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“Muitas coisas são feitas atrás dos bastidores”

O Papa Francisco cercado pela multidão no Vaticano, em 19 de maio de 2013. Reuters

Cem dias após a eleição, o papa Francisco continua mantendo uma boa imagem e índices elevados de popularidade. Se ainda é difícil fazer um primeiro balanço, os observadores estimam que alguns sinais mostram que esse "papa dos pobres" saberá também se mostrar um homem de decisão.

Ao dialogar com os fiéis de maneira familiar e ao pedir-lhes de rezar para ele, o novo papa conseguiu já desde a noite da sua eleição formar uma imagem simpática, tanto na mídia como entre o grande público. “Essa atitude muda tudo. Não temos mais um imperador, mas sim um cristão como os outros”, estima o jesuíta suíço Albert Longchamp.

Que pensamento está por trás da imagem?

Essa primeira impressão se confirmou, ressalta Maurice Page, da Agência de Imprensa Internacional Católica (APIC) em Friburgo. “Ele renunciou aos calçados vermelhos e foi pessoalmente ao hospital para visitar cardeais doentes. Também não se instalou nos apartamento privados do Vaticano e nem utiliza o Papamóvel…É verdadeiramente uma mudança de estilo em relação ao Papa Bento XVI, que era mais intelectual, mais tímido e reservado.”

Por hora ninguém apareceu para denegrir essa imagem. Provavelmente, pois nenhuma decisão importante suscetível de desagradar já foi tomada. Será preciso esperar atos fundadores como um sínodo ou encíclica para saber um pouco mais sobre a orientação do pontificado. “Não sabemos se ele será aberto ou reacionário. Certamente temos uma imagem simpática, mas por trás dessa imagem qual é o pensamento dele?”, se questiona o padre Longchamp.

Mas essas decisões irão ocorrer cedo ou tarde. Dossiês de grande importância aguardam o crivo papal. Em nível de instituição, a reforma da Cúria Romana – ou seja, o conjunto dos ministérios e outros organismos do Vaticano que ajudam o papa na sua missão – é esperada há muito tempo. “Também há a questão da ordenação de homens casados, a da atitude frente aos divorciados e aos homossexuais ou ainda a da condição da mulher na Igreja”, lembra Albert Longchamp.

Sinal forte

Até então, a única decisão realmente tangível tomada pelo novo papa foi a nomeação de um grupo de oito cardeais do mundo inteiro para ajudar no governo da Igreja. Apenas um deles é italiano e membro da Cúria Romana. A primeira reunião do grupo está prevista para ocorrer no início de outubro, mas o papa “já está em contato com os cardeais”, indica o Vaticano.

Essa abordagem é única. “Vemos no nível do papa o que já tivemos no nível das dioceses, onde existe sempre um conselho presbiteriano encarregado de apoiar o bispo”, analisa Bernard Litzler, diretor do Centro Católico de Rádio e Televisão (CCRT). “Ao formar esse grupo, o papa dá um forte sinal já no início ao indicar que não irá possivelmente se apoiar no conjunto de responsáveis dos dicastérios da cúria, mas nesse pequeno grupo de pessoas que não estão em Roma. É absolutamente fundamental. Penso que muitas coisas estão sendo resolvidas nos bastidores.”

Sem revolução

A imagem de proximidade transmitida pelo novo papa, assim como suas origens latino-americanas, poderiam incitar o grande público a pensar que ele se mostrará aberto e progressista. As referências a São Francisco poderão igualmente deixar supor que ele será, antes de tudo, um papa espiritual, distante das contingências materiais. Porém observadores atentos alertam: essa imagem não corresponde inteiramente à realidade.

“O papa anterior sofreu bastante com uma imagem ligeiramente degradada”, revela Bernard Litzler. “O perigo é que denegrimos demasiadamente o Papa Bento XVI e que arriscamos agora de polir demais o Papa Francisco, colando nele etiquetas. Isso corresponde com segurança à realidade do personagem, mas ele é, antes de tudo, um homem da Igreja e sente que tem uma missão a cumprir.”

“É necessário saber que ele não é um homem de esquerda”, ressalta Albert Longchamp. “Existe uma ambiguidade entre sua imagem e suas posições. A gentileza é uma imagem incorreta. Não se dirige um bilhão de católicos com gentileza. É necessário também firmeza.”

Em alguns pontos, o Papa Francisco já mostrou que irá seguir a linha dos seus antecessores. Ele reafirmou a firme oposição da Igreja ao aborto ou ainda confirmou um controle mais acurado das religiosas americanas, julgadas demasiadamente feministas e liberais em termos de costumes. “No fundo é preciso não esperar revoluções”, alerta Maurice Page. “Para mim as principais mudanças dizem respeito ao governo da Igreja.”

Sintonia com o mundo

Se no fundo não haverá provavelmente uma revolução, a mudança virá possivelmente através da abordagem. “O Papa Bento XVI tinha uma atitude mais pessimista do mundo”, lembra Maurice Page. “O Papa Francisco é mais positivo. Ele lembra o início do Papa João Paulo II:”

“Ter um papa jesuíta na liderança da Igreja vai valorizar novamente a espiritualidade de São Inácio e do São Francisco”, estima por seu lado Bernard Litzler. “A Igreja vive uma redescoberta dos fundamentos de tudo o que diz respeito o aparelhamento espiritual do Cristianismo. A maneira de viver dos jesuítas é uma forma de vida cristã no mundo moderno.”

Data de nascimento: Nasceu em Buenos Aires em 17 de dezembro de 1936.

Educação: Estudou e se diplomou como técnico químico, mas ao decidir-se pelo sacerdócio ingressou no seminário de Villa Devoto. Em 11 de março de 1958 passou ao noviciado da Companhia de Jesus, estudou humanas no Chile, e em 1960, de retorno a Buenos Aires, obteve a licenciatura em Filosofia no Colégio Máximo São José, na localidade de San Miguel. Entre 1964 e 1965 foi professor de Literatura e Psicologia no Colégio da Imaculada da Santa Fé, e em 1966 ditou iguais matérias no Colégio do Salvador de Buenos Aires. Desde 1967 a 1970 cursou Teologia no Colégio Máximo de San Miguel, cuja licenciatura obteve.

Sacerdócio: Em 13 de dezembro de 1969 foi ordenado sacerdote. Em 1971 fez a terceira
aprovação em Alcalá de Henares (Espanha), e em 22 de abril de 1973, sua profissão perpétua. Foi professor de noviços na residência Villa Barilari, de San Miguel (anos 1972/73), professor na Faculdade de Teologia e Consultor da Província e reitor do Colégio Máximo. Em 31 de julho de 1973 foi eleito provincial da Argentina, cargo que exerceu durante seis anos. Esteve na Alemanha, e ao voltar, o superior o destinou ao Colégio de Salvador, de onde passou à igreja da Companhia, da cidade de Córdoba, como diretor espiritual e confessor. Entre 1980 e 1986 foi reitor do Colégio Máximo de San Miguel e das Faculdades de Filosofia e Teologia da mesma Casa.

Episcopado:
Em 20 de maio de 1992, João Paulo II o designou bispo titular da Auca e auxiliar de Buenos Aires. Em 27 de junho do mesmo ano recebeu na Catedral primaz a ordenação episcopal, e foi promovido a arcebispo auxiliar de Buenos Aires em 3 de junho de 1998. De tal sé arcebispal é titular desde em 28 de fevereiro de 1998, quando se converteu no primeiro jesuíta que chegou a ser primaz da Argentina.
É Ordinário para os fiéis de rito oriental residentes na Argentina e que não contam com Ordinário de seu próprio rito. Na Conferência Episcopal Argentina é vice-presidente; e como membro da Comissão Executiva é membro da Comissão Permanente representando à Província Eclesiástica de Buenos Aires. Integra, além disso, as comissões episcopais de Educação Católica e da Universidade Católica Argentina, da que é Grande Chanceler. Na Santa Sé, forma parte da Congregação para o Culto Divino e a disciplina dos Sacramentos, e da Congregação para o Clero.

Cardinalato: Criado cardeal presbítero em 21 de fevereiro do 2001; recebeu a barrete vermelha e o título de São Roberto Belarmino

Adaptação: Alexander Thoele

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