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Suíça avalia situação de direitos humanos no Sri Lanka

President Gotabaya
Um relatório da ONU afirma que o presidente Gotabaya Rajapaksa (centro) utiliza o argumento do Covid-19 para justificar "limitações" à liberdade de expressão e reunião no Sri Lanka, especialmente contra minorias tâmiles e muçulmanas. Keystone / Chamila Karunarathne

O Conselho de Direitos Humanos (UNHRC) aprovou na terça-feira (23.03) uma resolução expressando preocupação com a situação dos direitos humanos no Sri Lanka e dando à ONU um mandato para investigar e coletas provas de crimes cometidos contra a humanidade. Um relatório ressalta impunidade contínua por crimes graves cometidos durante a guerra civil e deterioração da situação sob o governo de Gotabaya Rajapaksa, no poder desde novembro de 2019. A resolução foi apoiada pela Suíça, onde vive muitos cingaleses, e mais 22 países.

Mas esta irá afetar a política suíça de asilo político. O relatório fará alguma diferença para a situação no Sri Lanka?

A guerra civil colocou em lados opostos a maioria cingalesa e a rebelião separatista tâmil. O conflito provocado no choque entre guerrilheiros da organização política armada Tigres de Liberação do Tamil Eelam (LTTE, na sigla em inglês) e o governo durou 25 anos. Durante esse período foram cometidos pelos dois lados inúmeros crimes de guerra e abusos dos direitos humanos. O LTTE chegou a utilizar homens-bomba e crianças-soldados. Em resposta, o governo aplicou medidas drásticas contra a população civil, especialmente nos estágios finais da guerra. Milhares de civis tâmiles foram mortos. Como Secretário de Defesa na época, Gotabaya Rajapaksa, ordenou o ataque final que pôs fim à guerra civil em 2009. Em em 18 de novembro de 2019, Rajapaksa foi eleito presidente da República.

Desde então, sucessivos governos prometem justiça e responsabilidade perante a sociedade. O UNHRC aceitou-as, até então. No mandato do presidente Maithripala Sirisena (eleito em 2015), o governo cingalês apoiou uma resolução do órgão que dava um roteiro para a justiça de transição. Porém houve pouco acompanhamento. O atual governo se considerou livre de cumprir a resolução, argumentando lançar seu próprio processo de paz.

O cingalês residente na Suíça, Kannanathan Rajgana, também presidente de uma ONG recém criada faz lobby junto à ONU para avançar nas questões de direitos humanos no seu país. E acusa o governo do Sri Lanka de ganhar tempo para apagar provas de crimes de guerra.

Alerta para mais abusos

Em um relatório apresentado na sessão do UNHRC em Genebra, em 24 de fevereiro de 2021, a Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, argumentou que “as iniciativas domésticas falharam repetidamente em garantir justiça para as vítimas e promover a reconciliação”. A ex-presidente do Chile também acrescentou: “…Os sistemas, as estruturas, as políticas e as pessoas responsáveis pelos crimes não apenas permaneceram, mas também se reforçaram nos últimos tempos”. Ela indica que as pessoas implicadas em graves violações dos direitos humanos ainda estão em posições de poder e que há uma crescente militarização do país. “As minorias tâmil e muçulmana estão sendo excluídas por uma política divisória e discriminatória, inclusive graças à ação de autoridades no topo do Estado”, disse.

Bachelet clamou à UNHRC para “explorar novas formas de avanço na prestação de contas em nível internacional”, incluindo um possível encaminhamento de uma ação ao Tribunal Penal Internacional (ICC), e processo penal de indivíduos suspeitos de cometer crimes contra os direitos humanos em outros países e a coleta e preservação de provas e informações para futuros processos”. O Conselho agora deu à ONU um mandato e recursos para fazer isso.

De acordo com Rajgana, presidente da ONG Abordagem Humanitária Internacional, os tâmiles na Suíça se manifestaram satisfeitos com o relatório. “Em comparação com a anteriormente apresentada, este reforça a pressão contra o Sri Lanka”, disse. O ativista considera positivo o relatório ter mencionado as minorias tâmiles e muçulmanas como alvos do governo, mas lamenta que não estabeleça prazos para a melhoria da situação dos direitos humanos.

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No entanto, Rajgana considera que a resolução poderia ter sido mais forte. “Na diáspora tâmil, o principal pensamento é que deveria haver uma investigação criminal, especialmente centrada no que ocorreu em 2009”, disse.

Preocupações suíças

O representante da Suíça também falou no Conselho dos Direitos Humanos, afirmando estar “profundamente preocupada com a impunidade diante dos crimes internacionais e graves violações dos direitos humanos cometidos há mais de dez anos”. Disse que o Sri Lanka permaneceu em um “estado de negação do passado” e pediu ao governo do Sri Lanka que implementasse as recomendações de Bachelet. “Ao mesmo tempo, incentiva a UNHRC a tomar novas medidas em favor das vítimas e da justiça no Sri Lanka”, declarou.

Revisão da política de asilo?

O relatório terá impacto sobre a política de asilo da Suíça? O relatório de Bachelet recomenda que os países “revejam suas políticas de asilo político com respeito aos cingaleses, protegendo os que enfrentam represálias e evitar a deportação de solicitantes de asilo originários do Sri Lanka em casos de risco de tortura ou outras violações dos direitos humanos”.

Há mais de 50 mil pessoas de origem cingalesa vivendo na Suíça, muitas emigradas durante o conflito de 25 anos. Porém muitos continuam a chegar. A maioria dos cingaleses pertence à etnia tâmil. Muitos deles já se naturalizaram.

Após avaliar o relatório de Bachelet, o Conselho Suíço para Refugiados (CSR) conclamou em fevereiro do ano corrente o governo suíço a reexaminar as regras aplicadas aos solicitantes de asilo político originários do Sri Lanka. “Consideramos que as autoridades devem analisar com cuidado a deterioração atual na situação no país e adaptar a política suíça de asilo em conformidade a esta”, declarou. “Nesse meio tempo as deportações deveriam ser interrompidas.”

O Conselho também pediu a suspensão do acordo de migração firmado entre a Suíça e o Sri Lanka “até que fique claro que as condições melhoraram”. Firmado em 2016, o acordo prevê, dentre outros, a repatriação de cingaleses que não preenchem as condições para serem acolhidos na Suíça.

“Sem planos”

Adrian Schuster, especialista do CSR para assuntos ligados ao Sri Lanka, diz que a política de asilo suíça em relação ao país evoluiu ao longo dos anos. Deportações foram temporariamente suspensas em 2013 após se descobrir que dois cidadãos cingaleses deportados haviam sido detidos e torturados no país. As leis foram alteradas em 2014 para tornar mais fácil a obtenção de asilo por cingaleses. Em 2016 (após a eleição de Sirisena em 2015) voltou a ser mais rígida. Após a eleição de Gotabaya Rajapaksa, o CSR considera importante avaliar as regras atuais. “É hora de termos uma nova análise que conduza a uma nova política”, afirmou Schuster.

Questionado sobre a política atual do governo suíço, o SEM disse que atualmente não havia razão para assumir um risco geral, ou para determinadas minorias, de risco no Sri Lanka. “A deportação de cingaleses sem residência regular na Suíça continua. A SEM continua a examinar cada caso individual com atenção e cuidado. Devido à pandemia, as deportações de estrangeiros sem status de residências foram postergadas, mas o governo não planejou sua suspensão.

Portanto, apesar das preocupações expressas pela Suíça na UNHRC, sua política de asilo em relação aos cingaleses não mudou. Os tâmiles na Suíça e as ONGs continuarão pressionando o governo.

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