Coronavírus deixa imigrantes ilegais em situação precária
A pandemia do coronavírus está piorando as dificuldades enfrentadas por cerca de 100.000 imigrantes ilegais, também chamados de 'sans papiers', na pequena nação alpina conhecida por seu alto custo de vida.
Este conteúdo foi publicado em
6 minutos
Jornalista da Rádio Suíça Internacional (RSI) Schweizer, a predecessora da SWI swissinfo.ch, desde 1999. Originalmente jornalista investigativa e repórter de televisão no México.
“Eu tenho amigos e nós nos ajudamos mutuamente, mas desta vez todos nós fomos afetados pela crise. Uma amiga minha, que é casada com um suíço, está me emprestando dinheiro para sobreviver. O coronavírus causou a disseminação da pobreza aqui”, diz Mariana*, uma mulher de 34 anos da República Dominicana que trabalha como faxineira.
“Duas famílias ainda me pagam pelas horas que normalmente trabalharia para elas toda semana, mesmo eu não indo”. Elas me dizem que eu posso compensá-las mais tarde fazendo uma hora extra de limpeza, mas outras famílias não podem fazer isso porque são de estrangeiros que perderam o emprego ou não precisam de mim porque estão em casa”.
Hoje, Mariana vive com amigos em um vilarejo próximo à cidade de Murten, no cantão de Friburgo, na região oeste da Suíça. Ela continua tendo esperança de que à medida que as lojas e os negócios recomeçarem lentamente, ela encontrará novas maneiras de sobreviver.
“Estou pensando em procurar trabalho na agricultura, mesmo não conhecendo ninguém de confiança lá. Um jovem refugiado me disse que alguns agricultores estão aceitando pessoas sem visto para plantar aspargos. Ele trabalha com eles agora e também recebe dinheiro da assistência social. Isso me parece injusto, mas é tudo o que tem. Eu nunca fui um peso para o Estado. Sempre me sustentei sozinha, mas hoje não posso limpar casas por causa da pandemia”.
Mostrar mais
Mostrar mais
Covid-19 revela miséria em uma das cidades mais ricas do mundo
Este conteúdo foi publicado em
A Caravane de Solidarité é a associação por trás desta ação. Desde o início da pandemia, a distribuição de alimentos vem sendo organizada e os números estão crescendo a cada semana. A polícia precisou intervir para que as medidas de segurança contra a Covid-19 fossem respeitadas. A demanda acabou levando a prefeitura de Genebra a…
A Suíça não é diferente de muitos outros países, os imigrantes ilegais fazem o trabalho mal remunerado e que exige pouca qualificação, mas não têm direito a nenhuma ajuda, já que os empregadores não descontam os encargos sociais e os impostos na fonte. Esses imigrantes constroem casas, limpam, cozinham, cuidam de crianças ou se prostituem. Nos bons tempos, eles podem ganhar o suficiente para comer, pagar o aluguel e mandar dinheiro para os parentes em seus países.
Em tempos difíceis, eles são os mais atingidos, pois não têm a rede de segurança de quem está legal no país.
Ajuda financeira
“Existe alguma ajuda financeira para ajudar as pessoas a pagar o aluguel?”, pergunta Hector*, um imigrante clandestino da Nicarágua que mora com sua esposa e dois filhos na Suíça.
Ele e sua esposa estão desempregados desde o início de março. Eles ainda devem pagar CHF1.000 (US$1.036) por mês pelo aluguel e precisam desesperadamente de ajuda.
Durante a crise do coronavírus, várias organizações e centros de auxílio em Zurique, Lucerna, Basileia, Berna, Genebra e Lausanne têm ajudado nas despesas básicas, fornecendo coisas como vales-alimentação. Mas os pedidos de aconselhamento e ajuda financeira não pararam de chegar.
“Em Zurique, mais de 400 pessoas nos procuraram para ajudar financeiramente a cobrir despesas essenciais durante o confinamento”, explicou Bea Schwager, responsável do centro SPAZLink externo de Zurique.
Assim que as empresas suíças tiveram que fechar por causa do confinamento, o SPAZ lançou um apelo ao público para que fizessem doações.
“Recebemos cerca de CHF100.000, mas muito desse dinheiro já foi gasto”, disse Schwager. “Nós suspendemos a distribuição de ajuda financeira porque temos que reavaliar a forma de continuar este trabalho”.
Mostrar mais
Mostrar mais
Fundo para crise do Coronavírus apela à generosidade no Dia Nacional da Solidariedade
Este conteúdo foi publicado em
Com o apoio da Sociedade Suíça de Radiodifusão e Televisão (SRG SSR), que também inclui a SWI swissinfo.ch, a Swiss SolidarityLink externo recolhe dinheiro para as pessoas desfavorecidas. A verba arrecadada será distribuída para instituições de caridade e ONGs, como a Cruz Vermelha SuíçaLink externo, a CaritasLink externo e a Pro SenectuteLink externo, que canalizarão…
Myriam Schwab do Centro Social Protestante (CSP) do cantão de Vaud diz que o maior medo é não saber quanto tempo a situação atual vai durar.
“Embora dar ajuda financeira não seja nossa principal atividade, que é o aconselhamento, atualmente estamos procurando obter fundos para ajudar as pessoas que não têm acesso à ajuda do Estado na atual situação de emergência”, disse.
As pessoas estão vivendo o dia-a-dia e, além das necessidades básicas como alimentação, pagar o aluguel é o principal problema não resolvido, explicou Byron Allauca, presidente do Coletivo Vaud de Apoio a Sem Papéis (CVSSP).
“Muitas pessoas não conseguiram cobrir o aluguel do mês de abril. A Caritas os ajuda com vales para comprar alimentos mais baratos em seus mercadinhos e o movimento da igreja protestante lhes fornece alimentos. Em Lausanne, por exemplo, antes da crise, a Igreja Protestante distribuía 80 cestas básicas. Hoje ela distribui 350”, conta.
Em meados de abril, o CSP e o CVSSP, junto com outras organizações do cantão de Vaud, escreveram às autoridades federais, cantonais e municipais apelando por ajuda financeira e outros auxílios para os mais vulneráveis, incluindo os imigrantes ilegais. Entretanto, eles ainda não receberam resposta.
Enquanto isso, a deputada socialista Ada Marra, que é co-presidente da plataforma nacional dos sem-papéis, apresentou na terça-feira (5) um pedido oficial ao Conselho Federal solicitando a criação de um fundo para as associações que ajudam os imigrantes em situação irregular.
Infelizmente, a situação na Suíça não deverá melhorar com o fim do confinamento, advertiu Schwab.
“Será difícil para as pessoas sem papéis encontrar trabalho na Suíça no futuro”. O acesso ao emprego é crucial para a sua sobrevivência, mas entramos em um período muito sombrio”. E basta olhar para a história da imigração na Suíça para saber que em uma crise são sempre os trabalhadores estrangeiros mais vulneráveis os que mais sofrem. Eles são os primeiros obrigados a deixar o país”, declarou.
*os nomes foram mudados para proteger o anonimato.
Adaptação: Fernando Hirschy
Mais lidos
Mostrar mais
Suíços do estrangeiro
O surpreendente sucesso da moeda menos amada da Suíça
Como evitar que a inteligência artificial seja monopolizada?
Como evitar o monopólio da IA? Com o potencial de resolver grandes problemas globais, há risco de países ricos e gigantes da tecnologia concentrarem esses benefícios. Democratizar o acesso é possível?
Se quiser iniciar uma conversa sobre um tema abordado neste artigo ou se quiser comunicar erros factuais, envie-nos um e-mail para portuguese@swissinfo.ch.
Consulte Mais informação
Mostrar mais
Boletim: Coronavírus na Suíça
Este conteúdo foi publicado em
Acompanhe também a evolução da pandemia no mundo através de uma série de gráficos atualizados semanalmente.
Precariedade ou clandestinidade, destino das prostitutas sem renda
Este conteúdo foi publicado em
O telefone de Alexandra*, uma profissional do sexo na Suíça francófona, continua tocando. No outro lado da linha, os clientes solicitam seus serviços. Quando ela lhes recorda que, em 16 de março, o governo proibiu a prática da prostituição para combater a propagação da Covid-19, alguns tentam convencê-la a infringir a lei. Alexandra está indignada:…
Este conteúdo foi publicado em
O “crime de solidariedade” não vai desaparecer na Suíça. A Câmara dos Deputados recusou a mudança da Lei dos Estrangeiros. A iniciativa parlamentar da deputada Lisa Mazzone pretendia acrescentar uma exceção ao artigo 116 para que as pessoas que ajudassem imigrantes sem documentos por “motivos dignos” não fossem condenadas. Ela foi rejeitada por 102 votos…
Trabalho às escuras: quais os limites da informalidade
Este conteúdo foi publicado em
A brasileira M.U. de 40 anos é um exemplo de profissional que opera na informalidade. “Eu estou totalmente ilegal, entrei como turista há cinco meses atrás” reconhece a residente do cantão de Friburgo que trabalha como doméstica e cabeleireira. Nascida e criada na favela da Rocinha no Rio de Janeiro, a carioca não se importa…
Este conteúdo foi publicado em
Norbert Valley está disposto a se defender no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos. O pastor em uma igreja evangélica no cantão do Jura foi condenado pelo Tribunal de Neuchâtel a pagar uma multa de mil francos por ter violado a Lei de estrangeiros. Razão: ter ajudado um solicitante de asilo político que se encontrava em…
Este conteúdo foi publicado em
O programa para regularizar a situação dos imigrantes clandestinos de longo prazo em Genebra começou oficialmente em 20 de fevereiro de 2017, precedido por uma fase de testes iniciada em 2015. Desde então, 1.846 imigrantes ilegais em Genebra receberam uma autorização de residência tipo B. Entre eles, 365 famílias compreendendo 566 pais e 610 crianças,…
Este conteúdo foi publicado em
O brasileiro Everton trabalha como garçom em um restaurante na cidade velha de Genebra há dez anos. Nenhum de seus conhecidos imaginou que ele era “indocumentado”. “Quando eu disse a eles que estava reunindo os documentos para a minha regularização, eles não acreditavam em mim”, diz ele. Sua mãe o trouxe do Brasil para viver em Genebra aos 16…
Quem paga a conta do pacote econômico do coronavírus na Suíça
Este conteúdo foi publicado em
Além das despesas relacionadas à Covid-19, o Ministério da Fazenda também está se preparando para a diminuição das receitas deste ano, notadamente do imposto sobre o valor agregado, do imposto retido na fonte e do imposto federal direto. Apesar das incertezas consideráveis, a Suíça está bem posicionada para lidar com o impacto financeiro da crise.…
Este conteúdo foi publicado em
A partir de 8 de junho, os estabelecimentos de ensino médio e superior, museus, jardins zoológicos e bibliotecas estarão novamente abertos, desde que não se verifique um ressurgimento da pandemia do coronavírus no país. O governo anunciou o seu plano trifásico para restabelecer a normalidade na Suíça durante uma crise que já custou mais de…
Este conteúdo foi publicado em
Na quinta-feira (23), a Secretaria de Estado da Economia (SECO) anunciou que havia ajustado as previsões econômicas para 2020 para levar em conta os eventos esportivos afetados pela pandemia. A previsão original revisada estimava que a economia se contrairia em 1,5%. O desemprego deve chegar a 3,9%, em média, ao longo do ano. Em um…
Trabalhadores estrangeiros ficam sem ajuda econômica na crise
Este conteúdo foi publicado em
Valter Santos* suspira e diz: “A situação é insustentável”. “Nossas reservas estão esgotadas.” Sua voz soa abafada no telefone. “Eu simplesmente não sei mais o que fazer.” Em 27 de março, o Conselho Federal (Governo) decidiu flexibilizar as condições para o trabalho em tempo reduzido. Santos, que está empregado com um contrato temporário através de uma agência…
Este conteúdo foi publicado em
Na Suíça as classes menos favorecidas sofrem com os efeitos da pandemia: uma parte dos trabalhadores autônomos, que perderam os clientes; as mães solteiras, endividados, aposentados sem economias e os grupos marginalizados da sociedade. Muitos acabam não tendo acessos aos programas lançados no pacote de ajuda do governo, da ordem de 40 bilhões de francos.…
Não foi possível salvar sua assinatura. Por favor, tente novamente.
Quase terminado… Nós precisamos confirmar o seu endereço e-mail. Para finalizar o processo de inscrição, clique por favor no link do e-mail enviado por nós há pouco
Veja aqui uma visão geral dos debates em curso com os nossos jornalistas. Junte-se a nós!
Se quiser iniciar uma conversa sobre um tema abordado neste artigo ou se quiser comunicar erros factuais, envie-nos um e-mail para portuguese@swissinfo.ch.