Empresa suíça cria a primeira cadeira de rodas de grafeno
Em 2020, deverá chegar ao mercado a cadeira "mais leve e resistente do mundo", feita a partir de um material inovador mais forte que o diamante.
A empresa suíça Küschall garante ter desenvolvido a cadeira de rodas “mais leve e resistente” que jamais existiu. O segredo está na utilização de um material inovador chamado grafeno, que é ao mesmo tempo leve, resistente e flexível (v. box abaixo). Um protótipo da cadeira Superstar vai ser testado este ano na fábrica da Küschall, em Witterswil, no cantão de Solothurn. Se for aprovado por um grupo de utilizadores, o novo produto poderá chegar ao mercado em 2020.
Quando a Küschall pediu ao líder de projeto André Fangueiro para conceber um novo produto, resumiu da seguinte forma o objetivo: “queremos a melhor cadeira de rodas do mundo”. O grupo de cinco profissionais (incluindo um cadeirante) teve dez semanas para desenhar uma proposta. Começou por ouvir a opinião mais importante: a dos próprios utilizadores. Foram realizadas entrevistas com 27 pessoas que se encaixam no perfil de cliente da empresa: indivíduos ativos, independentes e com espírito “descobridor”, ou seja, pessoas que exploram o mundo e buscam novas experiências.
“Passamos muitas horas com os utilizadores das nossas cadeiras de rodas. Quisemos não só ouvir o que têm a dizer, mas também conviver com eles. Até fomos beber um copo com alguns. Só assim conseguimos compreender pequenos detalhes do quotidiano: como entram e saem do carro ou como conduzem, por exemplo. Deixamos há muito de pensar na cadeira como um produto médico, para nós a cadeira espelha o estilo de vida das pessoas e não a lesão que possuem”, explica o designer industrial português André Fangueiro, que vive há mais de dois anos na Suíça.
Reduzir risco de lesões
Em paralelo, a equipa investigou o mercado, identificou as falhas existentes, aventou hipóteses e testou soluções no computador. Terminado o prazo dado pela Küschall, as características principais da cadeira Superstar estavam definidas: o quadro da cadeira teria o formato da letra X e seria construído com grafeno, para que o produto pudesse ser leve e robusto e, assim, reduzir ao máximo o risco de lesões.
O intuito é que a Superstar seja 30% mais leve e 20% mais resistente que as cadeiras tradicionais de fibra de carbono. O engenheiro português Nuno Couto, antigo pesquisador da Universidade de Genebra na área do grafeno, considera um objetivo muito ambicioso se esta diminuição do peso se dever apenas à utilização do grafeno. “A redução de quase um terço do peso total de uma cadeira de rodas é demasiado otimista. Mas é possível que essa diminuição não dependa apenas do grafeno”, explica Nuno Couto, um especialista que não está envolvido no projeto da Superstar.
O quadro completo da cadeira de rodas pesa apenas 1,5 quilos. É feito a partir de um processo chamado “lay-up”, que consiste em sobrepor camadas de fibras num molde e depois em impregná-las com grafeno. O resultado é uma estrutura mais leve e resistente que os quadros tradicionais, feitos com fibra de carbono. O objetivo é reduzir o risco de lesões nos músculos dos braços e ombros dos utilizadores autônomos. São precisamente os cadeirantes com um estilo de vida ativo e independente que estão mais expostos a contusões, uma vez que propulsionam as suas próprias cadeiras de rodas, transferem-se sozinhos do assento para o carro e ainda têm de guardar a cadeira no veículo antes de partir. Todas estas etapas sobrecarregam os membros superiores.
Um protótipo da Superstar será testado nos próximos meses na Suíça por dez utilizadores internacionais selecionados de forma aleatória. Os escolhidos terão a oportunidade não só de conhecer a sede da empresa na Basileia e a fábrica em Witterswil, mas também de partilhar com os engenheiros as suas opiniões sobre o produto. O grupo já está definido e a empresa não está neste momento a aceitar mais voluntários. A cadeira de grafeno só será produzida e comercializada se estes potenciais consumidores aprovarem o protótipo.
Preço ainda não está definido
O produto ainda não tem um preço definido. Mas é certo que custará mais do que as versões atuais, feitas com fibras de carbono, cujos preços podem variar entre três e sete mil francos suíços. Será que as seguradoras estarão dispostas a comparticipar um valor tão elevado? “Uma cadeira mais leve significa a redução do risco de lesões ao longo da vida de um utilizador. As seguradoras vão ter de ponderar o investimento inicial e os benefícios a médio e longo prazo”, explica o designer português. De acordo com uma pesquisa da Küschall, 50 a 70 por cento dos utilizadores acabam por apresentar lesões nos membros superiores num intervalo de 10 a 15 anos. Estes problemas de saúde podem implicar perda de autonomia e qualidade de vida, o que também traz custos não só para as seguradoras como também para serviços de saúde ou assistência social.
A empresa foi fundada pelo suíço Küschall Rainer, que ficou tetraplégico aos 16 anos. Ele decidiu criar a sua própria empresa em 1978, após tentar sem sucesso encontrar um emprego adaptado à sua condição física. Os produtos da Küschall conquistaram reconhecimento internacional, havendo na coleção do Museu de Arte Moderna de Nova Iorque um exemplar da cadeira Champion 3000, que venceu em 1986 um concurso de design promovido pela instituição norte-americana. Atualmente, a Küschall é detida pela norte-americana Invacare.
Grafeno, o material “revolucionário” que já ganhou um Nobel
O grafeno é um material quase transparente e finíssimo, com a espessura de um átomo. Tem uma estrutura bidimensional, na qual os átomos de carbono estão organizados em forma de hexágono, sendo que cada átomo ocupa um dos seis vértices do polígono. Os hexágonos encaixam-se uns nos outros num único plano, como se tratasse de um puzzle (quebra-cabeças).
Entre as propriedades únicas do grafeno estão a leveza, a flexibilidade, a resistência (é mais duro que o diamante e cerca de 300 vezes mais forte que o ferro) e a boa condução de calor e corrente elétrica (é ainda mais eficiente que o cobre).
Os cientistas Andre Geim e Konstantin Novoselov anunciaram a existência real do grafeno na revista “Science” em outubro de 2004. O artigo científico gerou uma onda de entusiasmo devido às várias aplicações possíveis do “revolucionário” grafeno, que vão desde a criação de novos materiais para a indústria automobilística e aeroespacial ao desenvolvimento de novas soluções na eletrônica. Em 2010, Geim e Novoselov conquistaram o Prêmio Nobel da Física pelo trabalho que desenvolveram na área do grafeno.
Há métodos diferentes de obter o grafeno, que dão origem a formas mais ou menos puras consoante o método. A exemplo do que acontece com o ouro, o grafeno mais puro (ou seja, com átomos perfeitamente alinhados) será muito mais caro do que o grafeno de menor qualidade. “O grafeno mais acessível é aquele que é obtido a partir do óxido de grafeno misturado com água. Um litro poderá custar entre 150 e 350 francos suíços, conforme o fornecedor. A qualidade não é a mesma do grafeno puro, mas é o mais utilizado para fazer materiais compósitos que vão ser utilizados em estruturas como quadros de bicicleta ou chassis automóveis”, explica Nuno Couto, antigo investigador da Universidade de Genebra na área do grafeno. Além das aplicações na área estrutural e mecânica, o grafeno tem despertado o interesse da indústria suíça que trabalha com sensores elétricos e de gás.
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