Apreensões de remédios falsos no Brasil crescem 1.200%
A falsificação e o contrabando de remédios são problemas que preocupam cada vez mais as autoridades públicas no Brasil.
De acordo com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), órgão subordinado ao Ministério da Saúde, cerca de 850 mil unidades de medicamentos falsos – entre comprimidos, ampolas, xaropes e outros – foram apreendidas no país em 2011, número que reflete um impressionante aumento de 1.200% na ocorrência desse tipo de crime em apenas três anos.
Desde 2010, segundo o governo brasileiro, as apreensões de medicamentos falsificados somam 350 toneladas. Cada vez mais comuns, elas acontecem em todos os estados do país e têm como alvos ambientes diversos, como feiras livres, lanchonetes em beiras de rodovias, lojas e até mesmo farmácias e drogarias credenciadas.
No Brasil, o acesso da população aos medicamentos falsificados ou fabricados irregularmente é amplo e o poder de fiscalização das autoridades é precário. Até 1999, quando foi criada a Anvisa, o Brasil sequer tinha uma agência reguladora com poder de fiscalização sobre o setor farmacêutico. Essa carência foi decisiva para a consolidação da “cultura do remédio irregular” que coloca o Brasil, segundo estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS), ao lado de outros gigantes como Índia, Rússia e Turquia no grupo de países onde 25% dos remédios em circulação são falsificados, contrabandeados ou não possuem registro dos órgãos públicos reguladores. Se levados em conta esses dois últimos itens, as apreensões feitas no Brasil em 2011 saltam para 2,8 milhões de unidades. Segundo a OMS, as vendas de medicamentos irregulares representaram 16% da comercialização global de medicamentos em 2010, o que acarretou um prejuízo de US$ 75 bilhões para a indústria farmacêutica mundial.
O Brasil tem uma produção anual estimada em um bilhão de remédios legais – o que coloca a indústria farmacêutica brasileira na nona posição mundial – e nunca foi feito um cálculo oficial sobre o prejuízo trazido pelos medicamentos irregulares a esse mercado. Os tipos de medicamento mais falsificados no Brasil são os emagrecedores, os anabolizantes e as pílulas contra disfunção erétil: “Os medicamentos mais caros e os medicamentos controlados estão na linha de fogo da falsificação”, afirma José Luís Maldonado, técnico do Conselho Federal de Farmácia. O volume de apreensões, segundo ele, pode ser apenas a ponta do iceberg: “Antes, não tínhamos fiscalização. Quando ela passou a existir, os números começaram a surgir e a mostrar a fragilidade do nosso sistema”.
Contrabando
Para a Anvisa, não há uma produção relevante de medicamentos falsos no Brasil, fato que associa esse tipo de crime a outro: o contrabando. Segundo um levantamento feito pelo Fórum Nacional de Combate à Pirataria, a maioria dos remédios irregulares que chegam ao consumidor brasileiro tem origem na China ou na vizinha Colômbia, mas são raras as apreensões nas fronteiras ou portos do país.
Coibir a rede de distribuição de remédios falsos, que tem capilaridade para atingir todas as regiões brasileiras, também é um desafio: “O medicamento é produzido por um laboratório farmacêutico que vende os produtos para uma distribuidora ou até mesmo faz venda direta para a farmácia”, diz a farmacêutica da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Lusiele Guaraldo, em entrevista à Agência Fiocruz. As contrafações, segundo a Anvisa, são realizadas por um leque de “produtoras” que engloba desde fabricas de fundo de quintal até empresas estruturadas e com fachada de legalidade.
Penalidades
Previstas em lei federal, as penalidades cabíveis às farmácias ou drogarias que forem flagradas comercializando medicamentos falsos ou irregulares no Brasil vão desde o pagamento de multas até a interdição definitiva do estabelecimento. No Código Penal brasileiro, é considerado crime hediondo contra a saúde pública “a venda, comercialização, exposição, manutenção e estoque de medicamentos falsificados”. A pena mínima prevista para o crime é de dez anos.
Apesar do rigor da punição, a rede de distribuição de medicamentos irregulares parece crescer continuamente no Brasil: “A falsificação chegou a um nível impressionante no país, a ponto de a própria indústria ter de mandar certos itens ao laboratório para identificar se são falsificados”, diz Maldonado.
Segundo as orientações da Anvisa, para minimizar o risco de comprar um remédio falso ou irregular o consumidor deve desconfiar de preços muito abaixo da média que é praticada nas farmácias. Outra dica de precaução é ficar atento a alguns elementos importantes na caixa do remédio, como lacre, número do lote, data de fabricação e validade e marcas de segurança. A presença de uma bula original também é importante.
Medicamento verdadeiro
Alguns elementos sociais e culturais agem como facilitadores da expansão do mercado de medicamentos falsificados no Brasil. Além da precariedade da fiscalização e da permeabilidade das fronteiras ao contrabando, há também a cultura da automedicação fortemente presente na sociedade brasileira, sobretudo em suas camadas mais pobres. É impossível mudar um traço cultural da noite para o dia, mas o governo investe em campanhas para alertar à população sobre a necessidade de se exigir a nota fiscal do medicamento adquirido, mesmo para remédios de venda livre.
Para disponibilizar mais e maiores informações e aumentar a consciência da população brasileira sobre os riscos à saúde trazidos pelos remédios falsos, a Anvisa, com apoio do Ministério da Justiça, lançou a campanha Medicamento Verdadeiro, que vem desenvolvendo ações de conscientização em todo o país: “Levamos às pessoas uma mensagem clara: no caso do medicamento falso, ao contrário de um cd ou de um tênis, o dano ao consumidor pode ser a morte”, diz o diretor-presidente da Anvisa, Dirceu Raposo de Mello.
As pessoas no Brasil podem denunciar a fabricação ou venda de remédios falsos junto à Anvisa ou diretamente nos postos de vigilância sanitária estaduais ou municipais, além das delegacias especializadas em crimes contra a saúde pública da Polícia Civil.
Para fornecer informações sobre os remédios comercializados no país, o Ministério da Saúde disponibiliza dois telefones: o Disque Medicamentos (0800 644 0644) e o Disque Saúde (0800 61 1997).
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