“Integração é a melhor arma contra fundamentalismo”
Na primeira semana de setembro, o Conselho Suíço de Religiões (CSR) se pronunciou pela primeira vez sobre a iniciativa dos minaretes, uma proposta de lei feita por grupos contrários à construção das torres características das mesquitas.
O órgão que reúne as principais religiões do país diz “não” a iniciativa, justificando a recomendação através da liberdade religiosa no país. Entrevista swissinfo.ch
swissinfo.ch: O senhor é secretário da CSR. O recomendação do voto negativo é justificado através da liberdade religiosa. Como isso é interpretado pelo Conselho?
Markus Sahli: Liberdade de religião é um direito universal. Cada pessoa tem o direito de viver sua religião em liberdade, de forma clara e em comunidade. Na nossa sociedade a liberdade religiosa é muitas vezes entendida como a ‘liberdade de abandonar a religião’, ou seja, o de não pertencer a nenhuma comunidade
O aspecto positivo também é importante: a ‘liberdade pela e para a religião’. Naturalmente a liberdade religiosa tem suas fronteiras. Ela não pode violar os direitos humanos, as leis, constituição nem a ordem pública.
O que significa essa interpretação da liberdade religiosa em questões como, por exemplo, a do lenço cobrindo a cabeça?
Esta é uma questão complicada. O Conselho chegou à conclusão que não é possível responder a esta questão de uma forma geral, mas só de caso em caso. Um exemplo atual é da jogadora de basquete em Lucerna. Devido à proibição do porte do lenço nos jogos da sua federação, ela não pode mais jogar. Então se coloca a questão: o que significa liberdade religiosa no esporte?
O Conselho Suíço das Religiões está convencido de que o direito individual de expressar sua participação a uma comunidade religiosa também deve ser protegido na vida pública. Porém pode-se discutir se esse direito pode ser limitado em um clube esportivo.
Pensamos de que a paz religiosa só pode ser garantida se o Estado for neutro em relação às religiões e se ele não se declarar comprometido com nenhuma delas. Por isso é óbvio que a liberdade religiosa pode ser limitada se um crente está a serviço do Estado. O Conselho entende que o direito individual de professores de escolas públicas, por exemplo, seja limitado. Só dessa forma é possível mostrar que o professor representa o Estado.
O que significa isso para os estudantes?
Na Suíça, a maioridade religiosa começa aos 16 anos. Até então os pais são responsáveis pela educação religiosa filhos. Considero legítimo quando os pais passam as tradições que eles próprios vivem para os seus filhos.
No seu comunicado, o Conselho demonstrou compreensão pelo temor da população em relação ao fundamentalismo. Qual seria o conselho para lidar com esta questão?
Nossa opinião é que uma iniciativa como a do minarete incentiva o fundamentalismo. A partir do momento em que uma questão religiosa é instrumentalizada politicamente, aumenta o fosso entre as diferentes comunidades da população. O Conselho aposta mais no contrário: na integração.
Concretamente como seria?
Todo tipo de fundamentalismo – seja judeu, cristão, islâmico – deve ser combatido. O fundamentalismo desrespeita os direitos humanos. Ele se afirma de forma absoluta. Concretamente significa – levando-se em conta a situação do Islã na Suíça – que o Islã deve ser vivido em espaços religiosos condignos e não em fundos de quintal. Também que os imames devam ter uma formação correspondente aos critérios ocidentais. Também é importante o diálogo inter-religioso. Formação e integração são as melhores armas contra o fundamentalismo.
Em uma sociedade libertária e secular como a Suíça é correto que uma comunidade religiosa se expresse em questões legais? A religião e o Estado não devem estar estritamente separados?
Uma sociedade libertária e secular necessita da opinião das igrejas e outras comunidades religiosas. Ela precisa de instituições dedicadas às questões fundamentais de valores e de sentido. É uma forma de manter a coesão social.
Sobretudo nas questões de valores existem também contradições entre a Constituição e preceitos religiosos. Por exemplo, se a igualdade entre os sexos está determinada na Constituição, o fato é que algumas religiões não a respeitam.
Sim, essas contradições existem. Por isso é tão importante viver em um Estado de direito. Constituição e leis são válidas para todas as pessoas, independente de sua religião. Assim cada pessoa tem o direito de se retirar de uma comunidade religiosa que, na sua concepção, não aplique a igualdade entre homem e mulher.
Eveline Kobler, swissinfo.ch
Markus Sahli é pastor protestante. Atualmente trabalha como assistente pessoal de Thomas Wipf, presidente do Conselho Suíço de Religiões, e como secretário da mesma organização. Tem 50 anos e é casado.
Devido a grande diversidade de religiões na Suíça, o Conselho Suíço de Religiões (CSR) foi criado em 15 de maio de 2006. A iniciativa partiu do pastor protestante Thomas Wipf, presidente da Federação das Igrejas Protestantes da Suíça (SEK, na sigla em alemão) e primeiro presidente da CSR.
O CSR é composto por lideranças das três religiões majoritárias no país, da comunidade judaica e das comunidades islâmicas. Sua principal função é o diálogo com a sociedade civil.
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