“O Brasil é um paraíso”
Conforme já havia sido anunciado, o presidente do Brasil Jair Bolsonaro usou sua visita ao Fórum Econômico Mundial (WEF) em Davos para delinear sua visão do "novo Brasil", visando particularmente os investidores estrangeiros.
Bolsonaro reiterou que cumprirá sua promessa de campanha e lutará contra a ineficiência e a corrupção no país. “Gozamos de credibilidade para fazer as reformas de que precisamos e que o mundo espera de nós”, disse Bolsonaro, lembrando também que o combate contra a lavagem de dinheiro está entre suas prioridades.
A luta de Bolsonaro contra a corrupção, no entanto, já começou a levantar dúvidas menos de três semanas após sua posse. Conforme lembrou a televisão pública suíça SRFLink externo, seu filho mais velho, Flávio, está sendo investigado por corrupção e por suas relações com milicianos suspeitos de participarem no assassinato da vereadora carioca Marielle Franco, no ano passado. Para evitar perguntas constrangedoras durante a viagem a Davos, Bolsonaro cancelou inclusive a coletiva de imprensa que estava marcada para ontem.
“Somos o país que mais preserva o meio ambiente.“
A afirmação de que seu governo estará atento à preservação do meio-ambiente foi recebida com uma certa dose de ironia. A televisão pública SRFLink externo chamou isso de cinismo. Afinal, para além do discurso, o novo governo colocou as questões de meio-ambiente e terras indígenas sob jurisdição de ministérios comandados por representantes do poderoso lobby ruralista.
Mas o país também precisa progredir, disse Bolsonaro. “Nossa missão agora é avançar na compatibilização entre a preservação do meio ambiente e da biodiversidade com o necessário desenvolvimento econômico, lembrando que são interdependentes e indissociáveis” – o matutino Le Temps, de Genebra, destacou tal frase como uma “hipérbole trumpiana”.
Relacionando sua disposição em combater a criminalidade (a primeira medida concreta foi a liberação da posse de armas para pessoas sem antecedentes criminais) com o incentivo ao turismo, Bolsonaro convidou os ouvintes a conhecer “a nossa Amazônia, nossas praias, nossas cidades e nosso Pantanal. O Brasil é um paraíso, mas ainda é pouco conhecido“.
Para que isso aconteça, o Brasil vai investir muito em segurança. O país não deve ser apenas atrativo para turistas, mas também para empresas. Nesse contexto, Bolsonaro especificou seu programa político.
Ele quer cortar impostos, promover as privatizações, reformar as leis trabalhistas e aprofundar as relações comerciais. Bolsonaro também fez um apelo para mais investimentos estrangeiros. “Eles serão recebidos de braços abertos”, disse ele aos presentes. Haverá muitas oportunidades para investir no Brasil. O Estado deve parar de interferir na economia. No mesmo dia, porém, a Arábia Saudita bloqueou a importação de frango brasileiro por causa do desejo expresso do novo governo em Brasília de mudar sua embaixada israelense para Jerusalém.
O Brasil também protegerá “as famílias e os verdadeiros direitos humanos”, disse Bolsonaro. Por “verdadeiros”, o presidente não teceu maiores detalhes. O Brasil tem uma das maiores taxas de homicídios do mundo – em 2017 o país registrou quase 65.000 homicídios.
Desconfortos
Jair Bolsonaro tinha direito a 40 minutos para discursar à plateia de líderes econômicos e políticos mundiais, mas sua fala levou pouco mais de 6 minutos. Junto com as perguntas feitas pelo diretor do Fórum, Klaus Schwab, seu tempo de palco não passou de 15 minutos.
A rapidez de sua apresentação, a superficialidade do discurso, e a falta de entrosamento com o seleto público do Fórum foram destacados pela imprensa suíça.
Markus Diem Meier, economista-chefe do grupo midiático Tamedia, resumiu o discurso do presidente brasileiro como uma promessa vazia: “Bolsonaro prometeu o azul do céu”Link externo.
Para o Tribune de GenèveLink externo, Bolsonaro destoou em um congresso internacional que já viu oradores mais polidos. Para o jornal de Genebra, Jair Bolsonaro abordou o Fórum Econômico Mundial com “sotaque marcial”, o que fez lembrar a passagem de Donald Trump no ano passado. “O homem – que não é insensível ao apelido que faz dele uma versão tropical do presidente dos Estados Unidos – está no comando de seu país há três semanas, mas ainda parece estar em campanha eleitoral. E de certa forma, está. Para sua primeira aparição no cenário mundial, ele pretende convencer as elites reunidas em Davos sobre suas opiniões.”
Elites essas para as quais o presidente brasileiro disse estar “comovido e honrado” em poder abordar. A participação relâmpago de Bolsonaro em Davos também chamou a atenção do jornal Le TempsLink externo: “Desconfortável em seu casaco antracito, o presidente brasileiro de extrema-direita deu terça-feira uma primeira impressão de sua estatura no Fórum Econômico Mundial em Davos”.
Os amigos
Mas nem tudo foi crítica. Logo depois de sua apresentação, Bolsonaro foi seguido pelo Secretário de Estado norte-americano Mike Pompeo – por videoconferência, pois Trump cancelou não só a sua presença como a de todos os membros de sua administração, justificando-se por causa do corrente “shutdown” (paralisação) do governo numa queda-de-braço entre a Casa Branca e o Congresso, dominado pelos democratas.
Pompeo elogiou o momento de virada ora em curso em diversos países, citando como exemplos positivos a saída do Reino Unido da União Europeia (Brexit) e a própria eleição de Jair Bolsonaro.
O conservador diário zuriquenho Neue Zürcher Zeitung (NZZ)Link externo destacou a presença do presidente brasileiro em Davos em matéria de capa. Sob o título “A ‘estrela negra’ do WEF apresenta-se como estadista”, o jornal relatou os principais pontos do discurso de Bolsonaro sem adicionar qualquer comentário.
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