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Suíços criam espaço para muçulmanos em cemitérios

As sepulturas muçulmanas do cemitério de Witikon, em Zurique, estão alinhadas para a Meca. Keystone

A procura de lugares para sepultamentos muçulmanos continua sendo debate na Suíça. Apesar de ser pouco usual, a prática deve se generalizar com o fortalecimento gradual da geração mais jovem no país.

No começo do ano, os meios de comunicação da Suíça geraram uma polêmica em torno da baixa utilização dos chamados “quadrados” muçulmanos – as áreas demarcadas em cemitérios municipais – pelas comunidades para as quais foram criadas. Desde 2000, uma dúzia de cidades, principalmente na parte de expressão alemã do país, reservaram uma parte de seus cemitérios para as pessoas de religião muçulmana.


Indignados, jovens membros do Partido do Povo Suíço (SVP, na sigla em alemão) de Lucerna (centro) exigiram o fechamento do espaço inaugurado em 2008 no cemitério municipal Friedental, alegando que apenas dez sepultamentos ocorreram desde então. No cantão de St. Gallen (nordeste), o mesmo partido se opôs a uma nova lei sobre cemitérios que autorizaria os municípios a criarem espaços reservados aos muçulmanos. A lei acabou sendo aprovada em junho passado.

Por outro lado, a primeira notícia de um enterro muçulmano também ecoou na mídia. Foi o que aconteceu na cidade de Biel, em junho, menos de um ano após a criação de uma área podendo acomodar 800 sepulturas.

Laços fortes com a pátria

A polêmica causou incompreensão entre os interessados, mas também entre especialistas religiosos e até quem trabalha nos cemitérios. Esses explicam na imprensa de Basileia e Lucerna, que os defuntos pertencem principalmente à primeira geração de emigrantes, que prefere ser enterrada em seu país.


Segundo estimativas da Associação das Organizações Muçulmanas de Zurique (VIOZ), mais de 90% dos mortos são repatriados ao país de origem. “Os mulçumanos que estão morrendo agora ainda têm fortes laços com a pátria”, explica Muhammad Hanel, porta-voz da associação. “Isto irá mudar dentro de uma geração, ou seja, daqui a 25 anos”, prevê.

Essa opinião compartilhada por Andrea Tunger-Zanetti, especialista em islamismo e coordenador do Centro para o Estudo das Religiões da Universidade de Lucerna. “O número de sepultamentos muçulmanos vai inevitavelmente aumentar na Suíça à medida que os jovens que nasceram e têm suas raízes aqui envelhecerem”, disse.

O direito a um sepultamento decente é regulamentado pelo artigo 7º da Constituição Federal que protege a dignidade humana. “O mandato é claro. Sua aplicação é uma questão de interpretação política. Na minha opinião, colocar à disposição uma infraestrutura adequada também é uma medida de integração”, diz Zanetti.

Desejo existencial

Em um relatório sobre a nova lei, o governo do cantão de St. Gallen (nodeste) apontou para a falta de alternativas ao repatriamento dos corpos, sustentando que isso seria prejudicial para a integração. “O desejo da população muçulmana é existencial”, observaram as autoridades.


O governo cantonal acrescentou que o crescente número de muçulmanos na Suíça também irá aumentar a necessidade de sepultamentos de acordo com a fé dessas pessoas. As últimas estatísticas confirmam essa tendência.

De acordo com os dados de uma pesquisa sobre as comunidades religiosas publicada no início de julho, com base no censo federal de 2000,  310.807 muçulmanos moravam na Suíça na virada do milênio, ou 4,26% da população. Em 1970, eles representavam apenas 0,26% dos residentes do país.

Concessões cerimoniais

O cantão de Zurique, que tinha cerca de 102.000 muçulmanos em 2007, ou quase 8% da população, também debate a questão. A cidade de Zurique criou um espaço muçulmano no cemitério de Witikon, em 2004. O segundo espaço será inaugurado em Winterthur em outubro.


“Conseguimos algo muito importante depois de décadas de luta, por isso apreciamos muito o acontecimento”, disse Issa Gerber, membro da Comissão dos Cemitérios da VIOZ; 131 pessoas foram enterradas no cemitério de Witikon de acordo com o ritual muçulmano desde 2004 e ainda há 320 lugares. “O espaço tem uma área de 2520 metros quadrados. O de Winterthur será muito maior e oferece 380 lugares em 3700 metros quadrados”, explicou.


Como em outros lugares, as comunidades muçulmanas fizeram algumas concessões. A religião exige que o corpo seja enterrado em uma mortalha sem caixão, e, teoricamente, em um lugar reservado para a eternidade para uma pessoa.

Os muçulmanos da Suíça, no entanto, aceitaram o caixão e o fato que muitos sepultamentos possam ser realizados no mesmo local.  Até três, com um intervalo de 20 anos, em Zurique. Em La Chaux-de-Fonds, os corpos não são enterrados na direção da Meca, mas a cabeça pode ser inclinada em direção ao sudeste.

Problemas de vizinhança

Em Zurique, como em Liestal, os funerais islâmicos não deram reclamações. Na vizinhança, tanto com os particulares como as religiões estabelecidas, não há problemas. Na cidade de Liestal, no cantão de Basileia-Campo, a controvérsia em torno da criação de um espaço para os muçulmanos gerada pelo jornal “BaslerZeitung” foi considerada como uma “tempestade em copo d’água” pela população.


Ainda assim, as oposições são muitas vezes violentas quando um projeto é criado em um vilarejo. No cantão de Berna, a administração de Köniz se recusou a criar um espaço muçulmano, mas a câmara dos vereadores acabou aceitando. “No cantão de Zurique, com exceção de Winterthur e Zurique, as cidades nos criam muitas barreiras”, diz Issa Gerber.

De acordo com Andrea Tunger-Zanetti, os muçulmanos também podem, como a comunidade judaica, organizar cemitérios privados. “Mas é caro. Deve ter uma instalação adequada para o tratamento dos restos mortais e esta comunidade não parece ser capaz de escolher esta solução”, disse.

Depois da morte, o corpo de uma pessoa de religião muçulmana deve ser lavado dentro de 24 horas e o enterro deve acontecer dentro de 48 horas, de modo que a alma possa sair do corpo e a dignidade da pessoa falecida seja assegurada.

Quando a família decide repatriar o corpo, o caixão deve ser lacrado por um médico forense e é necessário um “passaporte para o falecido”, com uma autorização de viagem fornecida pela embaixada.

O caixão é embalado (para não ser reconhecido) em um saco de serapilheira para a viagem. O todo sai por alguns milhares de dólares.

Em princípio, os túmulos devem ser orientados em direção à Meca, o corpo deve ser envolto em uma mortalha, e não é colocado em um caixão. A paz dos mortos tem um caráter perpétuo.

O primeiro espaço muçulmano em um cemitério da Suíça foi criado em 1978, em Petit-Saconnex, no cantão de Genebra. A questão de quem pode reivindicar um enterro tem sido debatida durante anos. O espaço muçulmano de Petit-Saconnex está completo.

No final de 2007, a prefeitura de Genebra criou “espaços multi-religiosos” no cemitério de St. George para as comunidades judaica e muçulmana.

Espaços muçulmanos foram criados nas seguintes cidades e anos (lista não exaustiva): Basileia (2000), Berna (2000), Lugano (2002), Zurique (2004), Liestal (BL 2007), Sissach (BL, 2008) Pratteln (BL 2009), Thun (2009), Olten (data desconhecida), La Chaux-de-Fonds (2011) e Biel (2011).

Em 2000, a Suíça contava 310.807 muçulmanos, ou 4,26% da população. Em 1970, eles representavam apenas 0,26% dos habitantes da Suíça.

De 100 muçulmanos que vivem na Suíça, 57 são provenientes dos países da ex-Iugoslávia. 20 são de nacionalidade turca. Quase 80% dos muçulmanos que vivem na Suíça, portanto, praticam um islamismo europeu: para eles, a religião é um assunto privado e o Estado é laico.

Os membros das comunidades islâmicas são mais numerosos na Suíça de expressão alemã (4,7% da população, em média) do que na parte de língua francesa (3,6%) e na de língua italiana (1,8%).

Fonte: Formation en Suisse des imams et des enseignant-e-s en religion islamique? Prof. Ulrich Rudolph

Adaptação: Fernando Hirschy

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