as decisões não sejam tomadas apenas por medo”, observa o diretor da seção Sottoceneri da Cruz Vermelha.

“Quantas pessoas queremos acolher? A política decide isso. No entanto, depois dessa decisão, devemos mobilizar todos os recursos possíveis para garantir que as pessoas sejam acolhidas com dignidade e possam se integrar. As pessoas que acolhemos hoje tem muito a nos oferecer, querem começar de novo. É o valor de amanhã na zona do Ticino”, conclui.

Uma vontade de recomeçar que, segundo muitos testemunhos recolhidos nesta reportagem, envolve muitas vezes caminhos tortuosos, sobretudo quando se tenta entrar no mundo do trabalho.

Os requerentes de asilo são acompanhados pelos chamados conselheiros laborais, que também estão com número defasado de profissionais e quase sempre cuidam de tantos casos que estão sobrecarregados. Como admite Renzo Zanini, chefe do Gabinete de Requerentes de Asilo e Refugiados do cantão,Link externo o Ticino enfrenta uma série de fenômenos que “tornam mais difícil encontrar trabalho para uma pessoa que pertence ao setor de asilo aqui no Ticino do que em muitos outros cantões da Suíça”.

E não faltam casos em que os requerentes de asilo são empregados em empregos de baixos salários e de estágio, que dificilmente serão convertidos em empregos estáveis. A base para o recomeço de uma nova vida, que começou com uma fuga e um acolhimento, muitas vezes segue repleta de incertezas.

Adaptação: Clarissa Levy

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