Os destinos do planeta serão decididos em Paris
Um novo acordo universal sobre o clima vai reunir as delegações de quase 200 países, entre os dias 30 de novembro e 11 de dezembro. O objetivo: limitar a dois graus centígrados o aquecimento global. swissinfo.ch ilustra os pontos chaves da COP, respondendo a algumas importantes questões.
COP21: três letras e dois números encerram em si o destino das gerações do futuro. Laurent Fabius, ministro das Relações Exteriores da França, é o presidente da 21.ª Conferência do Clima (COP 21) das Nações Unidas. E ele não se cansa de repetir: o encontro de Paris é uma oportunidade “vital”.
Após mais de trinta anos de discussões complexas sobre o clima e, principalmente, depois do fracasso da conferência de Copenhague, em 2009, o mundo deve tomar providências, novamente. Bruno Oberle, diretor do departamento federal do ambiente (Ufam), está confiante. “Pela primeira vez existe um amplo consenso sobre a vontade de mudar de rota. Até as grandes potências, como a China e os Estados Unidos, reconhecem a necessidade de agir”, afirma.
O que se discute em Paris?
A COP21 tem dois principais temas: a redução das emissões de gases de efeito estufa e o suporte às políticas climáticas nos países em desenvolvimento. O objetivo do protocolo de Paris é limitar o aquecimento global em dois graus centígrados, tendo como referência o período pré-industrial (em torno a 1850). Além deste patamar, as consequências seriam desastrosas, de acordo com um grupo de especialistas climáticos das Nações Unidas (IPCC).
Os organizadores esperam que se possa alcançar um acordo internacional e com regras vinculantes. Seria a primeira vez, desde o Vértice sobre a Terra no Rio de Janeiro, a ECO 92, em 1992. Ao novo compromisso, ao contrário do protocolo de Kyoto, todos os países do planeta deverão aderir e colocá-lo em prática quando entrar em vigor, a partir de 2020. “Cada país tem que fazer um esforço”, afirma Franz Perrez, chefe das negociações da Suíça. A sua expectativa é a inclusão de uma cláusula de revisão, para facilitar o controle dos empenhos assumidos. “Idealmente, a cada cinco anos”, ressalta.
Por que a conferência do clima é tão importante?
A concentração de CO2 na atmosfera superou os 400 ppm (partículas por milhão), o valor mais alto desde o começo das observações científicas. A primeira década deste século foi a mais quente dos últimos mil anos e caminha-se para um novo recorde, até o final de 2015.
Medo do terrorismo durante a COP21
Os atentados de 13 de novembro em Paris e o consequente alerta de terror também têm impacto sobre a 21ª Conferência do Clima (COP21).
Na capital e em outras cidades francesas, as autoridades decidiram cancelar as manifestações públicas programadas para o final do encontro em 12 de dezembro, assim como outras grandes concentrações. Eventos em salas fechadas, e em locais onde a segurança pode ser garantida, poderão permanecer autorizadas.
ONGs e defensores do meio ambiente lamentam a decisão, apesar de compreendê-la. Sem a mobilização das massas os acordos do clima terão pouco impacto, acreditam os ativistas da coalizão “Clima 21”, que já pensam em alternativas.
A tensão será elevada durante o dia de abertura da COP21 com a presença já confirmada de dez chefes de Estado e governo.
Desde 1880, a temperatura terrestre já aumentou de 0,85 °C e poderá crescer até 5 °C ao fim deste século. O resultado: cidades submersas pela elevação do nível do mar, fenômenos extremos (inundações, ondas de calor, secas…) sempre mais frequentes e uma drástica redução das colheitas.
A corrida contra o tempo já começou, até porque o crédito global de carbono (ou seja, a quantidade de emissão de teor de CO2 que respeite o limite dos 2 graus) se aproxima do fim. ” Os 2/3 já foram utilizados. Neste ritmo, chegaremos ao fim da linha em 25 anos”, observa Bruno Oberle. E mais se espera, adverte a ONU, maiores serão a dificuldade e, principalmente, os custos de redução das emissões geradas pela queima excessiva dos combustíveis fósseis.
Quem vem para a COP21?
A Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC) reúne todos os membros da ONU, ou seja, 195 países e a União Europeia. Em Paris, estarão ainda quatro mil participantes em torno a centenas de chefes de Estado e de governo, entre eles o americano Barack Obama e o chinês Xi Jinping. A ministra do Ambiente, Doris Leuhtard, e a presidenta da Confederação, Simonetta Sommaruga, representarão a Suíça.
As discussões ocorrem dentro de grupos e subgrupos de negociações que almejam objetivos diversos. A Suíça lidera o chamado “ Grupo de integridade ambiental”, com
Liechtenstein, México, Mônaco e Coréia do Sul. Um grupo restrito, mas heterogêneo e capaz de assumir um papel importante, segundo Bruno Oberle. “É o único composto de países industrializados e em transição. Se dentro deste grupo conseguirmos encontrar um compromisso já será um bom sinal para termos um ponto de partida em escala global”.
Quais são as bases para a abertura da Conferência?
Com Paris ao horizonte, os Estados membros da UFCCC são convocados para a apresentação das próprias “contribuições nacionalmente determinadas pretendidas” (em inglês, INDC) – documento voluntário de redução e remoção dos gases de efeito estufa – para o período após 2020. Mais de 160 países – representantes de mais de 90% das emissões no planeta e da população mundial – já comunicaram os seus objetivos e empenhos. Em fevereiro, a Suíça foi a primeira a anunciar os seus compromissos: redução de 50%, até 2030 (tendo 1990 como referência), e de 70 a 85%, até 2050.
Porém, os empenhos sobre a mesa de trabalho são insuficientes para o alcance do objetivo de dois graus centígrados, alertam os pesquisadores independentes do Climate Action Tracker. Eles preveem um aumento de 2,7ºC. “Não é suficiente, mas é muito melhor do que os quatro a cinco graus estimados no caso de inércia total”, comentou Christiana Figueres, secretário geral da UNFCCC.
Quais são os pontos suspensos?
As opiniões divergentes existem, principalmente, sobre as questões da responsabilidade histórica do aquecimento global e das divisões dos esforços. Os países emergentes acham que este peso pertence aos países industrializados, antes de tudo. Para as nações mais avançadas, esta distinção entre “ricos e pobres” não serve como justificativa.
A Suíça defende esta posição e, em Paris, vai insistir para que todos os países submetam, em vistorias periódicas, os objetivos de redução das emissões, de acordo com as suas possibilidades e capacidades. Para Bruno Oberle, “a distinção entre países industrializados e em desenvolvimento, nos quais estão nações como a China, a Coréia do Sul ou Cingapura, deve ser eliminada”. Atualmente, recorda, mais da metade das emissões mundiais (61%) tem origem nos países emergentes, em desenvolvimento.
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O clima está mudando
Outro ponto sensível: a modalidade de financiamento de políticas climáticas, nos países menos industrializados. Em Copenhague, os países industrializados concordaram em oferecer 100 bilhões de dólares, por ano, até 2020. Segundo um recente relatório da Organização para a cooperação e o desenvolvimento econômico, os fundos públicos e privados prometidos pelos países doadores, em 2014, somavam pouco mais da metade (cerca de 62 bilhões).
Para o diretor da Ufam, todos os países capazes de doar devem sustentar aqueles em dificuldade. “É uma questão de solidariedade”, afirma, torcendo pelo aumento no grupo de doadores (a Suíça participa com 100 milhões de francos, pelo período entre 2015-17. O novo acordo sobre o clima, ressalta, deve garantir investimentos mais ecológicos, além de levar em conta o papel fundamental dos mercados financeiros nestas operações.
Paris, sucesso ou outro fracasso?
Prever o êxito da conferência de Paris é pura especulação. E não apenas porque a questão climática, onipresente na mídia nos meses que antecederam a COP21, foi deixada em segundo plano por causa dos atentados e das novas ameaças terroristas.
Na mesa de negociações, cada um vai defender os próprios interesses. Levantando muita perplexidade, o secretário de Estado norte-americano, John Kerry, já anunciou que em Paris não vai sair nenhum acordo vinculante. O presidente francês, François Hollande reagiu imediatamente ao afirmar que “vai ter um acordo vinculante ou nada”. De qualquer forma, o planeta não poderá resolver o problema do aquecimento global em apenas duas semanas. Paris é apenas um recomeço, talvez, um outro início.
Mais de trinta anos de discussões
1979: primeira conferência do clima em Genebra
1992: a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (CNUMAD) – Cúpula da Terra – ocorrida no Rio de Janeiro firma a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima, também conhecida como UNFCCC (do original em inglês United Nations Framework Convention on Climate Change).
1997: Firmado o Protocolo de Quioto. O acordo, ratificado por 50 países (não pelos EUA), exigia entre o período de 2008 a 2012 uma redução de emissões de 5% em relação aos níveis de 1990.
2009: A Conferência Mundial do Clima em Copenhague termina sem um acordo para o período após 2020.
2010: No final da Conferência Mundial do Clima em Cancun, México, os países ratificam um sistema voluntário de objetivos de redução das emissões de gases com efeito de estufa até 2020.
2012: Na Conferência Mundial do Clima em Doha, Catar, a principal decisão concreta foi a extensão do Protocolo de Quioto para 2020.
2014: Conferência Mundial do Clima em Lima, Peru, determina metas e visões do clima para pós-2020.
2015: Na Conferência Mundial do Clima em Paris planeja-se um novo acordo global e vinculativo.
Fonte: Departamento Federal de Meio Ambiente (BAFU)
Adaptação: Guilherme Aquino
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