Zurique: a cidade onde Tiago Cruz queria estar (e está mesmo)
Quando, há cerca de um ano, Tiago Cruz recebeu a notícia de que tinha sido aceite como investigador na Escola Politécnica de Zurique (ETH, na sigla em alemão), concretizou dois desejos simultaneamente: estudar e viver em Zurique.
Após a experiência em centros de investigação em Colónia e Lisboa, Tiago estará nos próximos três anos a trabalhar e a viver na cidade suíça. A swissinfo.ch encontrou-se com o investigador em Zurique e conheceu um pouco melhor a sua história.
O seu percurso académico esteve sempre relacionado com a biologia molecular. Em Lisboa, frequentou a licenciatura e mestrado na Faculdade de Ciências da Universidade de LisboaLink externo. Tiago assume que a investigação científica sempre foi um caminho que queria trilhar. O estudo das plantas surgiu quando foi selecionado para fazer um estágio de oito meses no Max Planck Institue for Plant Breeding ResearchLink externo, em Colónia e, a partir desse momento, decidiu manter a sua ligação científica às plantas.
Em Lisboa, foi também investigador do Instituto Gulbenkian de CiênciaLink externo, onde tinha a possibilidade de realizar o seu doutoramento. Contudo, quando soube que tinha sido selecionado para a ETH, Tiago nem olhou para trás: “sempre pensei que [aqui] é um sítio espetacular para estar”. Por esse motivo, mudou-se de imediato para Zurique.
Experiência internacional
Para se candidatar ao programa doutoral, Tiago teve de preencher a international call, para candidatos internacionais a bolsas de doutoramento naquela instituição e fazer uma entrevista de seleção. Tiago assume que, logo na primeira visita, “tinha gostado muito da Suíça, especialmente de Zurique”, particularmente “da qualidade de vida” na cidade. Por isso, decidiu candidatar-se e realizar o seu doutoramento numa instituição com a credibilidade e o prestígio da ETH, juntando o melhor de dois mundos: viver em Zurique e trabalhar na ETH.
Tiago Cruz está integrado no departamento de biologia – no Group of Plant Vascular DevelopmentLink externo – e o seu doutoramento intitula-se PhD program I science and policy As suas condições laborais são iguais às de qualquer trabalhador na Suíça, “apesar de ser uma bolsa, eles aqui na Suíça têm sempre contratos de trabalho”, ou seja, faz os descontos para a Segurança Social que lhe permitem aceder aos direitos sociais inerentes como, por exemplo, subsídio de desemprego.
Nesse sentido, sente que o facto de o trabalho do investigador estar regulado como as restantes profissões concede um tratamento sério à investigação e aos investigadores, contrariamente ao que acontece em Portugal, onde os investigadores recebem as bolsas de investigação e não estão abrangidos pelos mesmos direitos sociais dos restantes trabalhadores.
Influência dos genes
A investigação que Tiago Cruz se encontra a desenvolver incide no estudo dos lípidos que se encontram nas membranas das células, procurando descortinar a influência que as alterações decorridas nesses lípidos provocam no desenvolvimento da planta.
Esses lípidos são intermediários de diversos mecanismos de regulação das células presentes na planta, por isso, quando analisada esta rede de interligações sucessivas numa perspetiva macro, pode-se compreender de que forma esses desequilíbrios prejudicam o desenvolvimento da planta e como os seus tecidos se poderão diferenciar.
Para o seu estudo, Tiago recorre a uma planta modelo chamada Arabidopsis, que tem o seu genoma totalmente sequenciado e um ciclo de vida curto, permitindo saber exatamente em que gene é que a mutação relativa ao experimento que se encontrarem a fazer se verificou.
No grupo de investigação em que se encontra inserido, concluíram que quando ocorrem deformações no processo de desenvolvimento da planta, as raízes sofrem influências e, normalmente, tornam-se mais curtas. Por esse motivo, dedica-se ao estudo das raízes. “Porquê raízes? Porque as raízes é uma coisa muito fácil de observar”, esclarece.
Normalmente, colocam uma semente numa placa de vidro com gelatina e nutriente e a planta cresce nesse ambiente, o que facilita a observação das raízes, apesar de ser igualmente feita observação em microscópio. Faz ainda parte das suas tarefas lecionar algumas aulas práticas no laboratório, durante três semanas no ano letivo. No tempo restante, dedica-se em exclusivo à investigação.
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Quando questionado acerca da percepção que a sociedade em geral tem sobre o seu trabalho, Tiago mede ligeiramente as palavras: “Eu acho que o trabalho que eu faço é percepcionado como importante, sim. Eu acho é que muitas vezes a dificuldade é explicar às pessoas porque é que se dá muito dinheiro a pessoas para estudar coisas que à partida não têm logo um retorno imediato”.
Na sua opinião, existe entre a população suíça maior propensão a reconhecer a importância da ciência do que em Portugal e salienta a importância das semanas abertas à ciência que a ETH Zurich e a Universidade de Zurique promovem junto da população, contribuindo para essa tomada de consciência.
Do ponto de vista do conhecimento científico, Tiago Cruz reconhece que esta experiência está a ser enriquecedora, particularmente por ter acesso a equipamentos que permitem aprofundar mais as investigações e a possibilidade de networking que a academia oferece.
Suíça como chance
As oportunidades que encontra na Suíça para prosseguir na sua área são maiores do que em Portugal. Quando analisa as ofertas de trabalho fora da academia, facilmente conclui que na Suíça o tecido empresarial associado à Biotecnologia se encontra incomparavelmente mais desenvolvido do que em Portugal, abrindo-lhe diversas oportunidades para o seu futuro, para além do “selo de qualidade” que a ETH Zurich lhe confere.
Apesar de reconhecer que o ambiente internacional em que está inserido o afasta, por vezes, do convívio social com suíços, admite ter sido influenciado por algumas atividades habituais como os passeios pelas montanhas e o esquiar no Inverno.
Para Tiago, a cidade consegue ser bastante dinâmica e multicultural, particularmente no centro e, ao mesmo tempo, muito calma assim como harmoniosa entre o betão e a paisagem verdejante. Também por esse motivo, não sentiu dificuldades de adaptação às rotinas da cidade.
Contudo, assume que gostou imediatamente da organização reinante, mas, na mesma medida, foi algo que entrou em choque com a sua origem lusa. Habitualmente procura ir a exposições e museus e destaca que “a oferta cultural para uma cidade deste tamanho até é bastante diversificada”.
Manter as raízes
Mesmo estando longe de Portugal, Tiago assume que há produtos indispensáveis lá em casa, tais como o azeite, o bacalhau e o vinho. Parece uma imagem tradicional dos imigrantes portugueses, mas são pequenas coisas que mantêm a proximidade com o país natal, “a gastronomia é o caso mais flagrante”.
No entanto, não procura associações ou estabelecimentos portugueses na Suíça; as suas amizades portuguesas, curiosamente, já as tinha em Portugal. Contudo, confessa: “quando estás com um português há sempre aquele networking e vais acabar por conhecer outros portugueses”.
Tiago Cruz assume que se torna um pouco chauvinista no estrangeiro e aproveita sempre para salientar aquilo que Portugal tem de bom. Não obstante, assume que o seu futuro não passará por Portugal, salvo se a oportunidade for bastante tentadora. Tem vontade de permanecer no estrangeiro para aumentar as suas experiências profissionais e culturais, mas não sabe se passará a longo prazo pela Suíça; atualmente sente-se verdadeiramente satisfeito com a sua vida em Zurique.
Você decidiu emigrar e veio para a Suíça? Como foi a experiência de se integrar no país? Contem-nos sua história.
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