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Algumas ideias criativas para driblar as barreiras do emprego

Mulher dirigindo caminhão
"Para juntar dinheiro, trabalhei antes em fábrica de chocolate e em limpeza. Tive sorte de tirar minha documentação de motorista antes de 2009. Depois ficou mais difícil", conta a portuguesa Diana Gomes. swissinfo.ch

Entrar no mercado de trabalho formal da Suíça é difícil. Não é impossível, claro. Mas conseguir manter similar função exercida antes da migração no país de origem é ainda mais complicado. O problema se agrava para brasileiras com nível superior e mestrado, portadoras de diplomas do Brasil. 

Infelizmente nem todos os cursos de universidades nacionais são reconhecidos no exterior. Salvo algumas exceções, em geral essas escolas não são valorizadas na Europa. Some a isso a falta de creches, a barreira do idioma, a reduzida rede de contatos.

A concorrência com os suíços é dura; já com os conterrâneos, é briga por um espaço no mercado da saudade, que significa comercializar salgadinhos, vender comida típica ou fornecer serviços tipicamente brasileiros, como manicure. Entretanto, essa opção coloca o migrante em um lugar comum e na briga por um mercado consumidor limitado.

Apostar no diferente, entretanto, parece ter um certo apelo. Pensar fora da caixa pode ser uma solução interessante por vários motivos e isso vale tanto para empregos fixos quanto para ideias empreendedoras que saiam do óbvio.

Artigo do blog “Suíça de portas abertas” da jornalista Liliana Tinoco Baeckert.

A swissinfo.ch ouviu quatro brasileiras e uma portuguesa, que conseguiram driblar os inúmeros obstáculos com criatividade. Entre as vantagens, a maioria relatou a possibilidade de trabalhar em casa, ficar mais próximas dos filhos e ter mais flexibilidade de horário. Em comum, todas têm vontade de ter seu próprio salário, fazer o que gostam e admiram e, apresentar um diferencial ao mercado. Essa matéria não é sobre ganhar muito dinheiro, mas sobre fazer algo em que se acredita e lucrar como consequência.

Abrindo seus caminhos como caminhoneira

Dirigir um caminhão parece não ser a primeira opção profissional para uma mulher. A portuguesa Diana Gomes, 30 anos, nunca teve esse preconceito. Conseguiu se sustentar na Suíça a bordo de uma boleia. Não se admirem ao encontrarem outras meninas pilotando caminhões pesados nas estradas suíças. Diana tem permissão para dirigir um exemplar de até 18 toneladas, com até três eixos, sem reboque. E não é só isso, ela carrega e descarrega o material.

Filha de pai caminhoneiro, Diana sempre gostou da profissão e adora carros. Tirou carteira no exército português quando tinha 18 anos e ao migrar para a Suíça, viu que era uma chance de entrar no mercado de trabalho e ainda ter um bom salário.

Fez cinco cursos obrigatórios com o intuito de arrumar emprego na área no país. “Para juntar dinheiro, trabalhei antes em fábrica de chocolate e em limpeza. Tive sorte de tirar minha documentação de motorista antes de 2009. Depois ficou mais difícil”, explica a portuguesa.

– Aprendi muito com essa profissão. Encontrei pessoas muito boas, colegas e clientes muito simpáticos. Convivi com machismo, mas foram poucas vezes. Em geral, os homens me davam os parabéns. Recebia também bilhetes amorosos”, conta Diana, que hoje trabalha no escritório da empresa para onde dirigia. A nova posição é uma promoção profissional. Seu objetivo é evoluir, sempre. Sua história mostra o progresso.

Vendedoras de livros e promotoras do bilinguismo

O Mini Bilingue é um exemplo de ideia que supre a necessidade de mercado. Quando duas educadoras apaixonadas pela leitura se tornam mães de crianças bilíngues, o resultado é um Clube de Assinaturas de livros infantis que estimulem a fala de dois idiomas. Criado em 2018 pelas sócias Ana Paula Etienne, que mora em Genebra, e Ingrid Pelegrini, no Rio de Janeiro, o site oferece como diferencial a venda de livros de qualidade, já testados e lidos pelas sócias e catalogados por grupos de idades.

De acordo com Ana Paula, O MinibilingueLink externo é uma nova alternativa para aquisição de livros infantis de língua portuguesa no exterior. Mas foi uma opção para ela também, que é mãe de três crianças e mora longe da família brasileira. Isso sem falar na possibilidade de incentivar um estilo de vida mais aberto à diversidade.

– Livros são a porta de entrada a um mundo melhor. Mas para isso, precisávamos ajudar essas mães escolherem bons materiais para seus filhos. É comum ouvir mães que compraram livros online no Brasil e se decepcionarem ao abri-lo. Não somente pela qualidade, mas pela falta de adequação à idade da criança, explica Ana Paula.

Ao contrário de comprar às escuras, as sócias classificam os produtos pela quantidade e qualidade do texto, complexidade dos diálogos e vocabulário, atratividade das ilustrações, potencial de estímulos linguísticos, neutralidade quanto à religião e respeito a todas as crenças. 

As duas sócias enviam para vários países e fornecem consultoria no assunto. O cliente do Clube de Leituras Minibilingue recebe um livro por mês, dicas sobre atividades extras de como aprofundar o texto e ainda informações sobre bilinguismo. Os pais que têm dúvidas podem enviar perguntas sobre o tema, que serão respondidas por uma fonoaudióloga profissional.

O Minibilingue é fruto da paixão pelos livros, mas é também fundamentado no projeto de conclusão do Mestrado em Gerência de Luxo (Management du Luxe à la Haute École de Gestion), que Ana Paula finalizou em Genebra.

Experiências exóticas

Após se mudar para a Suíça há quatro anos, Priscilla Kirsner colocou o filho, na época com dez meses, nas costas e começou a explorar a região com o marido. Simplesmente se apaixonou pelas paisagens. Daí surgiu a ideia do Instagram, que cresceu, virou blog e depois a marca Swiss XplorerLink externo. O passo seguinte, que era tornar-se guia, foi automático. A paulistana começou a oferecer planejamento de viagens e roteiros personalizados.

Mas Priscila Kirsner não parou por aí. Como é amante da natureza, pensou em vender passeios mais elaborados e exóticos, misturando exclusividade e aventuras. “Uma das opções mais especiais é a trilha na montanha, seguida de um jantar em um restaurante exclusivo. A experiência é finalizada com um tour de trenó noturno. Se o turista quiser ver os Alpes suíços do alto, vale fazer um passeio de balão ou helicóptero e conferir a neve que não derrete nunca”, explica.

Entre as opções exóticas, é possível ainda passar uma noite em um iglu de gelo localizado no topo dos Alpes, a uma altitude superior a 2 mil metros, com acesso apenas por teleféricos. O turista pode ainda saborear degustação de queijos e fondue.

Hoje, com a marca Swiss Xplorer, Priscila acaba de abrir agência de turismo no Brasil para atender melhor a clientela no país.

– Para mim era simplesmente inexplicável o fato de esses passeios não serem oferecidos aos turistas brasileiros.

Priscila também é outro exemplo de reinvenção. É formada em Comunicação Social e trabalhou no Brasil em emissoras de televisão. Nunca havia atuado com turismo, mas a veia comercial vem da pós-graduação em marketing e do sentimento do negócio.

Ela diz que fazia muito roteiro personalizado sem cobrar comissão e viu, nesse vazio do mercado, uma oportunidade de trabalhar com o que gosta e também ganhar dinheiro. “Senti a necessidade de dar um passo pra frente, mas não queria uma agência de viagem comum”, explica.

Priscila organizou, em janeiro desse ano, o próprio evento de caminhada na neve. Teve 44 participantes, a maioria dos brasileiros e portugueses que residem na Suíça. Já está montando um pacote na agência para oferecer este mesmo evento para quem vem passar férias na Suíça e já tem duas datas fechadas na montanha Elm. O pacote incluirá seu trabalho como guia e acompanhamento e outras guias brasileiras, cada uma especialista em sua cidade de atuação.

Mulher tirando fotografia com câmera
“Fiz curso profissionalizante de um ano com diploma. Foi um passo importante para mim porque foi todo em alemão e tive o primeiro contato com profissionais suíços”, conta Laurentina Leal. swissinfo.ch

Elas eternizam passeios

Laurentina Leal e Lívia Jordão não são simplesmente fotógrafas. Elas fazem tours fotográficos para turistas que visitam a Suíça. Tendência mundial e já disponível em vários países, esse tipo de serviço tem um quê de diferente: o profissional acompanha passeios de turistas, geralmente com um guia, e registra os momentos mais bonitos com fotos de qualidade. Nesse mundo de redes sociais, deve haver muita procura.

– Eu comecei a atuar nessa área a convite da Ana Luiza de Souza, que é guia turísticaLink externo e recebia pedidos de clientes, conta Laurentina, que vive na Suíça desde 2011. Eu faço outros tipos de fotografia, como ensaios de família e gestante, book fotográfico, casamentos e eventos.

Ela e Lívia são dois outros exemplos de reinvenção. As duas tinham suas profissões no Brasil (arquiteta e contadora) e tiveram que abrir mão de suas carreiras para acompanhar os maridos na expatriação para a Suíça.

Uniram o amor a paixão pela fotografia com a necessidade do mercado e começaram a oferecer o serviço. As duas têm filhos em idades escolar, precisam estar mais em casa e só um trabalho autônomo daria a elas a possibilidade de flexibilizar a agenda.

A formação em Fotografia que fez em Zurique simboliza a árdua caminhada de Laurentina, assim como a de tantas mulheres migrantes. “Fiz curso profissionalizante de um ano com diploma. Foi um passo importante para mim porque foi todo em alemão e tive o primeiro contato com profissionais suíços. Eu era a única estrangeira”, conta.

Lívia comunga da mesma paixão pela fotografia. A mudança do Rio de Janeiro para a Suíça a fez ter mais tempo para esse hobby, que se tornou há pouco uma nova profissão.

– Eu acho muito nobre o papel da fotografia. De uma certa forma, ela capta esse momento feliz e eterniza, diz Lívia, que publica suas fotos no instagram @fotosnasuica.

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