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Recuperação da Ucrânia precisará de “democracia mais forte e resiliente”

Ukraine damaged building.
Um prédio residencial na cidade de Serhiivka, perto de Odessa, no sul da Ucrânia, foi atingido por um bombardeio em 1º de julho de 2022. Pelo menos 19 pessoas foram mortas e outras 38 ficaram feridas, incluindo seis crianças. Keystone / Str

Na Conferência de Recuperação da Ucrânia em Lugano, a secretária-geral do Conselho da Europa, Marija Pejčinović Burić, anunciou o lançamento de novas ferramentas para monitorar e fortalecer os padrões democráticos, além de pedir aos Estados membros que façam sua lição de casa democrática – incluindo a Suíça.  SWI swissinfo.ch conversou com Burić durante a cúpula.

O Conselho da Europa, principal órgão de direitos humanos do continente, está sediado em Estrasburgo.  É composto por 46 países europeus e foi criado após a Segunda Guerra Mundial para promover a democracia, proteger os direitos humanos e o Estado democrático de direito na Europa. A Rússia ingressou no conselho em 1996 e foi formalmente excluída em 16 de março após a invasão da Ucrânia.

Marija Pejčinović Burić
Marija Pejčinović Burić é a 14ª Secretária Geral do Conselho da Europa. A antiga vice-primeira-ministra croata foi eleita em 2019 para liderar a organização das 46 nações. SWI swissinfo.ch / Carlo Pisani

SWI swissinfo.ch: Desde 24 de fevereiro, dois membros do Conselho da Europa – um deles agora ex-membro – estão em guerra.  Como é possível que um Estado membro da mais importante organização internacional para a democracia e os direitos humanos possa atacar outro?

Marija Pejčinović Burić: Os estatutos do Conselho da Europa obrigam todos os estados membros a seguir regras para a paz e a unidade.  Desenvolvemos mais de 200 instrumentos jurídicos para salvaguardar isso.  Consequentemente, tivemos que expulsar imediatamente a Federação Russa quando eles lançaram sua agressão não provocada contra outro estado membro, a Ucrânia.  Esta foi, infelizmente, a única opção disponível para preservarmos nossos valores.  Esta é a primeira vez desde o estabelecimento do Conselho da Europa [em 1949] que um Estado membro foi expulso.

SWI: A Rússia foi membro do Conselho da Europa por mais de vinte e cinco anos.  Não é uma falha da organização que esta guerra não pôde ser evitada?

M.P.B.: Eu não chamaria isso de um fracasso do Conselho da Europa.  É uma falha do antigo Estado-membro afastar-se dos valores e padrões que subscreveu ao ingressar na organização.  Mas você está certo.  Esta guerra horrível levanta muitas questões para nós: como poderíamos ter evitado tal conflito?  Quais são as lições para nós?  Acho que precisamos de um mecanismo de alerta precoce muito mais forte para situações em países onde a democracia está retrocedendo.  No futuro, precisamos agir muito mais cedo assim que constatarmos que a Convenção Europeia de Direitos Humanos e outras normas são ignoradas por um estado membro.

SWI: Como isso funcionaria?

M.P.B.: O Conselho da Europa tem três métodos.  Primeiro, desenvolvemos e projetamos padrões comuns de democracia e direitos humanos para todos os envolvidos.  Em segundo lugar, monitoramos como esses padrões são mantidos.  E em terceiro, ajudamos os Estados membros a cumprir seus compromissos.  A guerra da Rússia contra a Ucrânia nos ensinou que há espaço para melhorias em nosso monitoramento e assistência.  Isso inclui ajudar grupos da sociedade civil que estão fora do Conselho em lugares como Belarus ou Rússia, por exemplo.

SWI: Aqui na Conferência em Lugano, mais de 50 países e organizações internacionais vêm discutindo medidas para ajudar a Ucrânia em sua recuperação.  O que é necessário para que a Conferência seja um sucesso?

M.P.B.: Só haverá uma recuperação efetiva se a Ucrânia desenvolver plenamente sua democracia.  E isso está intimamente ligado à resiliência da democracia e dos direitos humanos em toda a Europa.  Uma paz sustentável na Ucrânia e na Europa só é possível se a democracia for fortalecida.  É aqui que entra o Conselho da Europa com as suas normas para o Estado de direito, a proteção dos direitos humanos e a participação democrática dos cidadãos.

SWI: A Suíça é o país anfitrião da conferência de Lugano.  Como o país alpino pode ajudar a tornar a democracia mais resiliente na Europa?

M.P.B: A Suíça é um dos nossos estados membros que está na vanguarda do fortalecimento do Conselho da Europa.  Em muitos de nossos projetos, especialistas e representantes da Suíça já estão fazendo um bom trabalho.  Mas a Suíça também deve se perguntar como uma situação como a que estamos – um Estado-membro atacando outro e se afastando de nossos padrões comuns – pode ser evitada no futuro.  Uma parte importante da resposta é implementar plenamente esses padrões democráticos em casa.

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SWI: A Suíça fez sua lição de casa?

M.P.B.: De acordo com nosso monitoramento, a Suíça está entre os estados membros que mais estão em conformidade com nossos padrões.  No entanto, vemos problemas quando se trata de seguir as normas anticorrupção, especialmente no campo do financiamento de partidos políticos.  Também vemos espaço para melhorias no sistema judiciário: para que os juízes sejam independentes dos partidos políticos, por exemplo.

SWI: Nos próximos anos, a Federação Russa poderia retornar à família das democracias europeias?

M.P.B: Nossos estatutos são claros.  Todos os estados europeus podem se tornar membros de nossa organização – isso inclui a Rússia.  E sempre há um caminho de volta. Fomos estabelecidos após a Segunda Guerra Mundial para criar um continente de paz e estabilidade.  Mas, para voltar, a Rússia deve reformar-se e tornar-se totalmente democrática.  E estou certa de que muitas pessoas na Rússia saudariam esse desenvolvimento.  Essa é a razão pela qual começaremos agora a trabalhar mais de perto com a sociedade civil na Rússia, como já fazemos com organizações de cidadãos na Belarus, um país que não é membro do conselho, pois nunca cumpriu um de nossos principais requisitos – a abolição da pena de morte.

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Adaptação: Clarissa Levy
(Edição: Fernando Hirschy)

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