Novartis investe no mercado de câncer
O que leva a Novartis a pagar até 14 bilhões de francos à concorrente GlaxoSmithKline (GSK) por um portfólio de medicamentos contra o câncer, outrora difícil a vender? Analistas acreditam que a multinacional farmacêutica suíça não está jogando fora seu dinheiro. Para ter sucesso, é necessário ter um marketing direcionado a uma doença específica.
Por exemplo, o tratamento contra o câncer do seio Tykerb que compete com o Herceptin (Roche) e seu sucessor, Perjeta. Apesar de já estar no mercado há sete anos e ter provado sua eficácia, o Tykerb, vendido na Europa sob a marca “Tyverb”, nunca se tornou um sucesso de vendas. Pelo contrário, elas têm caído atualmente.
A GSK não soube explorar o potencial do Tykerb e de outros medicamentos contra o câncer vendidos à Novartis, pois suas atividades estavam principalmente direcionadas às doenças respiratórias. O câncer representava apenas 5,4% do volume dos seus negócios. “Para eles faltavam produtos de sucesso, cujas vendas teriam permitido o desenvolvimento de novos medicamentos”, avalia Michael Nawrath, analista do Banco Cantonal de Zurique.
Esse tipo de cenário seria inconcebível na Roche ou Novartis, os números um do câncer, focadas na pesquisa e desenvolvimento desses produtos de alta margem e que se orgulham de ter suas forças de vendas especialmente voltadas à oncologia.
Nos últimos anos, a Novartis reforçou sua infraestrutura e se posicionou em segundo lugar no setor. Isso permitiu à multinacional de utilizar seus circuitos de distribuição atuais para realizar estudos promocionais necessários para completar seu portfólio, revela Michael Nawrath.
O site especializado IMS Health prevê que a expiração de patentes poderá de hoje até 2016 causar uma perda de 106 bilhões de dólares nas vendas de medicamentos em relação aos cinco anos precedentes.
Por mais de dez anos, o medicamento Diovan contra a hipertensão foi o produto líder de vendas da Novartis. Quanto sua patente começou a expirar em diversos países a partir de 2011, o mercado foi inundado por produtos similares de baixo custo. A exclusividade sobre o Glivec (medicamento de tratamento da leucemia) começou a expirar em alguns países e a reação do mercado será semelhante.
Como a Novartis já anunciou, o verdadeiro impacto da expiração da patente do Glivec se fará sentir entre 2015 e 2016 quando a sua exclusividade cairá nos Estados Unidos e na Europa, mas esse declínio deverá ser compensado pelas vendas do seu sucessor, o Tasigna.
Grandes transações
Em 22 de abril, a Novartis anunciou transações na ordem de 28,5 bilhões de dólares. Objetivo: reconcentrar suas atividades através das vendas dos produtos “problema” como as vacinas e medicamentos para saúde animal e compra de produtos contra o câncer, mais lucrativos, assim como os direitos sobre produtos oncológicos atuais e futuros do setor de pesquisa e desenvolvimento da GSK.
Se a venda de vacinas à GSK por 7,1 bilhões de dólares e de produtos de saúde animal à empresa Eli Lilly por 5,4 bilhões alivia o seu caixa, Novartis foi criticada por analistas pelos 16 bilhões de dólares que deverá pagar pelo portfólio de oncologia da GSK.
Todavia, graças a essa ação a multinacional suíça fortalece sua posição no mercado de 35 bilhões de dólares de imuno-oncologia, uma abordagem inovadora e descrita como indispensável a não importa que empresa farmacêutica, uma vez que as terapias combinadas têm o potencial de, pelo menos, dobrar as vendas de um medicamento, considera Michel Nawrath.
A terapia imuno-oncológica via a reforçar o sistema imunitário do próprio organismo para combater de forma mais eficaz as células cancerosas em associação com substâncias que atuam diretamente nas células, o que permitiria de transformar a doença fatal em doença crônica similar ao SIDA, diabete ou hipertensão.
“Avaliamos que o mesmo portfólio assumido por um desenvolvedor profissional e um especialista em marketing de produtos oncológicos teria resultado em vendas na ordem de 2,9 bilhões de dólares em 2013”, acrescenta Nawrath. A GSK gerou apenas 1,6 bilhões de dólares no ano passado. O analista estima que o portfólio pudesse ter chegado até mesmo a um faturamento de 12 bilhões.
Em oncologia, a Novartis nunca foi considerada como um concorrente ao mesmo nível como sua concorrente e vizinha Roche. Seu tratamento contra a leucemia Glivec foi certamente, graças às vendas de 4,7 bilhões de dólares em 2013, o quarto medicamento anticâncer mais vendido no mundo atrás dos três produtos líderes da Roche, mas foi considerado como um sucesso apenas em curto prazo.
A negociação realizada com a GSK levanta agora uma esperança. O presidente mundial da Novartis, Joseph Jimenez, declarou ao jornal suíço Blick que seu objetivo era de ultrapassar a Roche. Os produtos, cujos breves são válidos de 2023 a 2030 deverão permitir à Novartis de crescer e administrar melhor as expirações de patentes (“patent cliffs”), quando medicamentos de sucesso cedem o espaço aos genéricos.
Novartis aposta pelo menos em três medicamentos que podem ultrapassar a marca de um bilhão de dólares de vendas anuais: o Votrient contra o câncer do rim, assim como o Tafinlar e o Mekinist, dois novos tratamentos do melanoma. Trata-se de um desenvolvimento que fará da Novartis o líder das terapias do câncer de pele, segundo o porta-voz Satoshi Sugimoto.
O segredo de venda?
A Novartis estará em condições de utilizar os circuitos de distribuição do Afinitor (tratamento de câncer) para os produtos recentemente adquiridos como o Tykerb ou o Votrient, pois eles são utilizados para indicações similares. O mesmo vale para os medicamentos contra o melanoma. Essa estratégia não geraria muitas despesas suplementares devido aos conhecimentos e à força de venda especializada da multinacional, segundo os analistas.
Os médicos são a chave do marketing farmacêutico. Ao analisar o potencial de vendas através da população dos pacientes e as prescrições, as empresas podem identificar e apontar os médicos mais suscetíveis de prescrever um medicamento.
Até então, a abordagem tradicional consistia a enviar-lhes os representantes regularmente para o fornecimento de informações clínicas, artigos de revistas e amostras gratuitas. A consultoria Burson-Marsteller estima que, até o fim dos anos 2000, a Novartis empregou só nos Estados Unidos seis mil representantes, com um orçamento de marketing de mais de 100 milhões de francos para a comercialização de um só medicamento como o Diovan (hipertensão).
1996: criação da Novartis através da fusão das empresas Sandoz e Ciba-Geigy
1997: criação da Ciba Especialidades Químicas
1999: criação da Syngenta, especializada no setor agroalimentar.
2001: compra de uma participação minoritária na Roche
2002: compra do fabricante de genéricos LEK
2005: compra do fabricante de genéricos Hexal e Eon labs, assim como a OTC da empresa Bristol-Myers Squibb
2006: compra do setor de vacinas da Chiron e venda do setor de nutrição e saúde
2007: venda do setor de nutrição médica e alimentos para bebês
2009: compra do setor de genéricos injetáveis da EBEWE
2010: compra da Alcon, empresa fabricantes de produtos oculares
Os tempos mudam
Porém os tempos mudam. O número de representantes está caindo devido ao fato dos médicos não dependerem deles para o acesso às informações. Segundo a Burson-Marsteller, a principal fonte de informação hoje é a internet. Ao invés de inundar os consultórios com amostras gratuitas, os representantes estão hoje armados com computadores carregados de dados clínicos.
Empresas realizam procedimentos onerosos para comparar produtos diferentes para a mesma doença com o objetivo de estabelecer a prova que um medicamento é mais eficaz ou oferece uma melhor relação benefício-custo que outro. A Novartis, que despendeu 9,6 bilhões de dólares em pesquisa e desenvolvimento no ano passado, está disposta alcançar esse objetivo.
Dois medicamentos contra o melanoma da GSK, o Tafinlar e o Mekinist, concorrem diretamente contra o Zelboraf da Roche. A Novartis poderá tentar provar que os dois medicamentos, os primeiros a terem sido aprovados como tratamento combinado nesse caso, são superiores ao Zelboraf, por exemplo, especialmente no ponto de resistência aos medicamentos.
Os esforços de marketing custam bastante dinheiro e as empresas estão sob pressão para rentabilizar a partir do momento onde elas temem ser notificadas para divulgar os pagamentos que fizeram e os presentes distribuídos.
Isso poderia ser uma das razões que explicam a queda do número de representantes farmacêuticos nos Estados Unidos de 107.000 (2006) a 60.000 em 2013, segundo a prestadora de serviços comerciais ZS Associados. Seus analistas indicam que o acesso aos médicos se tornou mais restritivo e que tratamentos complexos contra o câncer exigem representantes especialmente formados para convencer oncólogos, em particular se os produtos têm similar qualidade.
“Nos anos 1990, grandes números de representantes comerciais impulsionavam a venda graças a presentes”, lembra Michael Nawrath. Hoje em dia, mais do que uma força de venda, você precisa provar a eficácia de um medicamento, não apenas do ponto de vista terapêutico, mas também econômico, o que justifica prêmios de até 50 mil francos por ano (por tratamento).”
Por questões de concorrência, a Novartis não atende pedidos de dar detalhes sobre o número e as atribuições dos seus representantes. Porém
Peter Deane, responsável da empresa Global Sales Force Effectiveness, declarou em 2013 no site da indústria farmacêutica Eyeforpharma, que a Novartis teria aproximadamente 18 mil representantes e diretores de vendas.
Em 22 abril, a Novartis anunciou transações na ordem de 28,5 bilhões de dólares. Objetivo: reconcentrar suas atividades através das vendas dos produtos “problema” como as vacinas e medicamentos para saúde animal e compra de produtos contra o câncer, mais lucrativos, assim como os direitos sobre produtos oncológicos atuais e futuros do setor de pesquisa e desenvolvimento da GSK.
Se a venda de vacinas à GSK por 7,1 bilhões de dólares e de produtos de saúde animal à empresa Eli Lilly por 5,4 bilhões alivia o seu caixa, Novartis foi criticada por analistas pelos 16 bilhões de dólares que deverá pagar pelo portfólio de oncologia da GSK.
Todavia, graças a essa ação a multinacional suíça fortalece sua posição no mercado de 35 bilhões de dólares de imuno-oncologia, uma abordagem inovadora e descrita como indispensável a não importa que empresa farmacêutica, uma vez que as terapias combinadas têm o potencial de, pelo menos, dobrar as vendas de um medicamento, considera Michel Nawrath.
A terapia imuno-oncológica via a reforçar o sistema imunitário do próprio organismo para combater de forma mais eficaz as células cancerosas em associação com substâncias que atuam diretamente nas células, o que permitiria de transformar a doença fatal em doença crônica similar ao SIDA, diabete ou hipertensão.
Adaptação: Alexander Thoele
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