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O filho de migrantes que entrou para a política de Genebra

Um homem posando para foto
Steven Francisco entrou no Partido Socialista no início de 2017. swissinfo.ch

Steven Francisco é o terceiro português eleito para a Câmara Municipal da cidade de Genebra. Entrevistado pela swissinfo.ch, considera que políticos esquecem muito facilmente que foram eleitos para escutar o povo. E fala dos projetos que apresentou nas comissões do alojamento, trabalho, construção e esportes.

Steven Francisco, 30 anos, nasceu em Genebra e trabalha como professor de história em duas escolas da cidade. O pai é de Aveiro, a mãe de Viana do Castelo. Os dois se conheceram em Genebra quando chegaram como imigrantes entre 1985 e 1986, em busca de trabalho. 

O jovem político de origem portuguesa se naturalizou em 2016. Hoje considera-se suíço e português: “Meus pais não só me ensinaram a falar o português, mas também quiseram que soubesse ler e escrever no nosso idioma. Essa origem faz também de mim quem eu sou”, afirma. Já seus pais não se naturalizaram e hoje já fazem planos de regressar a Portugal.

Política na vida

No início de 2017, quando partidos liberais apresentaram propostas de cortes no orçamento dos programas de ensino, cultura, esporte, inclusivamente na área da Genebra internacional, Steven se sentiu interpelado. Percebeu que os direitos sociais nunca estão definitivamente garantidos e que, se o cidadão cai em apatia ou inércia, ninguém lutará por eles. “Comecei então a acompanhar as sessões do Câmara Municipal de GenebraLink externo. Fiquei muito surpreso de ver que, nos debates, ninguém confrontava os argumentos populistas da direita. Ao mesmo tempo me identifiquei com a proposta do Partido Socialista. Em maio do mesmo ano entrei no partido.Link externo

Os sociais-democratas são acusados frequentemente de terem se esquecido da população operária e desfavorecida. Questionado sobre o tema, Steven responde que as origens humildes determinam suas prioridades políticas. “Minha motivação para a militância política é a defesa dos direitos dos que se encontram à margem dos benefícios que deveriam ser igualmente acessíveis a todos os cidadãos, independentemente das origens, confissão religiosa ou classe social de cada um. Considero intolerável que uma parte da sociedade seja sistematicamente penalizada por uma série de desigualdades sociais reforçadas com políticas de cortes orçamentais”, ressalta Francisco.

No Câmara Municipal, o português é membro das comissões da habitação, trabalho, construção e esporteLink externo e já apresentou três projetos de lei. Um deles defende a criação de um “vale para a prática de esporte” voltado às famílias que atravessam dificuldades financeiras.

Homem, e mulher no Parlamento em Genebra
Ao tomar a palavra na Câmara Municipal de Genebra. swissinfo.ch

Na área da construção e planeamento urbano propôs uma melhor utilização dos quiosques nas paradas de transportes públicos para projetos dos cidadãos, que poderiam ir de pequenos comércios até criação de comércio e cafés. O projeto será votado pelos seus pares nos próximos meses.

Steven Francisco defende ainda um maior apoio financeiro do Estado, seja através de subvenções ou incentivos fiscais, às empresas que contratam jovens até 25 anos de idade e pessoas de mais de 50 anos. O projeto está em curso de preparação e será apresentado em março.

Má fama dos políticos

O vereador genebrino reconhece a má imagem dos políticos na atualidade, embora acredite que nem todos sejam responsáveis pelos problemas. Em sua opinião, os eleitores deixam de participar das eleições, pois não se veem mais representados. “Recentemente recebemos na Comissão de obras um grupo de pessoas que se opõem ao corte de árvores na cidade de Genebra. Elas questionaram durante meses as autoridades através de cartas e e-mails. Pediram para ser recebidos, mas não obtiveram resposta. Os políticos esquecem facilmente que estão lá para escutar as preocupações dos cidadãos e para os representar.” 

Quando trabalha na escola como professor, Steven se esforça em fazer conhecer aos alunos todo o espectro político e os encoraja a votar. “Costumo dizer que o principal é não deixar que outros decidam por eles sobre assuntos que determinam as suas vidas e que por isso é importante participar das eleições. Esquecemos que o fato de não votarmos, não retira à política influência sobre a nossa vida. Votemos ou não, não escapamos dessa influência.”

Homem prestando juramento em Parlamento
Prestando o juramento ao assumir o mandato de vereador na Câmara Municipal de Genebra. cortesia

Quanto tempo ficará na política? O jovem vereador não tem dúvidas. “Apresentei projetos no partido e quero continuar a defendê-los. Em todo caso, minha vocação é o ensino”, diz, lembrando que considera importante conjugar a profissão como o exercício de um mandato político, como é comum na Suíça. 

Problemas de integração

Steven afirma que os imigrantes portugueses na Suíça têm interesse em se integrar, pois todos pagam impostos, aluguéis e seguros de saúde. “Podem e deveriam participar na vida cívica, nos eventos que fazem a vida da cidade onde moram. E votar, pois os eleitos não representam só quem tem a nacionalidade suíça, mas também os residentes estrangeiros que vivem em Genebra.” 

Lamenta que muitos compatriotas esqueçam suas raízes, língua e origens culturais ao longo do processo de adaptação na Suíça. “Como professor, vejo alunos da segunda geração de emigrantes que já nem sabem falar português. Quanto a mim, acho que a integração não é incompatível com as nossas origens. Manter duas línguas, duas culturas e duas nacionalidades, nos enriquece e permite ter uma maior abertura de espírito, uma maior tolerância para os povos migrantes atuais e para a diversidade local.” 

Religião

O vereador frequenta a Paróquia de Sainte-Clotilde, que abriga a Comunidade Católica de Língua Portuguesa (CCLPLink externo) de Genebra, uma organização que existe também noutros países e geralmente agrupa fiéis lusófonos no exterior. Na paróquia, Steven assumiu várias funções: foi organista e catequista e, durante os últimos três anos, secretário do conselho paroquial.

Recentemente foi eleito presidente da CCLP para um mandato de quatro anos. Sua promessa é colocar as associações portuguesas em maior sintonia, convencido de que a falta de colaboração e coordenação de atividades divide e enfraquece a população genebrina de origem portuguesa. Já deu os primeiros passos: “Já tivemos uma primeira reunião em dezembro de 2019, na qual participaram quase todas as associações”. Católico e socialista? “Tudo menos contraditório”, responde.

Portugueses na Suíça

Os primeiros trabalhadores portugueses chegaram na Suíça por volta dos anos 1970. Hoje são a terceira maior comunidade de estrangeiros residentes no país: segundo os números atuaisLink externo do Departamento Federal de Migração (BFS, na sigla em alemão), vivem aproximadamente 263 mil cidadãos portugueses no país. 

Veja AQUI o dossiê swissinfo.ch sobre portugueses na Suíça.

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