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“Viagra eletrônico” ajuda controlar a ereção por controle remoto

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Rodrigo Fraga da Silva: "Muita gente pensa que o implante fica no pênis, o que uma é ideia errada e que gera medo nos pacientes". swissinfo.ch

Uma jovem empresa suíça criou um dispositivo médico que permite recuperar a função eréctil em homens com lesão da medula espinhal ou após câncer da próstata. Uma solução tecnológica que já foi apelidada de "Viagra eletrônico" e que poderá ser comercializada em 2022.

Quando o Viagra chegou às farmácias, em 1998, construiu-se no imaginário coletivo a ideia de que a disfunção erétil seria um problema resolvido. Bastava tomar o comprimido azul em forma de losango, esperar uma hora e depois tudo funcionaria na perfeição. “Só que cerca 30% dos homens com problemas de ereção não respondem ao tratamento oral. Foi pensando nesse grupo que desenvolvemos este dispositivo médico”, explica à swissinfo.ch o investigador brasileiro Rodrigo Fraga da Silva, cofundador da ComphyaLink externo, uma jovem empresa de base tecnológica (ou spin-off, em inglês) que nasceu de uma investigação desenvolvida na Escola Politécnica Federal de Lausanne (EPFLLink externo). 

A revista suíça Bilan descreveu a solução proposta pela ComphyaLink externo como um “Viagra eletrônico”. O apelido, apesar de redutor, resume bem a aposta dos investigadores: provocar o endurecimento do pênis usando elétrodos em vez de um composto químico.  A ideia consiste em implantar na zona pélvica um dispositivo capaz de estimular com uma precisão os nervos que provocam a ereção. Após a cirurgia, a equipe clínica define os parâmetros certos de estimulação para que, depois, o utilizador possa gerir a sua atividade sexual usando apenas um controle remoto (ver caixa). 

O dispositivo médico criado pela Comphya chama-se Carver-STIMLink externo. Ele é composto por quatro partes: um par de placas com elétrodos, um gerador elétrico, um carregador externo sem fios e um controle remoto.

As placas contêm ao todo 24 elétrodos e são flexíveis, por forma a acomodarem-se na base da pélvis, onde ficam implantadas após a cirurgia. “Muita gente pensa que o implante fica no pênis, o que uma é ideia errada e que gera medo nos pacientes”, esclarece Rodrigo Fraga, cofundador da Comphya.

O par de placas está conectado a um gerador sem fios (também ele alojado debaixo da pele, na zona do abdômen) que fornece estimulação elétrica.

Este gerador é programado previamente pelo médico através de um aplicativo clínico que permite identificar e ativar os elétrodos apropriados. Os elétrodos selecionados ativarão os nervos certos para provocar o endurecimento do pênis. A ordem de ativação é dada por radiofrequência através do controle remoto.

Já em casa, o paciente poderá utilizar o controle remoto para não só ligar e desligar o sistema de estimulação, como também ajustar a amplitude ou selecionar sequências de estimulação predefinidas. O gerador não é alimentado a pilhas: trata-se de um estimulador de titânio que pode ser recarregado uma vez por mês com a ajuda de um carregador externo sem fios. 

A tecnologia desenvolvida no cantão de Vaud procura dar uma resposta a dois dos subgrupos que não respondem bem à terapia oral: homens com lesão da medula espinhal e pacientes com câncer da próstata submetidos à prostatectomia (ou seja, a cirurgia para remoção de parte ou da totalidade da próstata). Em ambos os casos, comprimidos como o Viagra ou o Cialis funcionam mal porque há uma lesão nos nervos responsáveis pela ereção. 

O tecido nervoso é composto por células com longas extremidades que enervam tecidos e músculos, criando assim inúmeras “estradas” por onde circula informação elétrica do corpo para o cérebro (e vice-versa). Quando ocorre uma lesão – seja por acidente, seja em consequência da prostatectomia -, verifica-se uma descontinuidade nessas vias de comunicação e, por isso, a “mensagem” deixa de ser transmitida com sucesso. É precisamente esta interrupção no fluxo de informação que leva à perda de funções no corpo humano. 

O objetivo do laboratório em tecnologia cardiovascular da EPFLLink externo, liderado pelo professor Nikolaos Stergiopoulos, era encontrar uma forma de fazer com que a tal informação elétrica voltasse a chegar aos nervos responsáveis pela ereção. Uma vez encontrada uma solução, Rodrigo Fraga e Stergiopoulos decidiram criar a empresa Comphya para testar e comercializar o dispositivo médico batizado de Carver-STIM. 

Os conceitos científicos e tecnológicos em que se baseia o produto já foram testados com sucesso no ano passado com 24 pacientes submetidos à prostatectomia radicalLink externo. Os ensaios clínicos estão previstos para agosto de 2020 com 20 indivíduos nos Estados Unidos e na Suíça (dez pacientes que realizaram prostatectomia, no Hospital John Hopkins, em Baltimore, e dez paraplégicos acompanhados no Swiss Paraplegic CentreLink externo. Este estudo, que deverá durar um ano, ajudará a responder questões como: Qual é a eficiência da tecnologia a médio prazo? Quantas vezes pode ser utilizada por dia? Qual é a experiência do utilizador? Quando este teste piloto for concluído com sucesso, a Comphya terá de expandir o ensaio para só então poderem começar a fabricar e comercializar o Carver-STIM. Se tudo correr como o esperado, o dispositivo médico poderá chegar ao mercado em 2022. 

O atraente mercado da disfunção erétil

Rodrigo Fraga afirma que existem hoje cerca de 66 milhões de homens com disfunção erétil na Europa e nos Estados Unidos. “A dimensão do mercado é uma das coisas mais atraentes do nosso negócio: se você pensar numa fatia de 30% desse total, estamos falando de 20 milhões de casos [que podem beneficiar da nossa tecnologia]”, afirma o cientista empreendedor. 

Rodrigo explica ainda que os pacientes submetidos à prostatectomia são bons candidatos à tecnologia que nasceu na EPFL porque “nem sequer é necessário fazer uma segunda cirurgia para colocar o dispositivo”. Quando há o diagnóstico de cancro de próstata e a prostatectomia é considerada a solução clínica adequada, o paciente pode optar pela colocação do neuro-estimulador durante a própria operação de remoção do tumor. Embora os cirurgiões façam hoje um grande esforço para preservar o tecido nervoso que envolve a próstata, continua a ser frequente a ocorrência de disfunção erétil após a prostatectomia. 

A população paraplégica com disfunção erétil também constitui um nicho interessante porque é composto por um grupo jovem e que valoriza a atividade sexual. Calcula-se que cerca de 65% dos indivíduos se situam na faixa etária entre 15 e 35 anos (já a dos pacientes submetidos à prostatectomia é mais envelhecida). Um estudoLink externo realizado em 2004 com 681 indivíduos com lesão da medula espinhal nos Estados Unidos mostrou que, para os indivíduos paraplégicos, a prioridade em termos de qualidade de vida era retomar a atividade sexual. 

Aparelho
O dispositivo Comphya com todos seus componentes. cortesia

“Os nossos cálculos indicam que o nosso mercado real do Carver-STIM seria de 40 a 50 mil pacientes por ano num mercado composto pela Europa e pelos Estados Unidos”, avalia Rodrigo Fraga. 

Os métodos disponíveis hoje 

Para os dois grupos-alvo da Comphya, existem hoje três opções disponíveis no mercado para tratar a disfunção erétil: as injeções de alprostadil, as bombas de vácuo e a prótese peniana. 

As injeções contêm uma droga que ajuda os vasos sanguíneos a expandir, facilitando assim a ereção, que pode durar até quatro horas. Apresentam como desvantagem o fato de “cortarem o clima do casal”, diz Rodrigo, uma vez que a injeção tem de ser dada no pênis pelo próprio utilizador ou pela(o) parceira(o) na hora do ato sexual. Entre as complicações possíveis estão o priapismo (uma ereção prolongada e dolorosa) e a fibrose do tecido cavernoso, que pode deixar o pênis curvado. 

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As bombas de vácuo, como o próprio nome sugere, recorrem ao vácuo para estimular a ereção, que depois é mantida com a ajuda de um anel de borracha colocado na base do pênis. 

Quando todas as abordagens terapêuticas falharam, o urologista que acompanha o paciente pode colocar sobre a mesa a opção da prótese peniana. Trata-se uma solução altamente invasiva e irreversível. Há versões semirrígidas, articuláveis ou infláveis. 

“A prótese é a pior opção que se pode imaginar, pois ela é definitiva e destrutiva. E ainda assim são feitos cerca de 25 mil implantes por ano, movimentando um mercado de 500 milhões de dólares”, comenta Rodrigo Fraga. O CEO da Comphya acredita que a vantagem do dispositivo criado da EPFL reside do fato de oferecer uma experiência sexual “mais cômoda e próxima do natural”, podendo a ativação ser feita longe da vista da pessoa com quem se faz sexo. 

Na origem da disfunção erétil estão causas físicas (problemas circulatórios ou do sistema nervoso central) e psíquicas. É mais comum entre homens mais velhos devido a problemas vasculares ou pela utilização de remédios indicados para este grupo etário. Fatores como hipertensão, colesterol alto, diabetes e consumo de cigarros agravam (ou contribuem para) o problema.  

O cientista que trocou Minas Gerais por Lausanne

Rodrigo Fraga, 37 anos, mudou-se para a Suíça há oito anos para trabalhar como investigador Escola Politécnica Federal de Lausanne (EPFLLink externo). 

Veio acompanhado da mulher, Fabiana Pereira da Costa Fraga, 35 anos, que também trabalha na EPFL como assistente de pesquisa. Os dois filhos do casal nasceram na Suíça, país onde se sentem perfeitamente “felizes e adaptados à cultura”. 

“O meu pai sempre foi uma pessoa certinha e pontual e educou a gente assim também, não tive de fazer grande esforço para me integrar”, explica o CEO da Comphya.

Rodrigo começou o percurso científico na Universidade Federal de Minas Gerais, onde graduou-se em Farmácia e fez um doutorado em Farmacologia.

Fazia investigação básica na área da trombose sob a orientação do professor Robson Santos, cientista brasileiro que se destacou internacionalmente pelo trabalho na área da fisiologia cardiovascular e que mantém um projeto em parceria com a EPFL. 

Foi através dessa colaboração entre os dois países, aliás, que surgiu a oportunidade de Rodrigo trabalhar no cantão de Vaud. 

Rodrigo diz ter se sentido atraído não só pela aplicação prática do conhecimento, mas também pelo retorno financeiro que o empreendedorismo pode oferecer.

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