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O diálogo como resposta à crise internacional 

Alain Berset conversa com correspondentes estrangeiros
No encontro anual da Associação dos Correspondentes Estrangeiros na Suíça, o presidente da Confederação Alain Berset expressou sua preocupação com a expansão do populismo pelo mundo, mas disse confiar na força da democracia suíça, cuja "monotonia" foi duramente conquistada. Jamil Chade

Contra a tensão, o diálogo. Contra a desconfiança internacional, a cooperação. E contra o populismo, a informação. São essas as receitas que apresenta o presidente da Confederação Helvética, Alain Berset, e sugere que cabe à diplomacia suíça o papel de facilitar essas respostas diante um cenário mundial marcado por um acirramento de posições. 

Em um encontro com cerca de 50 jornalistas estrangeiros nesta segunda-feira (5) em Berna, Berset apresentou a visão suíça do mundo e seus desafios. O homem que acumula em 2018 o cargo de presidente da Suíça e o Departamento de Interior não deixa dúvidas: o momento é de transformação. 

“Talvez estejamos assistindo a uma erosão, ainda que lenta, do sistema internacional fundada sobre o direito”, disse Berset, apontando que esse é um fenómeno que “preocupa” a Suíça. “Há uma crise do multilateralismo, com consequências de curto e longo prazo”, avaliou.

Em seu radar estão assuntos como a desigualdade, a propagação de extremismos, terrorismo, fluxo migratório e mudanças climáticas. “Diante desse cenário, o engajamento da Suíça se mostra essencial”, defendeu. Três assuntos marcam essa esforço de Berna: o trabalho pela paz, pela democracia e pelo meio ambiente.

Papel central de mediação

Para ele, governos precisam assumir responsabilidades, e lembra de como a Suíça continuará apostando em sua ação como intermediário entre os EUA e o Irã, entre os iranianos e sauditas e entre russos e o governo da Geórgia. “Vamos continuar a investir nisso”, prometeu.

“Com a crise do multilateralismo, nunca o diálogo foi tão importante como hoje. É a alternativa ao conflito”, defendeu.

Em sua avaliação, é “paradoxal” que diante de problemas com dimensões claramente internacionais, a reação de governos e países tem sido a de se fechar em si mesmos. “Existe uma tendência a procurar respostas domésticas, uma tendência à polarização e desconfiança em relação aos demais”, alertou. 

“Diante dessa realidade, a resposta precisa ser internacional. Não podemos lidar com o desafio ambiental sozinhos”, insistiu. 

Em defesa da monotonia

A estratégia suíça de buscar e oferecer o diálogo, porém, não é apenas uma política altruísta. “A estabilidade é fundamental para a Suíça”, lembrou seu presidente.  

Berset admite que nem mesmo a Suíça está isenta dessas tentações isolacionistas que afetam outros países. Como exemplo, ele cita a votação marcada para o dia 25 de novembro, sobre a iniciativa da Autodeterminação.

A iniciativa popular tentar modificar a forma pela qual a Suíça trata seus acordos internacionais, caso haja um conflito entre esses tratados e a lei doméstica. Para os proponentes da votação, a Constituição precisa sempre ser considerada como estando acima dos tratados internacionais. Em alguns casos, não se exclui nem mesmo a possibilidade de que certos acordos tenham de ser renegociados, enquanto em outros a Suíça simplesmente teria de abandona-los. 

“Essa é uma iniciativa que colocaria em questão os acordos internacionais. Colocaria incerteza em nossas relações”, alertou. “Para um país que exporta um terço de sua produção, a estabilidade é fundamental”, disse. “Se a Suíça vai bem economicamente e em termos sociais, é pelos tratados internacionais e o que a estabilidade criou”, apontou.  

Ironizando sua própria situação, Berset não desperdiçou a ocasião para fazer um elogio ao que muitos no exterior veem como um cenário político, social e econômico monótono na Suíça. “Somos monótonos. Mas isso é positivo e traz estabilidade. Lutamos muito por essa monotonia”, disse. 

Política e imprensa sob a mesma ameaça

Seu discurso ocorreu na ocasião dos 90 anos da Associação da Imprensa Estrangeira na Suíça. E, não por acaso, Berset deixou claro que as autoridades suíças reconhecem o desafio que a redes sociais e a Internet passaram a representar, alimentando movimentos populistas. “Políticos e a imprensa enfrentam os mesmos dilemas”, constatou. 

“O populismo sempre existiu. Mas com as redes sociais, as regras do jogo mudaram. Está cada vez mais difícil fazer a voz dos jornais serem ouvidas, mesmo tendo mais informações”, disse. Berset estima que uma das consequências dessas novas regras do jogo tem sido a fragmentação de debate e o aumento do populismo. 

“Nunca foi tão importante a sociedade ter um debate, e só a imprensa de qualidade tem essa capacidade”, defendeu. “Sempre haverá a necessidade por um jornalismo de alta qualidade”, insistiu. “Precisamos de diálogo e a imprensa facilitar esse diálogo, completou.  

O presidente da Confederação Alain Berset dando entrevista coletiva
Alain Berset mostrou-se diplomaticamente cauteloso sobre o resultado da eleição presidencial no Brasil: elogiou a forma democrática como foi conduzida, mas espera que o novo governo mantenha a estabilidade nos seus compromissos internacionais. Keystone

E o Brasil…?

A Suíça espera que o novo governo brasileiro coloque a luta contra a corrupção como uma de suas prioridades e insiste que o combate contra esse fenômeno garante a entrada de recursos no país. 

“Nós estamos muito vinculados evidentemente com condições que sejam o mais transparentes e claras possíveis”, disse, ao ser questionado sobre a luta contra a corrupção no Brasil. “Para uma empresa que invista em outro país, o princípio da legalidade, da igualdade, da transparência, que a gente saiba com o máximo de precisão possível que situação a gente vai confrontar, são muito importantes”, apontou. 

“Lutar contra a corrupção é criar condições que permitam aos investidores estrangeiros se instalarem e prosperarem”, defendeu o presidente da Suíça.  

Nos últimos quatro anos, foi a cooperação da Suíça que garantiu alguns dos principais trunfos da Operação Lava Jato. Berna repassou ao Brasil milhares de documentos e informações que resultaram em vastas investigações.  Os suíços haviam identificado mais de mil contas bancárias e ativos superiores a US$ 1,1 bilhão. Parte desse dinheiro já foi devolvido.

Quanto ao futuro das relações entre Suíça e Brasil, o presidente do país alpino deixou claro que espera a manutenção da cooperação.  “Temos uma boa relação com o Brasil. Temos muitas trocas e contatos no plano político, econômico e cultural”, disse. “Eu acho que esse contato vai continuar. Mas, naturalmente, pra isso é preciso que as condições que temos até agora continuem, que essas condições perdurem. Acho que vai ser o caso. Nós vamos observar o que vai acontecer”, ponderou.    

“O Brasil teve uma eleição democrática. Nós estamos muito felizes por essa eleição democrática. Eu acho que precisamos ver o que vai acontecer concretamente”, disse. 

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