Nova Friburgo: um triste capítulo da história da Suíça *
A cidade de Nova Friburgo, no Brasil, foi fundada há 198 anos por suíços. A "Casa Suíça" lembra a maior emigração organizada da história helvética. Uma visita a um local 150 quilômetros distante do Rio de Janeiro, no dia da "Festa do Chocolate".
O engarrafamento era de vários quilômetros nessa tarde de domingo na estrada Friburgo-Teresópolis. A impressão é que todos os habitantes de Nova Friburgo queriam estar aqui, no “Quilômetro 18”, como se chama o endereço oficial da “Casa Suíça” nesse local, onde normalmente só se vê as paisagens naturais ao longo da estrada entre as duas cidades. Uma vez por ano é normal essa invasão: sempre um pouco antes da “Festa do Chocolate”. “Mas como hoje nunca vi”, declarou Mauricio Pinheiro, enquanto olhava para a movimentação no espaço repleto de pessoas e as filas nas frentes das barracas com chocolate e queijo. Ele suspirou. “É gente demais. Isso não é bom, pois não dá para se ocupar de todos. Não era esse o objetivo.”
A outra Casa Suíça
A Casa Suíça de Nova Friburgo. Não confundir com a Casa Suíça que estava localizada a uma distância de 150 quilômetros, na Lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio de Janeiro, e que funcionou até 18 de setembro de 2016. O espaço temporário na cidade das Olimpíadas mais se parecia como uma pequena Disneylândia, repleta de clichés da Suíça. Mas a de Nova Friburgo aproveita-se também dessa imagem com suas figuras de vacas, estátuas de Guilherme Tell e outros temas bem-vindos para as fotos “selfies”. Mas com as fábricas, onde o chocolate e o queijo são feitos no estilo suíço, e especialmente o Museu da História de Nova Friburgo, ela tem uma missão permanente.
Pinheiro foi diretor da casa entre 2009 e 2013. Hoje o suíço-brasileiro é membro da direção e mais uma vez visitava sua cidade natal. A viagem ocorria a pedido da Associação Fribourg-Nova Friburgo, organização domiciliada na Suíça e coproprietária da casa. Há três anos museólogo formado vive com a esposa e filha em Berna e trabalha na cidade de Burgdorf como restaurador de papéis históricos.
Milhares de visitantes se espremiam entre os estandes de comida. Os vendedores se esforçavam para que tudo corresse de forma razoavelmente ordenada. No entanto, o museu tinha poucos visitantes. Nós aproveitamos a oportunidade nesse lugar fresco para nos aprofundar em um capítulo negro da história Suíça. “A Suíça, terra da miséria” podia ser visto em um cartaz que abria a exposição. Os registros mostram que 2.006 suíços tiveram de abandonar involuntariamente seu país há duzentos anos. O desespero dos agricultores havia sido provocado pela crise econômica e a fome, consequências do chamado “ano frio”, quando uma erupção vulcânica na Indonésia enfraqueceu os raios solares sobre o planeta e, assim, provocou a perda de colheitas. “É um tema atual até hoje”, disse Pinheiro. “Também os suíços eram refugiados que buscavam um outro país para viver.”
Mais Thürlers no Brasil
Os refugiados suíços que chegavam, encontravam uma grande quantidade de terras colocadas à disposição por Portugal. Originários de dez cantões, mas em sua grande maioria vindo de Freiburg, os suíços batizaram o novo lugar de “Nova Friburgo”. Um cartaz no museu lembra o nome dessas duzentas famílias, dos quais muitos representantes ainda vivem no Brasil. Há muitos “Wermelingers” e o nome “Thürler” encontra-se em diferentes variações com mais frequência até do que na Suíça. De Nova Friburgo os suíços se espalharam rapidamente em todo o Brasil. Embora a paisagem lembre o mundo alpino na Suíça, eles não se adaptaram ao clima e aos novos desafios na agricultura.
Ainda hoje vivem pessoas com o passaporte suíço em Nova Friburgo. Hoje são, porém, apenas uma dúzia de famílias de suíços do estrangeiro que só emigraram nas últimas gerações. A Casa Suíça serve as famílias que já vivem há nove gerações na região, como lembrança das suas raízes. Eles não têm mais o passaporte vermelho e também não falam mais o alemão. Como instituição, a “Casa Suíça” tenta lhes ajudar. “Pois aqui é uma área muito pobre, com muitos problemas”, esclareceu Pinheiro, dando a lista: analfabetismo, utilização excessiva de pesticidas por pequenos agricultores com consequências desastrosas para a natureza e as populações, alcoolismo, violência doméstica ou até desperdício de frutas. Esse último ponto é uma prioridade para a Casa Suíça. “Nós motivamos as pessoas a não jogar fora as frutas muito maduras, mas transformá-la em geleia ou ingrediente para bolos”. Em breve os agricultores serão auxiliados através da infraestrutura na venda dos seus produtos.
“Ser autônomo”
A venda dos produtos caseiras pode ser financiada através da casa fundada há vinte anos e que, com o tempo, se transformou em uma queijaria. “Até então recebemos muito apoio da Suíça. O objetivo é nos tornar completamente autônomos”, disse Pinheiro. Depois ele retornou à Suíça. “Essas viagens são cansativas. E sempre bom retornar”, afirmou o suíço-brasileiro, admirando ao mesmo tempo o caos lá fora, frente ao museu – o congestionamento na estrada não diminuía. Centenas de pessoas ainda queriam entrar. “Porém fico feliz de poder retornar à minha família e a ordeira Suíça.”
* artigo originalmente publicadoLink externo no jornal Südostschweiz em 10 de agosto de 2016.
Adaptação: Alexander Thoele
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