Imprensa noticia sobre acordo histórico
Depois de uma maratona de negociações, os países do grupo P5+1, a Alemanha e o Irã firmaram na madrugada de domingo (24 de novembro) um acordo para frear o programa nuclear iraniano. A imprensa suíça comenta em editoriais e artigos o processo de apaziguamento do Irã com o mundo.
Foram quatro dias de negociações em Genebra, na Suíça. Finalmente na madrugada os jornalistas foram convocados para escutar o anúncio de um acordo firmado entre os países do grupo P5+1, formado pelos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU (Estados Unidos, França, Rússia, China e Grã-Bretanha), mais a Alemanha, com o Irã. Nele está previsto o acesso de inspetores nucleares ao país e a suspensão de parte do programa de enriquecimento de urânio.
O Neue Zürcher Zeitung (NZZ), o jornal com a maior rede de correspondentes da Suíça, não poupou em palavras de júbilo. “Pela primeira vez não exageramos ao falar de uma verdadeira abertura. As negociações em Genebra abrem pela primeira vez, após mais de uma década, uma perspectiva de suavizar a disputa nuclear com o Irã”, escreve o editorialista Andreas Rüesch, lembrando ao mesmo tempo em que muitas questões ainda estão abertas. “Não se sabe ainda se o acordo permitirá eliminar o risco do armamento nuclear de uma república islâmica, assim como também se o broto plantado permitirá uma aproximação geral entre o Irã e os países ocidentais.”
O jornal zuriquense também considera não procedente as críticas feitas por Israel. “Seria seguramente incorreto dizer que o acordo é um triunfo do Irã, como se escutam em algumas opiniões israelenses. Pelo contrário: o regime em Teerã fez concessões que, até bem pouco tempo, eram negadas com firmeza”. Ao mesmo tempo, o editorialista se lembra dos pontos fracos do acordo. “A fraqueza do acordo está no fato de que ele é válido apenas por seis meses e depois pode ser derrubado.”
Ocidente desconfia do Irã
Já o Tages-Anzeiger, diário de Zurique, ressalta os problemas no ponto de partida do acordo. “Desde que o programa nuclear iraniano foi descoberto em 2002, o país já foi pego várias vezes ocultando informações ou transmitindo dados incorretos. Uma desconfiança profunda impregnou, portanto o relacionamento do Irã com o seu principal contra seu principal adversário, os Estados Unidos.”
Em todo caso, o editorialista Luciano Ferrari também considerou o anúncio realizado na madrugada de domingo em Genebra como um “ponto de transição”. “Pela primeira vez os dois lados estão dispostos, pelo menos por seis meses, a suspender a desconfiança fundamental…A escalação do conflito é interrompida temporariamente e a diplomacia ganha uma chance séria.”
Porém o jornal também vê riscos. “Se as diferenças continuarem insuperáveis em meio ano, o Irã jogar apenas com o tempo ou simplesmente não cumprir o prometido, existe uma ameaça concreta de conflito militar de consequências imprevisíveis para a região”, escreve, sem esquecer-se de citar que o país sai, sim, fortalecido através do acordo realizado. “Ele coloca de novo o Irã no cenário político internacional, fortalece o regime e modifica a correlação de forças entre as forças xiitas e sunitas no Oriente Médio. Isso em um período, onde a Primavera Árabe já desestabilizou a região inteira. A Arábia Saudita, os países do Golfo, mas também Israel, não irão aceitar sem reações o fortalecimento político de Teerã e seus aliados como a Síria ou o Hizbollah.”
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A vontade de mudar
Papel da Suíça
Enquanto isso, o jornal Le Temps, de Genebra, considera que a Suíça agiu nas sombras para satisfazer os desejos de seus hóspedes. “Nosso papel é criar o ambiente mais favorável para negociações tão difíceis”, declarou ao jornal o Ministro Didier Burkhalter, que também organizou um gala de caridade.
O acordo histórico entre o Irã e o P5+1 (os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU mais a Alemanha) é um primeiro passo para um acordo final que deve remover dúvidas sobre a natureza do programa nuclear iraniano.
O jornal 24 Heures, por sua vez, diz que o acordo de Genebra dá uma nova esperança aos iranianos, que esperam obter com isso o fim de certas sanções sobre a economia do país, principalmente nos setores ligados ao petróleo e à finança. Segundo o jornal de língua francesa, a inflação de outubro foi oficialmente de 36%, o desemprego é superior a 11%, a produção industrial está paralisada e os preços dos produtos de consumo só aumentam.
O embargo bancário e a exclusão da rede de transferências internacionais “Swift” também afeta a saúde. Os preços dos medicamentos explodiu e a importação ficou complicada, especialmente para tratamentos pesados.
Hamed Mohammadi, iraniano de 30 anos que trabalha no setor privado, disse ao 24 Heures que espera especialmente a queda da taxa de câmbio das moeda estrangeiras. “Isto significa que as coisas vão se tornar progressivamente menos caras” em rial, a moeda iraniana, disse.
O acordo nuclear alcançado entre Irã e as potências mundiais é “sólido”, embora restem seis meses de negociações muito difíceis para se conseguir um pacto completo – alertaram analistas consultados pela AFP em Washington, neste domingo.
“O acordo interino é sólido, com uma série de restrições e verificações sobre o programa nuclear iraniano mais amplas do que nunca”, disse Suzanne Maloney, especialista em Irã na Brookings Institution.
Suzanne destacou que o acordo por seis meses obriga Teerã “a um contínuo processo diplomático, cujas principais recompensas diferem até que se obtenha um acordo muito mais ambicioso”.
Após quase uma década de paralisia nas negociações entre o Irã e o grupo 5+1 (formado por China, Estados Unidos, Grã-Bretanha, França, Rússia e Alemanha), conseguiu-se avançar em uma velocidade vertiginosa desde a chegada do presidente moderado Hassan Rohani ao poder, em agosto passado.
Esse acordo preliminar foi obtido em Genebra após três rodadas de negociações desde setembro.
“Acho que foi uma negociação dura, efetiva e significativa e que proporcionou o tipo de segurança exigida pelos negociadores para uma discussão legítima e exaustiva com o Irã sobre seu programa nuclear integral”, afirmou Joel Rubin, do Ploughshares Fund.
O acordo concede mais tempo aos esforços das potências mundiais para evitar que o Irã tenha capacidades para fabricar uma arma nuclear, frisou Rubin, acrescentando que a aceitação por parte de Teerã de inspeções diárias em suas unidades de Natanz e Fordo “não tem precedentes” – assim como a contenção dos trabalhos em seu reator de Arak.
“É bastante surpreendente. Se você tivesse me dito, há poucos meses, que o Irã aceitaria, por meio de conversas diplomáticas, neutralizar suas reservas de urânio enriquecido a 20%, deter a construção e qualquer melhoria em Arak, permitir um monitoramento diário, eu lhe diria que essa é uma conquista para nossa segurança”, disse Rubin à AFP.
Jo Biddle (AFP)
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