Suíços votarão financiamento de aborto
Na Suíça, o direito das iniciativas tem sido caminho para abordar muitos assuntos, pouco ou muito relevantes à vida diária da população.
Nesta semana, por exemplo, um grupo apresentou sua iniciativa intitulada “Financiar o aborto, um assunto privado”, tendo recolhido 111 mil assinaturas para sustenta-la.
Os precursores da iniciativa não criticam diretamente o aborto, mas sim os custos que estes trazem para o sistema de saúde. Mas, como muitos dos temas abordados nas urnas três ou quatro vezes ao ano na Suíça, a proposta também corre o risco de ser esquecida.
Para conseguir que as autoridades aceitem uma iniciativa popular é preciso reunir 100 mil assinaturas de eleitores. O comitê da iniciativa conseguiu cumprir a exigência e apresentou há pouco o documento à Chancelaria Federal para avaliação posterior. Se todos os requisitos forem cumpridos, o povo será convidado a opinar sobre o tema nas urnas.
Na Suíça o aborto é coberto pelo seguro básico de saúde, obrigatório e privado para todas as pessoas que vivem no país dos Alpes. Ao incluí-lo dentro da lista de serviços reembolsados pelo seguro desde 1981, as autoridades tinham como objetivo de evitar custos elevados e que as mulheres exporem sua saúde em mãos não qualificadas.
Ideia similar rejeitada em 2002
O risco de rejeição da iniciativa se baseia no fato que os grupos contrários ao aborto já enfrentaram, em 2002, rejeição durante votações federais. A proposta era de restringir a interrupção da gravidez apenas aos casos em que a saúde da mulher corresse perigo. Na época, 82% dos eleitores refutaram a proposta, enquanto 72% aprovaram uma maior flexibilização da prática do aborto no Código Penal.
Juntamente com essa flexibilização, a Suíça permite a interrupção voluntária do aborto antes das 12 semanas de gravidez em caso de alteração da saúde física ou psicológica da futura mãe.
Com as modificações do Código Penal, o governo federal adotou as disposições da maioria dos países da Europa ocidental, onde é permitido o aborto voluntário durante o período embrionário da gestação, ou seja, nos três primeiros meses da gravidez.
Os primeiros a promover uma maior abertura na prática da interrupção da gravidez foram Islândia, Suécia e Dinamarca, seguidas por países como Alemanha, Áustria, Bélgica, França, Itália, Noruega e Holanda. A Suíça, juntamente com a Inglaterra, Espanha e Portugal, foi um dos últimos países na Europa a discutir a legislação para facilitar o abordo.
Argumento da responsabilidade individual
A nova iniciativa propõe que a interrupção da gravidez não seja mais coberta pelo seguro básico de saúde, apesar de prever exceções como no caso de estrupo ou se a vida da gestante correr risco, indicam seus precursores, militantes de diversos partidos, dentre eles o Partido Democrata Cristão (PDC) e o Partido do Povo Suíço (SVP, na sigla em alemão – partido majoritário no Parlamento).
A solução proposta é que aquela mulher, que teme o risco de ter uma gravidez não desejada, possa fazer um seguro complementar para cobrir estes gastos, sem onerar os caixas do sistema de saúde.
Aborto, último recurso
Mas há vozes contrárias: elas lembram que 6,5 mulheres em 10 mil interrompem sua gravidez no país e que, hoje em dia, o aborto voluntário representa custos de 0,2% no setor de saúde, como indica a Associação dos Profissionais sobre Aborto e Contracepção (APAC) em um comunicado, opondo-se à proposta da iniciativa.
Nela, o aborto na Suíça não é, como em alguns países em desenvolvimento, uma problemática social devido à carência dos meios de contracepção, senão um último recurso, como indicam alguns especialistas em planificação familiar.
Os dados das estatísticas helvéticas mostram que os 10 mil casos de interrupções da gravidez na Suíça colocam o país no grupo com os níveis mais baixos desse tipo de prática.
Metade de estrangeiros
A taxa de interrupções da gravidez continua estável, chegando a diminuir em 2010 entre as adolescentes, com uma taxa de 4,5 abortos de uma população de mil jovens da faixa etária de 15 a 19 anos.
A idade em que o aborto ocorre com maior incidência na Suíça situa-se entre os 20 e 24 anos, com 10,4 casos sobre mil, representando 23% de todas as intervenções.
Em 2010, metade das interrupções de gravidez ocorreu entre mulheres de nacionalidade estrangeira, o que representa uma taxa de 10,8 por mil mulheres na Suíça (4,3 entre as suíças). No entanto, esta conclusão é baseada em apenas 12 dos 26 cantões (estados) que coletam dados sobre o tema, o que significa que não são completos, como alerta o Departamento Federal de Estatísticas.
Total: 11.629 (500 casos de mulheres não residentes)
6,4 abortos em cada grupo de mil mulheres (com idades entre 15 a 44 anos)
5 de mil adolescentes (com idades entre 15 a19 anos)
129 interrupções em mil nascimentos
1% de todas as interrupções ocorreram em menores de 16 anos
95% das interrupções são feitas nas primeiras 12 semanas de gravidez
60% ocorrem através de medicação e 40% por via cirúrgica
Dados de 2010 – Departamento Federal de Estatísticas
Adaptação: Alexander Thoele
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