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‘A Suíça demonstrou uma falta de solidariedade em relação à equidade tributária global’

Male politician Fabian Molina
Fabian Molina, deputado federal do Partido Socialista, é contra o imposto mínimo da OCDE. Keystone / Alessandro Della Valle

Um “não” ao imposto corporativo mínimo da OCDE abriria o caminho para a criação de uma versão mais justa desse projeto de lei. É o que dizem os opositores do projeto de lei que será votado no próximo referendo. O deputado socialista Fabian Molina explica esse posicionamento em uma entrevista.

Com o imposto corporativo mínimo de 15%, os países da OCDE e do G20 querem, ao mesmo tempo, alcançar a equidade tributária global e combater a concorrência tributária internacional. Para implementá-lo, a Suíça, país membro da OCDE, deve alterar a sua constituição para que o governo federal possa intervir na soberania tributária dos cantões com um “imposto suplementar”. Os eleitores terão a palavra final em 18 de junho.

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SWI swissinfo.ch: Os países da OCDE querem tributar as multinacionais com uma mesma taxa, e a Suíça está concordando com isso. Como alguém de esquerda, você deveria estar comemorando. O que o incomoda nisso?

Fabian Molina: O fato de haver um imposto mínimo internacional é essencialmente um sucesso. O problema é que, ao implementar essa reforma da OCDE, a Suíça está alcançando o oposto do que a OCDE pretendia. Em vez de beneficiar a população, ela ajudará apenas algumas grandes corporações.

SWI: Como?

F.M.: A Suíça criou brechas em reformas tributárias anteriores. Uma delas é o chamado “Step Up”, introduzido em 2019, que permite que reservas ocultas sejam declaradas e que os lucros sejam tributados a uma alíquota reduzida. A outra é o princípio de investimento de capital, em vigor desde 2011, que permite que as empresas deem a seus acionistas uma parte dos lucros sem pagar nenhum imposto. Esse instrumento sozinho custou ao Estado entre CHF 3,6 bilhões (US$ 4,06 bilhões) e CHF 4,8 bilhões de 2011 a 2018, de acordo com estimativas do governo. E essas brechas não mudarão com o imposto mínimo da OCDE. Se as grandes corporações tiverem que pagar mais impostos, elas poderão compensar os custos extras usando esses dois instrumentos.

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SWI: Mesmo assim, espera-se que a receita tributária aumente em mais de CHF 1 bilhão com o imposto corporativo mínimo.

F.M.: Essa é apenas uma estimativa. Mas sabemos que a maior parte dessa receita adicional será destinada aos cantões de Zug e Basileia-Cidade. Zug, por exemplo, já anunciou que usará o dinheiro para reduzir os impostos dos mais ricos. As empresas também devem se beneficiar do chamado subsídio de localização. Pior ainda, se os cantões onde as empresas estão sediadas ficarem com a maior parte da receita tributária adicional, isso alimentará ainda mais a concorrência tributária entre os cantões. E, se as receitas adicionais beneficiarem principalmente dois cantões, isso será extremamente injusto com a população.

SWI: Pelo menos o dinheiro ficará na Suíça. Isso deveria ser bem recebido pela esquerda, não?

F.M.: As receitas devem beneficiar a população na Suíça e nos países de origem. A maioria das empresas em questão quase não são ativas na Suíça. Elas são, por exemplo, empresas de commodities que transferem seus lucros do Sul Global para a Suíça. Essa transferência de fundos continuará ocorrendo. A alíquota de 15% de imposto é a menor possível e é muito baixa.

SWI: Você defendeu no parlamento que uma parte da receita extra fosse canalizada de volta para o Sul Global. Você proporá isso novamente se os eleitores rejeitarem o projeto de lei?

F.M.: Sim. Como eu disse, não somos contra a Suíça implementar a reforma da OCDE – muito pelo contrário. Lutamos por um imposto mínimo global. Mas global também significa que deve haver justiça entre o Norte e o Sul. A implementação conforme planejada não consegue atingir esses objetivos.

SWI: O que você fará se os eleitores rejeitarem o projeto de lei em 18 de junho?

F.M.: Primeiro, é preciso fechar as brechas existentes. É necessário que seja impossível evitar os impostos usando outros instrumentos. Depois, a receita adicional deve ser distribuída de forma justa em todo o país. Isso significa que a cota federal deve ser significativamente maior. E, em terceiro lugar, como mencionado anteriormente, parte da cota federal deve retornar para o Sul Global.

SWI: Mas, caso o projeto seja rejeitado, a Suíça se verá sem tempo e ficará para trás no contexto internacional. O país pode se dar a esse luxo?

F.M.: De acordo com o cronograma atual, a Suíça tem pelo menos mais um ano [para implementar o imposto corporativo mínimo]. Além disso, a Suíça estaria desistindo [desse projeto] para se adequar melhor às regras internacionais. No momento, ela está fazendo apenas o mínimo absoluto. Do jeito que as coisas estão, a Suíça não está fazendo jus ao espírito da reforma, que é a equidade tributária global.

De qualquer forma, a Suíça demonstrou uma falta de solidariedade em relação a essa questão. Junto com outros países com baixa tributação, como Luxemburgo e Irlanda, ela trabalhou para garantir que a alíquota mínima da OCDE fosse agora muito baixa, 15%. Originalmente, foi proposta uma alíquota muito mais alta, de 21%. E agora a Suíça está tentando parecer alinhada internacionalmente através de uma implementação inadequada. Dessa forma, o país está mantendo seu atrativo exclusivo: a menor alíquota de imposto corporativo.

SWI: Qual seria uma taxa de imposto justa sobre os lucros das grandes empresas?

F.M.: 30% ou mais.

SWI: Mas a estratégia de impostos baixos que você critica também trouxe prosperidade e justiça social para o país. Isso não é importante?

F.M.: Há muito tempo a Suíça se apoia em práticas comerciais imorais: primeiro, no sigilo bancário. Depois, quando isso não funcionava mais, a Suíça atraiu capital por meio das taxas de impostos e de leis frouxas sobre lavagem de dinheiro. A guerra na Ucrânia mostrou quanto dinheiro sujo de oligarcas russos a Suíça acumulou. Essa abordagem não é mais aceita internacionalmente. A Suíça deve mudar seu modelo de negócios em prol da justiça global, mas também para ter uma visão de futuro.

Adaptação: Clarice Dominguez

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