Aumentam os esforços contra o tráfico de pessoas
O Brasil e a Suíça são unidos por laços históricos que hoje se refletem nas boas relações comerciais, políticas e diplomáticas mantidas entre os dois governos.
Alguns temas que ligam os dois países, no entanto, são motivo de grande preocupação para as autoridades suíças e brasileiras, como é o caso do tráfico de pessoas.
Em busca de uma maior eficiência no combate a esse tipo de crime, ambos os governos têm empreendido esforços para tentar dificultar a ação dos criminosos e dar maior visibilidade a uma prática hedionda que faz milhares de vítimas por ano em todo o mundo.
Segundo destino preferencial das vítimas de tráfico de pessoas no Brasil, atrás somente da Holanda, segundo o Ministério da Justiça brasileiro, a Suíça tem tomado algumas iniciativas para reconhecer e solucionar o problema. O país foi citado positivamente no Relatório 2012 da Anistia Internacional por ter ratificado, por intermédio da Câmara dos Deputados, a Convenção Sobre a Luta Contra o Tráfico de Seres Humanos estabelecida pelo Conselho da Europa.
Em recente abordagem sobre o tema, a ministra suíça da Justiça e Polícia, Simonetta Sommaruga, afirmou que o tráfico de pessoas “é uma forma moderna de escravidão e merece ser combatido com determinação”. Uma das medidas tomadas pelo governo federal foi compartilhar com os cantões (estados) suíços a responsabilidade pelas investigações e instruções penais relativas a esse tipo de crime. O trabalho das autoridades locais é auxiliado pelo Serviço de Coordenação Contra o Tráfico de Seres Humanos e o Tráfico de Migrantes e pela Polícia Federal.
A partir de 1º de janeiro de 2013, a Polícia Federal colocará em funcionamento o Serviço Nacional de Proteção de Testemunhas, considerado essencial para que mais e melhores informações sejam obtidas sobre o tráfico de pessoas na Suíça: “O aumento dos casos suspeitos constatado em 2011 é o corolário do silencio das vítimas e ilustra a dificuldade de punir essas infrações. Raros são os casos registrados, pois as vítimas são submetidas a uma pressão enorme. Nesse contexto, a proteção das vítimas e das testemunhas é de uma importância decisiva”, afirma Jean-Luc Vez, diretor da Polícia Federal.
Identificar os casos de tráfico de pessoas e dar visibilidade ao problema é o maior desafio da Suíça, afirma a brasileira Fátima de Souza, que reside em Genebra e trabalha há mais de 20 anos na área de assistência social: “A legislação suíça, através da Lei dos Estrangeiros, garante um visto de permanência provisório às vítimas do tráfico de pessoas durante o processo, que é bem longo. Sendo provado o tráfico, a lei garante um visto humanitário às vítimas. O problema é que é bem difícil comprovar o crime de tráfico de pessoas e, na maioria dos casos, as vítimas são mandadas de volta ao país de origem ou ficam ilegais aqui na Suíça”, diz.
A identificação do problema também não é tão simples no setor de atendimento social, diz Fátima: “Muitas vezes, as organizações sociais públicas não acreditam que se trata de tráfico de pessoas e não levam os casos muito a sério. São as ONGs que insistem, mas o ganho de causa na Justiça é bem complicado, pois o pedido de provas é imenso”, diz, acrescentando que a situação se agrava em casos de trabalho forçado, “pois as causas são julgadas pelo tribunal trabalhista e não é considerada na esfera penal”.
Frente às dificuldades de tratamento dos casos de tráfico de pessoas na Justiça, tirar as vítimas das mãos dos criminosos, ainda que estes não sejam punidos, já é considerado uma vitória para os profissionais que lidam diretamente com casos muitas vezes assustadores: “Houve um caso de duas brasileiras que vieram para a Suíça como dançarinas, mas tiveram seus passaportes confiscados pelos criminosos e foram postas na prostituição. Nesta época, a única coisa que pude fazer foi obrigar o consulado brasileiro a emitir novos passaportes para que elas voltassem para o Brasil”, conta Fátima.
Modernizar a lei
No Brasil, o governo se prepara para lançar ainda este ano – em data não confirmada – o 2º Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, considerado fundamental para que o país dê um salto de qualidade no enfrentamento a esse tipo de crime. A primeira edição do plano foi lançada pelo Ministério da Justiça em 2008, e a nova edição, já elaborada, prevê parcerias internacionais, programas compartilhados entre diversos ministérios e ações integradas entre o governo federal e os governos estaduais.
No Brasil, existe também a necessidade de se modernizar a lei de forma a melhor combater o tráfico de pessoas. Um seminário realizado em São Paulo em outubro com a participação de instituições como o Conselho Nacional de Justiça, a Polícia Federal e a Defensoria Pública da União, entre outras, propôs a adoção no país de uma legislação penal mais rigorosa no que diz respeito a esse tipo de crime.
Atualmente, o Código Penal brasileiro prevê o tráfico de pessoas apenas para fins de exploração sexual, ignorando outros fins já reconhecidos pela ONU e pelo governo brasileiro, como a exploração de mão de obra, a remoção de órgãos, o casamento servil e a adoção internacional ilegal.
No Brasil, diversas iniciativas estão sendo tomadas pelos governos estaduais para auxiliar o governo federal no combate ao tráfico de pessoas.
O Governo do Rio Grande do Sul criou em outubro o Comitê de Atenção a Migrantes, Refugiados, Apátridas e Vítimas do Tráfico de Pessoas, que passará a acompanhar o tema.
Atualmente existem no país 16 núcleos de enfrentamento ao tráfico de pessoas, distribuídos pelos estados do Acre (2), Alagoas, Amapá, Amazonas, Bahia, Ceará, Distrito Federal, Goiás, Minas Gerais, Pará, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e São Paulo.
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