Imposto eclesiástico divide católicos suíços
Campanhas para abolir o imposto eclesiástico sobre as empresas têm provocado um debate sobre o apoio do Estado à religião na Suíça. A questão divide principalmente os fiéis conservadores e liberais da igreja católica do país.
Na maior parte da Suíça, os membros de uma igreja pagam um imposto sobre seus rendimentos para a manutenção das igrejas protestantes e católicas. Em 20 cantões, o imposto da igreja também é cobrado das pessoas jurídicas, o que significa essencialmente as empresas.
Alas jovens dos partidos radical e do povo suíço lançaram campanhas a nível estadual para acabar com o imposto eclesiástico exigido das empresas.
Os jovens argumentam que o imposto é “uma relíquia da Idade Média” e os cantões que impõem esse tributo são menos competitivos na questão fiscal, especialmente em relação a outros países da Europa.
Segundo os defensores da proposta, a abolição do imposto permitiria às empresas aumentar seus investimentos e gerar mais empregos.
Uma iniciativa popular para abolir o imposto eclesiástico das empresas tenta agora recolher assinaturas nos cantões de Nidwald, Grisões e Zurique para lançar a questão nas urnas em 2014.
O Tribunal Federal – a mais alta corte da Suíça – decidiu várias vezes que o imposto é legal, garante René Pahud de Mortanges, professor de direito da Universidade de Friburgo e coautor de um estudo sobre o imposto eclesiástico cobrado das pessoas jurídicas nos diferentes cantões da Suíça.
O professor admite, no entanto, que a mudança pode vir das urnas.
“O tribunal também disse que, se o imposto for considerado não adequado por razões políticas, caberá aos governos dos cantões fazer alterações. As iniciativas cantonais para abolir o imposto devem ser vistas neste contexto, elas se propõem a mudar a situação legal nos cantões por meios políticos”.
Na maior parte da Suíça, os membros das igrejas reconhecidas têm de contribuir para a sua manutenção através da declaração do imposto de renda. O dinheiro arrecadado vai para a igreja do contribuinte.
Na maioria dos cantões, as empresas também têm que pagar, o dinheiro é distribuído na proporção do número de membros da igreja no cantão. As alíquotas variam de cantão para cantão.
O dinheiro é arrecadado pelo governo e administrados por conselhos de igrejas eleitos pelos paroquianos locais. Esses órgãos são independentes e compostos por leigos, o clero é membro ex officio.
As receitas fiscais normalmente pagam o salário do clero, a manutenção dos edifícios da igreja e os serviços sociais.
Reações divergentes
As igrejas não reagem da mesma forma. Sem surpresa, muitos fiéis, tanto católicos quanto protestantes, se opõem à redução do tributo. Sem a parte das empresas, as igrejas perderiam uma grande fatia de suas receitas.
“Há muitas coisas que não poderiam mais ser realizadas”, disse Klaus Odermatt, presidente da paróquia de Nidwalden ao jornal Neue Nidwalder Zeitung.
“Para algumas paróquias, o dinheiro iria acabar, porque as receitas fiscais das pessoas jurídicas compõem a maior parte do financiamento. Elas teriam dificuldade em cobrir os custos do dia-a-dia e a manutenção de igrejas, capelas, centros paroquiais e locais de reunião. Muitos serviços sociais e religiosos oferecidos atualmente teriam que ser cortados ou reduzidos, ou então o Estado teria que assumi-los.”
No entanto, nem todos da igreja católica suíça estão preocupado com a ameaça às receitas.
Vitus Huonder, bispo de Chur – cuja diocese engloba Nidwalden, Zurique e Grisões – considera que a Igreja pode contar com a solidariedade dos fiéis, mas não necessariamente das empresas, que na natureza das coisas não têm fé ou uma alma para ser salva.
“Por isso, vamos nos manter neutros nas próximas campanhas políticas”, anunciou o porta-voz da diocese Giuseppe Gracia.
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Fim do imposto para todos?
A abolição do imposto eclesiástico para as pessoas jurídicas pode ser apenas o começo. E se o tributo fosse também suprimido para as pessoas físicas, em outras palavras os contribuintes?
“Há uma diferença importante entre esses dois tipos de impostos”, ressalta Pahud de Mortanges.
“As pessoas jurídicas são obrigadas a pagar o imposto, desde que tenham a sua sede no cantão em questão. Pessoas físicas, por outro lado, podem deixar de pagar o imposto, se saírem da igreja.”
“Isso porque a liberdade de religião está ancorada na Constituição. Por isso, quando as pessoas pagam impostos para a igreja, elas realmente estão fazendo isso voluntariamente. Tal sistema dificilmente pode ser recusado pelos políticos ou o setor privado.”
Países de língua alemã
Já as forças conservadoras da igreja católica gostariam que todo o sistema fosse desmantelado.
O vigário-geral Martin Grichting é um defensor da abolição total. Especialista em direito canônico, ele argumenta que o imposto da igreja deve ser substituído por doações ou um imposto voluntário. Ele sustenta que a relação Igreja-Estado existente é realmente incompatível com o direito canônico, pois a natureza da Igreja seria hierárquica e não democrática.
“Só a Suíça, a Áustria e a Alemanha apresentam um regime de imposto eclesiástico nessa forma”, disse. “Noventa e sete por cento dos católicos do mundo financiam suas igrejas de outras maneiras.”
Mas será que as igrejas da Suíça conseguiriam sobreviver sem receita fiscal?
“Dependendo do cantão, as receitas do imposto sobre pessoas jurídicas variam em importância”, diz Pahud de Mortanges, referindo-se ao seu estudo recente.
“Assim, as igrejas seriam afetadas em diferentes graus, se esse imposto fosse eliminado. No entanto, abolir o imposto eclesiástico para os indivíduos teria um efeito dramático. Isto é evidente quando se olha para a situação nos cantões de Genebra e Neuchâtel, onde não existe imposto eclesiástico e as igrejas – em comparação com o resto da Suíça – têm muito pouco dinheiro. Isso, claro, significou uma redução dramática nos serviços que podem oferecer.”
O imposto eclesiástico é uma característica dos países de língua alemã, mas com diferenças nacionais. A Alemanha taxa os fiéis, mas não taxa as pessoas jurídicas. A Áustria tem um equivalente do imposto eclesiástico, mas ele é coletado pelas próprias igrejas.
“O que é único no sistema suíço é a oportunidade que os membros da igreja têm de participar na forma como as receitas fiscais são usadas. Para a igreja católica, em particular, isso é algo notável. Ele garante a utilização dos recursos financeiros da Igreja perto da base”, diz Pahud de Mortanges.
Adaptação: Fernando Hirschy
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