Suíça mantém bloqueio de bens do clã Duvalier
O Supremo Tribunal Federal (STF) em Lausanne não liberou a devolução ao Haiti dos fundos depositados na Suíça pelo clã do ex-ditador Jean-Claude Duvalier, o "Baby Doc", deposto em 1986.
Em reação à decisão judicial, o governo suíço bloqueou novamente o dinheiro e vai elaborar um projeto de lei especial sobre a questão do confisco de bens ilícitos de potentados.
Segundo a sentença do STF, proferida no dia antes do terremoto de 12 de janeiro e publicada na quarta-feira (3/2), os cerca de 5,7 milhões de dólares da família Duvalier congelados na Suíça não podem ser entregues ao Haiti porque os crimes de que o ex-ditador é acusado prescreveram segundo a lei suíça.
O Haiti havia pedido o bloqueio dos fundos em 1986, logo após a queda Jean-Claude Duvalier, que governou o país durante 15 anos, mas o dinheiro não foi entregue ao Haiti porque ex-ditador não havia sido indiciado.
Em 2002, o Conselho Federal (Executivo suíço) bloqueou os fundos com base na Constituição suíça para encontrar uma solução negociada sobre o indiciamento e o bloqueio dos bens.
Fracassadas as tentativas neste sentido, a Secretaria Federal de Justiça decidiu em 11 de fevereiro de 2009, após um novo pedido de assistência jurídica do Haiti, que o dinheiro deveria ser devolvido ao povo haitiano.
Em 12 de agosto de 2009, o Tribunal Penal Federal confirmou esta decisão por entender que a estrutura criada pelo clã Duvalier era “claramente uma organização criminosa” e que bens de origem criminosa devem ser devolvidos ao Estado atingido.
Delito prescrito
Advogados da família Duvalier recorreram dessa decisão ao STF, segundo o qual, por falta de um tratado entre a Suíça e o Haiti, a assistência jurídica com base na lei suíça não pode mais ser prestada nesse caso porque os crimes em questão prescreveram.
Pela lei suíça, o delito de “formação de organização criminosa” prescreve após 15 anos. Como Baby Doc foi derrubado em 1986, desde 2001 a assistência jurídica tornou-se impossível, argumentaram os juízes. E o dinheiro em questão não foi vinculado diretamente a crimes contra a humanidade, que têm prazo de prescrição mais longo.
O STF concluiu que a lei sobre assistência jurídica não é um instrumento adequado para a devolução de dinheiro de ex-ditadores. Os obstáculos jurídicos para os governos sucessores frequentemente seriam insuperáveis. O tribunal conclamou o Parlamento a tomar providências para futuramente melhorar o tratamento desses casos.
“O Supremo Tribunal Federal suspendeu a decisão do Tribunal Penal Federal principalmente por causa da prescrição, mas não a questionou quanto à origem delituosa dos bens”, diz um comunicado do Ministério suíço das Relações Exteriores (DFAE).
Nova lei
Segundo o comunicado, o governo suíço não quer que a praça financeira suíça sirva de refúgio para bens de origem criminosa. “Por isso, baseado na Constituição, ele decidiu bloquear novamente o dinheiro dos Duvalier.”
Além disso, o DFAE foi encarregado de elaborar um projeto de lei especial sobre como lidar com bens obtidos de forma ilícita por potentados. “Assim o Parlamento poderá debater e decidir em breve sobre o que deverá acontecer com os fundos dos Duvalier”, conclui a nota oficial.
O ministério pretende basear sua proposta num esboço apresentado pelo deputado federal Felix Gutzwiller (Partido Liberal Radical) sobre o tratamento a ser dado ao dinheiro bloqueado de “Estados falidos”, que não têm condições de comprovar, pelo princípios do Estado de Direito, a origem de bens usurpados por ditadores.
swissinfo.ch com agências
Jean-Claude Duvalier, de 58 anos, sucedeu o pai François Duvalier, o Papa Doc, aos 19 anos e governou o Haiti sob regime ditatorial de 21 de abril de 1971 a 7 d e fevereiro de 1986.
Após sua queda, fugiu para a França. O governo haitiano estima que seu clã levou mais de 100 milhões de dólares de dinheiro público para fora do país. Uma parte teria sido depositada em bancos suíços.
Seu pedido de asilo político foi negado por Paris, mas ele permaneceu no país com a mulher, Michèle, que tomou a maior parte de sua fortuna no divórcio, em 1993.
Tentativas de expulsá-lo da França não tiveram sucesso e, embora não apareça publicamente desde 2007, crê-se que ainda viva no país.
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