Políticos hesitam apesar dos riscos para a saúde
Novos estudos realizados na Suíça confirmam que as restrições ao fumo em locais públicos são benéficas para a saúde de quem trabalha em restaurantes. Apesar de reconhecerem os resultados, as autoridades sanitárias do país preferem não apoiar um arrocho nas leis contra o fumo.
O governo está pedindo que os suíços digam não, no plebiscito de 23 de setembro, à iniciativa proposta por organizações de saúde visando proibir o serviço de garçom nas áreas reservadas para fumantes.
Atualmente, a Suíça parece uma colcha de retalhos quando se trata de legislação sobre a proibição de fumar em lugares fechados. A lei federal introduziu, em 2010, a proibição de fumar em locais públicos, em princípio, mas permite exceções.
Dos 26 cantões, em apenas oito ficou sendo completamente proibido fumar em restaurantes e cafés. Nos outros, continua sendo permitido fumar em áreas reservadas para fumantes, ou em bares especiais para usuários de tabaco. Nestes estabelecimentos, os funcionários devem dar seu consentimento por escrito para trabalhar neles.
Os últimos estudos mostram que a proibição total é salutar. Uma pesquisa realizada pelo Instituto Suíço de Saúde Pública e Tropical (TPH) em três cantões encontrou evidências de que a saúde dos funcionários de restaurantes melhorou nos estabelecimentos sem fumo.
Conduzido por Martin Röösli, professor de medicina social e preventiva da Universidade da Basileia, o estudo mediu a variabilidade da frequência cardíaca e a velocidade da onda de pulso dos empregados de restaurantes antes e 12 meses após a aplicação da proibição de fumar.
“A redução da fumaça de cigarros no local de trabalho levou a uma melhoria mensurável na saúde cardiovascular”, disseram os pesquisadores.
Em outras palavras, os empregados que deixaram de ser fumantes passivos reduziram significativamente os riscos de ataques cardíacos e arteriosclerose. Para os garçons que continuam trabalhando em locais para fumantes, no entanto, esta melhoria não pode ser observada, de acordo com o TPH.
Essas descobertas parecem sustentar os resultados de três estudos complementares realizados em diferentes regiões do país.
Insuficiência cardíaca
No cantão do Ticino, na região de língua italiana, onde fumar em restaurantes foi limitado a salas especiais com serviço de garçom em 2007, pesquisadores liderados por Marcello Di Valentino, analisaram o número de pacientes internados por ataques cardíacos.
Comparando os dados de antes e depois da introdução das medidas contra o fumo passivo, revelou-se uma diminuição nítida nas internações. 22% e 21% a menos, no primeiro e segundo ano respectivamente, em relação a uma média de três anos anteriores às leis antitabagismo.
Um estudo semelhante realizado no cantão dos Grisões (leste), parece confirmar os resultados do Ticino. Uma equipe comandada pelo cardiologista Piero O. Bonetti, em Coira, observou uma diminuição de 21% nos casos de insuficiência cardíaca aguda.
Como parte do estudo dos Grisões, os cientistas também compararam seus resultados com dados de Lucerna, um cantão que não tinha restrições ao fumo antes de 2010. Nesse cantão, os casos de insuficiência cardíaca estavam aumentando antes que a adoção de normas mínimas para todo o país fossem aprovadas pelo parlamento.
Pneumonia
Por fim, um estudo de casos de pneumonia e inflamação crônica do pulmão, realizado no cantão de Genebra, mostrou uma diminuição de 19% das internações por broncopeneumopatia aguda, após a proibição total de fumar em restaurantes e bares, introduzida em 2009.
“Esta é a primeira vez que temos provas científicas desse impacto”, diz Jean-Paul Humair, responsável do estudo.
Os cientistas também observaram uma redução das doenças do coração e dos vasos sanguíneos. No entanto, Jean-Paul Humair diz que a evidência estatística não foi suficiente para vincular os fatos além de qualquer dúvida razoável.
Ele explica que Genebra já havia introduzido gradualmente a proibição de fumar em locais públicos e de trabalho no final dos anos 2000. Por isso, os casos de doenças cardiovasculares já haviam provavelmente começado a diminuir desde aquela época, apesar do estudo ter sido feito entre 2006 e 2012.
Contradição
Os resultados são plenamente reconhecidos pela Secretaria Federal de Saúde. Patrick Vuillème, biólogo e especialista em prevenção do tabagismo, elogia os estudos pela “alta qualidade” e descreve a abordagem metodológica como “rigorosa”.
O ministro do Interior, Alain Berset, e o diretor da Secretaria Federal de Saúde, Pascal Strupler, mencionaram os resultados dos estudos em uma entrevista coletiva preparatória ao plebiscito, sublinhando os riscos à saúde do fumo passivo.
E o governo e a Secretaria de Saúde alertam em sua documentação oficial que a exposição à fumaça do tabaco “nunca é inofensiva”.
Mas, apesar de concordar com os autores da iniciativa contra o tabagismo passivo, essas autoridades têm recomendado que os eleitores suíços rejeitem a proposta. A lei atual tem tido um impacto positivo e um reforço das regras seria prematuro, argumentam.
As declarações podem deixar muitos cidadãos se perguntando se as autoridades não estariam se contradizendo.
“É lógico que não!”, garante Patrick Vuillème.
O governo e a administração tem que considerar o lado científico, bem como aspectos de saúde, tendo em conta os pontos de vista políticos, explica o biólogo.
A legislação antitabagismo aprovada pelo Parlamento há dois anos gerou duras discussões que resultaram em um acordo.
“O governo está vinculado às decisões do Parlamento e a Secretaria Federal não deve contradizer o governo. E, afinal, os eleitores é que têm a última palavra”, diz Vuillème.
O Parlamento suíço aprovou em 2010 normas mínimas para proteger os não-fumantes contra o fumo passivo em locais de trabalho fechados, incluindo restaurantes.
A lei permite exceções, incluindo cafés especiais ou salas de fumante com serviço de garçom.
Somente oito dos 26 cantões, particularmente no oeste da Suíça, introduziram proibições rigorosas nos restaurantes.
A Liga Pulmonar reuniu assinaturas suficientes para lançar a votação destinada a impor uma proibição total em âmbito nacional.
Nos termos da Constituição suíça, os cantões têm ampla autonomia sobre a saúde pública e outras questões.
As leis antitabaco variam na Europa. De acordo com uma pesquisa realizada pela Secretaria Federal de Saúde, a implementação das proibições em bares e restaurantes nem sempre é consistente.
A Grã-Bretanha, Irlanda, Espanha, Noruega e Grécia impuseram uma proibição total.
Na França, Itália, Suécia, Polônia, Finlândia, Bélgica, Estônia e Malta é permitido fumar em salas sem serviço de garçom.
Todos os outros países europeus, incluindo a Suíça, têm legislação desigual, permitindo áreas especiais e bares para fumantes.
Adaptação: Fernando Hirschy
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