“Alternativa à austeridade venceu”, diz economista da ONU
O resultado das urnas em Portugal foi interpretado como um sinal de que a população aposta numa alternativa à austeridade, o receituário apresentado pela UE e pelo FMI aos países que, no início da década, mergulharam em uma crise sem precedentes nos últimos 70 anos. A avaliação é do diretor do Departamento de Globalização e Políticas de Desenvolvimento da Conferência da ONU para Desenvolvimento e Comércio (Unctad), Richard Kozul-Wright.
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Jamil Chade, swissinfo.ch
Neste fim de semana, o Partido Socialista saiu como o grande vencedor nas eleições gerais de Portugal. O primeiro-ministro, António Costa, terá agora a missão de negociar a formação de um novo governo.
Os socialistas, que já governaram nos últimos quatro anos, ficaram com 36% dos votos, ampliando o apoio que tiveram em comparação às últimas eleições. Em 2015, o Partido Socialista tinha conseguido 86 assentos no Parlamento. Agora, somam 106.
Mas ainda não conseguiram maioria absoluta para poder governar e terão de buscar uma aliança com partidos menores.
Alternativa à austeridade
Costa, com 58 anos, chamou a atenção de toda a Europa quando começou a reverter algumas das principais medidas de austeridade, recomendadas por Bruxelas e pelo FMI. Equilibrando controle nas contas do estado e investimentos sociais, seu partido conseguiu fazer com que a economia portuguesa voltasse a crescer.
“Obviamente Portugal tem suas especificidades em termos políticos e deve ser dito que a crise em Portugal não foi a mesma daquela que atingiu a Grécia. A dimensão da austeridade imposta não foi a mesma e o governo conseguiu proteger alguns dos gastos sociais, inclusive aumentando os salários”, explicou Kozul-Wright. “Mas existem elementos que são similares”, disse.
Na visão do economista, a coalizão formada desde 2015 e liderada pelos socialistas “permitiu que uma alternativa ao receituário” da UE e do FMI fosse implementado. “E parece que isso funcionou, com a economia crescendo”, disse. “No fundo, o resultado da eleição foi a constatação de que as pessoas querem uma alternativa à austeridade”, constatou.
Modelo
“Portugal, na periferia, conseguiu construir um modelo que teve sucesso” disse. Segundo Kozul-Wright, esse modelo teve como base o mercado externo, justamente para compensar a queda do poder aquisitivo local e o impacto dos anos da recessão, até 2014.
“O modelo foi baseado nas exportações e no turismo”, disse. “Mas a grande questão é saber se esse modelo é sustentável e esse não parece ser o caso”, questionou.
O economista destaca como a estratégia adotada por Lisboa apenas pode funcionar enquanto a Europa der sinais de crescimento, já que depende do consumo externo. “Outros países, como a Alemanha, estão vendo que existem limites para esse modelo”, afirmou. Berlim passou a viver um momento de incerteza diante da desaceleração da economia europeia, seu principal destino de exportação.
“Se a economia da UE desacelerar ainda mais, que é a nossa projeção, será que esse modelo continuará a ter sucesso? Não parece ser o caso”, afirmou.
Expansão fiscal
Kozul-Wright estima que o governo socialista em Portugal “usou as flexibilidades” que existiam no modelo econômico estabelecido em Bruxelas. Mas não se pode dizer que ele de fato rompeu com o receituário da UE e do FMI. “Nossa avaliação é de que existe espaço para uma maior expansão fiscal e isso não tem sido usado. O desafio é que nenhum país pode ficar dependente da demanda dos demais”, completou.
A vitória dos socialistas também foi vista como um contraponto à onda de extrema-direita que marcou as eleições nacionais pela Europa nos últimos meses. Mas, na avaliação dos economistas, o resultado poderia ter sido diferente se os sinais de crise na economia da UE tivessem chegado antes.
Para 2019, o comércio internacional deve ter seu terceiro pior ano em três décadas, com uma expansão de apenas 1,2%. De acordo com dados da OMC, países que dependem das exportações poderão ser os principais afetados neste ano e em 2020.
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