Por que um tribunal suíço decide caso de bicampeã olímpica?
Um tribunal suíço acaba de liberar a bicampeã olímpica Caster Semenya para disputar competições oficiais femininas, ao menos até o dia 25, prazo que a Federação Internacional de Atletismo (IAAF) deve se pronunciar. Por que uma decisão em relação ao nível de testosterona de uma atleta sul-africana foi tomada na Suíça?
O que ocorreu?
Caster Semenya é intersexual. Devido a uma doença hereditária, a desportista sul-africana tem níveis excepcionalmente altos de testosterona para mulheres.
Para evitar que intersexuais ganhem uma vantagem competitiva no esporte, a Associação Internacional de Federações de Atletismo (IAAFLink externo, em inglês) introduziu limites de testosterona para a participação em competições femininas.
Bicampeã olímpica nos 800m rasos, Semenya entrou com um recurso na Corte Arbitral do Esporte (CAS, em inglês), um tribunal internacional que regulamenta disputas relativas a esportes sediado em Lausanne, com cortes adicionais localizadas em Nova Iorque e Sydney, bem como nas cidades que sediam os Jogos Olímpicos durante a realização destes.
O CAS confirmouLink externo que ela teria de baixar seus níveis de testosterona se quisesse continuar a competir em competições femininas. Em outras palavras, Semenya teria que se submeter a uma terapia hormonal se quiser disputar medalhas. A atleta remeteu a decisão para o Tribunal Federal Suíço, a principal corte helvética.
Porque é que os juízes suíços decidem?
Como o CASLink externo tem sua sede em Lausanne, está sujeito ao direito suíço. Suas decisões podem, portanto, ser recorridas para o Tribunal Federal.
Em 31 de maio, a corte suprema da Suíça ordenou a suspensão provisória dos limites de testosterona para atletas. Semenya está, portanto, autorizada a correr novamente em provas de 400 e 1500 metros até uma nova decisão, cuja data ainda não foi marcada.
O que poderá ocorrer?
Se o Tribunal Federal negar o recurso de Semenya, ela poderá recorrer contra a Suíça no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) em Estrasburgo, alegando que seus direitos estão sendo violados.
Qual o impacto da decisão do supremo suíço sobre o esporte internacional?
Os recursos feitos contra as decisões do CAS no Tribunal Federal da Suíça só podem levar à anulação da decisão impugnada. “Se a anulação da regra se justifica por uma violação do direito público, o tribunal irá se pronunciar indiretamente sobre a questão”, explica o professor Antonio RigozziLink externo, da Universidade de Neuchâtel. Esse seria o caso em que o tribunal constate uma violação flagrante dos direitos individuais e de outros direitos humanos.
“O julgamento no caso Caster Semenya é um precedente para o esporte internacional”, acrescenta Philipp Bandi, da Federação Suíça de Atletismo (Swiss Athletics). “Dependendo do resultado, associações ou atletas com casos semelhantes também poderão reagir.”
Há casos semelhantes?
Como o Tribunal FederalLink externo é o órgão de controle do CAS, muitos casos de atletas estrangeiros são levados à corte helvética. Alguns exemplos:
– A patinadora alemã Claudia Pechstein sofre de uma anomalia congênita que altera suas taxas sanguíneas. Ao ser acusada de dopagem, foi suspensa. Então entrou com um recurso no CAS em 2009, mas sem obter sucesso. Depois recorreu ao Tribunal Federal e o TEDH em Estrasburgo, mas não conseguiu reverter a pena.
– Adrian Mutu foi processado, em 2004, pelo Chelsea por um teste positivo de doping. O jogador de futebol da Romênia entrou com recursos no CAS, no Tribunal Federal e finalmente, TEDH, perdendo todos.
Tribunal Federal da Suíça
O Tribunal FederalLink externo está sediado em Lausanne e é a mais alta instância judicial da Suíça em matérias de direito civil, penal, administrativo e constitucional. Existe na forma atual desde 1874.
As decisões nunca são tomadas em primeira instância, mas só depois que outros tribunais trataram do caso. Suas cortes não se pronunciam sobre um novo caso, mas apenas questões jurídicas. Um caso só pode ser corrigido pelo Tribunal Federal se uma instância inferior cometeu um erro grave.
O Tribunal Federal é composto por 38 juízes, bem como juízes a tempo parcial. Os juízes são eleitos pelo Parlamento suíço por um mandato de seis anos.
Adaptação: Alexander Thoele
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