Soldados poderão manter armas em casa
Os eleitores suíços rejeitaram domingo por 56,3%, em plebiscito, uma iniciativa que pretendia proibir que os soldados do exército suíço guardassem em casa as armas militares, como fazem habitualmente.
O projeto divide os centros urbanos e a Suíça francesa, que votaram a favor, e os estados (cantões) rurais na Suíça alemã e a Suíça de língua italiana.
Somente seis estados (cantões) votaram a favor da iniciativa “pela proteção frente à violência dos armas”, proposta por partidos de esquerda e meios pacifistas. Vinte estados votaram contra. A participação foi de 49%.
Para ser aprovada, uma iniciativa popular precisa ter duas maiorias: dos estados e do povo, que também a rejeitou por 56,3%.
Os resultados definitivos demonstram que os pequenos estados da Suíça Central e Oriental, reputados por seu apego aos valores tradicionais, são os que rejeitaram mais claramente a iniciativa.
Appenzell foi o campeão da rejeição a 72,3%, Obwald a 71,9%, Schwyz s 70,9%, Uri à 70,6% Glaris s 69,8%. O Ticino, (sul, de língua italiana) votou contra a 63,5%.
Votaram a favor da iniciativa, Genebra (61,1%) , Vaud (53,7%), Neuchâtel (53,2%), Jura (52%), Basileia (58,9%) e Zurique (50,4%).
“Há uma divisão clara entre as cidades, mais favoráveis à iniciativa, e os estados mais rurais onde a maioria votou contra”, explica Claude Longchamp, diretor do instituto de sondagem gfs.berna.
Diferenciação
Para a deputada federal do Partido Liberal Radical (PLR), Silvie Perrinjaquet, membro do comitê contra a iniciativa das armas, os eleitores souberam diferenciar entre a violência doméstica e a interdição das armas. “Todo suíço se sente concernido pela arma em casa.”
As últimas semanas e os últimos dias foram decisivos, segundo a deputada. Os adversários da iniciativa (partidos de direita), conseguiram explicar aos eleitores “o que mudaria se a iniciativa fosse aprovada, principalmente na questão da violência doméstica”, enfatizada pelos autores da iniciativa.
Para o deputado federal do Partido do Povo Suíço (UDC, na sigla em francês), maior partido do país, “o povo suíço não se deixa desarmar”. Copresidente, do comitê contra a iniciativa, comemora o resultado claro. Isso demonstra que existe na Suíça uma tradição acerca das armas e uma confiança no povo.
O presidente do Partido do Povo Suíço, Toni Brunner, lamenta que a iniciativa já provocou um maior rigor na legislação sobre as armas. “O resultado é um limite. A arma militar e a munição fazem parte do soldado”, declara.
“Maturidade do povo”
O presidente do Partido Democrata Cristão (PDC) diz ficar aliviado pela “rejeição clara”. Christophe Darbellay reconhece ter vivido uma campanha difícil, pois ele próprio é caçador, atirador e presidente da Festa Federal de Tiro 2015.
O PDC está satisfeito da “maturidade do povo suíço” que “não se deixou enganar pelos argumentos emocionais da esquerda”, acrescenta Christophe Darbellay.
Ao rejeitar a iniciativa, o povo suíço se pronunciou pela responsabilidade individual e contra a burocracia do Estado, afirma Fulvio Pelli, presidente do Partido Liberal Radical (PLR).
A rejeição da iniciativa é saudada também pela Sociedade Suíça de Oficiais. Para seu presidente Hans Schatzmann, é um voto “a favor do mundo do tiro na Suíça”. Para a presidente da Federação Esportiva de Tiro, Dora Andres, a clara rejeição da iniciativa expressa a confiança do povo nos atiradores e caçadores
Saúde públca
Do lado oposto, a Federação dos Médicos Suíços (FMH) lamenta o resultado, pois ela a considerava como importante para a saúde publica. Porém, o presidente da FMH, Jaques de Haller, pensa que as mentalidades precisam de tempo para evoluir.
O deputado federal do Jo Lang, do Partido Verde, diz que não foi possível mobilizar as populações das cidades e das regiões rurais. Diz ainda que, aparentemente, os homens compareceram mais às urnas do que as mulheres, o que também pode ter influenciado o resultado.
Apesar do voto negativo à iniciativa, a Associação das Sociedades Femininas Suíças Aliança F, considera que o debate sensibilizou a opinião pública do fato que “as mulheres são ameaçadas pela arma no armário”, afirma Rosmarie Zapfl. Para ela, o resultado é explicado pela forte presença dos adversários na campanha.
O Grupo pela Suíça sem Exército (GSSA) atribui a rejeição da iniciativa ao orçamento dos adversários, segundo ele, dez vezes superior. O grupo denuncia uma “ligação viciosa entre as armas e a dignidade masculina”, feita pelos adversários.
Debate emocional
O Partido Socialista Suíço (PS) denuncia o debate emocional em torno dos valores suíços e do exército, praticado pelos adversários da iniciativa. O vice-presidente do PS, Stéphane Rossini, diz que campo do “não” negou o fenômeno dos suicídios com armas militares e a violência das armas, desviando o debate para a responsabilidade individual.
O presidente do OS, Christian Levrat, considera que o resultado do voto é “relativamente bom”, pois a iniciativa já deu resultados concretos importantes: obrigação de depositar a munição nos quartéis, revisão da lei das armas, possibilidade de deixar a arma no quartel.
Por sua vez, a Anistia Internacional julga que “a Suíça perdeu uma ocasião de ter um papel pioneiro no cenário internacional, criando um registro central de armas (como queria a iniciativa), exigência do futuro tratado internacional sobre o comércio de armas.” Segundo Manon Schik, diretora da seção suíça da AI, a “futura ratificação desse tratado por nosso país já está comprometida.”
Os suíços do estrangeiro votaram de maneira menos clara do que os concidadãos do país, na iniciativa sobre a violência das armas. É o que indica uma pequena análise de swissinfo.ch em oito estados (cantões).
Nos estados de Lucerna, Argóvia e Appenzel, os suíços do estrangeiro votaram ao contrário da maioria do estado. AP: (50,5% de «sim» entre os suíços do estrangeiro, 27,7% para a população local / AG: 51,4% e 38,6% / LU: 52,7% e 40,08%).
Uma maioria de “não” foi registrada nos estados de St-Gallen e Turgóvia, mas nos casos os resultados são mais apertados entre os suíços do estrangeiro (SG: 51,4% de “não” contra 60,8% de “não” para os residentes, TG: 51,8% conta 65,5%).
Nos estados de Basileia, Genebra e Vaud, a diferença é insignificante. Os suíços do estrangeiro votaram “sim”, como a população desses estados.
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