Novo emigrante não vive em um só país
Suíços do estrangeiro encontram-se anualmente para reforçar os laços com a pátria distante. No congresso de 2016, realizado na capital Berna, o momento foi de debater a globalização e a mobilidade crescente. Dentre os maiores desafios, a necessidade de rejuvenecer os clubes suíços.
Mais de 10% dos suíços vivem no exterior, uma população que cresce constantemente, mas que se diferencia dos emigrantes de outrora. Conectados, bem formados, abertos às diferenças culturais e dispostos a aceitar novos desafios profissionais, os jovens expatriados se consideram suíços, mas não necessitam mais se reunir em clubes ou participar de organizações helvéticas. Foi a principal constatação feita pelos participantes do 94° Congresso dos Suíços do Estrangeiro, realizado em 2016 no espaço cultural Kultur Casino, em Berna, um dia após as comemorações do centenário da OSE. A questão é atraí-los. E, portanto, o debate.
E temas não faltaram para o congresso. O colóquio intitulado “A Suíça – parte do mundo”, para o qual foram convidados especialistas e representantes do governo, tinha por fim debater temas diversos ligados à mobilidade internacional e suas consequências para a Suíça. Para o público, duas centenas de suíços do estrangeiro oriundos dos quatro cantos do globo, a questão era compreender como a globalização pode reforçar a posição internacional da Suíça, especialmente através de redes como os clubes helvéticos, hoje na penúria de jovens membros.
Pessoas emigram
A constatação foi feita pelo primeiro palestrante, Gianni D’Amato, professor da Universidade de Neuchâtel. “A média de imigração e emigração da Suíça é de 40 mil pessoas por ano, sendo que a maioria delas é relativamente jovem, com uma idade média de 35 anos”, declarou, lembrando a origem delas. “A maior parte vem das regiões urbanas do país”.
Outra característica mostra a mudança de perfil. “Falamos de emigração quando uma fronteira é atravessada e a estadia dura mais de um ano”, definiu D’Amato. Porém hoje existe uma diferença. “Os cidadãos suíços não vivem em um só país, mas se deslocam. Existe uma circulação constante.”
Uma avaliação histórica ajudou a compreender o fenômeno. Foi o que fez o segundo palestrante, Bernhard Altermatt, historiador da Universidade de Friburgo. Ele lembrou que a primeira representação dos suíços do estrangeiro se deu através da fundação da Nova Sociedade Helvética, em 1914. O motivo estava ligado à razões políticas. “Os suíços do estrangeiro foram particularmente afetados pelos efeitos da Primeira Guerra Mundial. Alguns foram até vítimas diretas e não se sentiam mais bem-vindos nos seus países de acolho. Na época, a ideia dessa iniciativa era de repatriar todos os suíços do estrangeiro de volta à Suíça”, disse.
Posteriormente o Parlamento federal valorizou ainda mais essa comunidade através de novas legislações: em 1966, os suíços do estrangeiro receberam um adendo na Constituição federal; em 1975/77, o direito de voto (com presença) e, em 1991/92, o direito de voto por correspondência. Por fim, a coroação ocorreu em 2014, quando entrou em vigor a Lei federal dos suíços do estrangeiro. Altermatt considerou, porém, que ainda existe um aspecto afetivo que justifica a existência das associações suíças no exterior. “A situação mudou, mas a ideia de emigração e do retorno à Suíça continuam sendo realidade até hoje.”
Mostrar mais
Escapando da gaiola dourada
Link externoMundo de oportunidades
Adrian Beer, residente na Espanha, foi convidado para contar suas experiências e visões (ouvir áudio) como suíço do estrangeiro. Depois dos estudos na Espanha, Estados Unidos e Suíça, ele fundou uma empresa internacional atuante na área de descontaminação de solos. Em sua palestra em Berna, ele vislumbrou um cenário pessimista para o mundo. A população crescente, os problemas ligados ao aquecimento global e poluição são uma grande ameaça. “A humanidade vai se autodestruir?”, questionou-se. A solução ao seu ver é um esforço conjunto das nações no aproveitamento dos recursos e infraestruturas do planeta. “Essa união permitiria uma distribuição mais justa dos recursos naturais.”
Madeleine Betschart, diretora do Centro Dürrenmatt em Neuchâtel, criado para administrar a difundir a obra do escritor suíço Friedrich Dürrenmatt (1921-1990), entrou logo depois no pódio. “Vinte e cinco anos após a sua morte, ele é hoje o escritor suíço mais traduzido no mundo e executado no teatro”, lembrou. Em sua opinião, a cultura também tem um papel importante de veicular novas ideias e, finalmente, unir as pessoas, não importa em que parte do mundo.
Para falar sobre a internacionalização da ciência, Mauro Dell’Ambrogio, secretário de Estado para Formação, Pesquisa e Inovação, no ministério suíço da Ciência, destacou a importância das fronteiras abertas. “Somos um dos países, cujos cientistas mais têm intercâmbios com pesquisadores em outros países”. O sistema de formação profissional é um dos produtos de exportação da Suíça. “O que existe de especial: 65% dos jovens faz uma formação, onde eles aprendem nas escolas e, ao mesmo tempo, trabalham. É o sistema dual”, explicou Dell’Ambrogio.
A situação é conhecida por muitos suíços do estrangeiro quando vivem em países com níveis elevados de desemprego juvenil. “Onde coloca-se o máximo possível de jovens nas universidade, dos quais muitos acabam não concluindo a formação e se o fazem, mesmo com o diploma, têm dificuldade para encontrar”, declarou Dell’Ambrogio, acrescentando receber muitos visitantes do exterior interessados em conhecer de perto o sistema de ensino helvético. “Muitos consideram o nosso sistema quase revolucionário.”
Mídia em revolução
O último convidado, Mariano Tschuor, lembrou das suas próprias raízes para se identificar com os suíços do estrangeiro.
Originário dos Grisões, cantão montanhoso localizado ao sudeste do país, ele iniciou seu discurso em reto-romano, o quarto idioma da Suíça, e foi respondido com um sonoro aplauso. Responsável por mercado e qualidade na Sociedade Suíça de Radiodifusão e Televisão (SRG SSR), Tschuor lembrou que um quarto da população dos Grisões emigrou no século 19 por questões econômicas. “Por isso prefiro não falar em 5° Suíça, pois então teremos de nos perguntar o que seria a 1a., 2a, 3a, ou 4a. Suíça? Não seriam apenas números?”, afirmou.
Tschuor considerou que as mídias vivem hoje uma revolução, especialmente graças à internet. “Cada um pode ser autor de verdades, meia-verdades ou até mesmo calunias”. A resposta, ao seu ver, é investir em jornalismo de qualidade, seja pelo serviço público ou empresas privadas. “Isso é muito importante especialmente em uma democracia direta, como é o caso da Suíça.
Futuro da OSE
Na discussão final sobre as perspectivas de futuro para a OSE, seus representantes declararam que a estratégia é investir mais na informação e melhoria dos seus canais. “A Revista Suíça, hoje distribuída eletronicamente, é um exemplo disso”, disse Sarah Mastantuoni, codiretora. A organização também vai reforçar o trabalho de lobby em prol do voto eletrônico. E finalmente, ela quer melhorar a sua imagem. “Queremos tornar a OSE mais conhecida, especialmente entre os jovens, e reforçar os contatos com eles”, completou Ariane Rustichelli, a segunda codiretora.
No fim do dia, os representantes do Parlamento dos jovens suíços do estrangeiro fizeram uma exposição do seu ponto de vista, afirmando que “os jovens suíços do estrangeiro são motivados e querem se engajar. Mas para isso é preciso que lhes dê espaço para se exprimir e se organizar.
O próximo congresso será realizado em 2017 na Basileia.
Estatísticas dos suíços do estrangeiro
Segundo dados do ministério suíço das Relações Exteriores (EDA, na sigla em alemão), 761.930 suíços viviam no exterior em 31.12.2015. (2014: 746.885).
A maior parte deles vive na Europa (61.97%): 472.202. Outro grande grupo espalha-se pelo continente americano (24.11%)
A maior comunidade suíça no continente reside na França (198.647), Alemanha (86.774), Itália (51.556), Grã-Bretanha (33.745) e Espanha (24.721)
A segunda maior comunidade reside no continente americano: EUA (80.218), Canadá (39.869) e Brasil (15.730).
Na Coreia do Norte vivem apenas cinco pessoas com o passaporte suíço. Em países como Palau, Kiribati, Turcomenistão e São Tome e Príncipe vive apenas um cidadão suíço.
Os interesses da diáspora helvética na Suíça são representados há cem anos pela OSE. Ela congrega 750 associações e clubes suíços em todas as partes do mundo.
Certificação JTI para a SWI swissinfo.ch
Mostrar mais: Certificação JTI para a SWI swissinfo.ch
Veja aqui uma visão geral dos debates em curso com os nossos jornalistas. Junte-se a nós!
Se quiser iniciar uma conversa sobre um tema abordado neste artigo ou se quiser comunicar erros factuais, envie-nos um e-mail para portuguese@swissinfo.ch.