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Peritos pedem descriminalização de portadores de HIV

Professor Rolf Rosenbrock apresenta avaliação do Programa Suíço Antiaids 2004-2008. eq images

De acordo com um estudo jurídico publicado nesta quarta-feira (23/9), portadores de HIV acusados de transmitir o vírus da aids são discriminados pela jurisprudência suíça.

Eles correm o risco de serem condenados por causa de relações sexuais sem preservativo, mesmo que tenham informado o parceiro sobre a doença, o que contradiz a política oficial antiaids, segundo os pesquisadores.

Na Suíça, o portador de HIV que arrisca transmitir o vírus da aids a outras pessoas através de contatos sexuais não protegidos comete um crime previsto nos artigos 122 (lesão corporal) e 231 (propagação de doenças perigosas) do Código Penal.

Na última década, as condenações por esse tipo de crime aumentaram bastante. Na comparação europeia, a Suíça lidera as estatísticas junto com a Suécia e a Áustria.

Os juristas Kurt Pärli, da Universidade de Ciências Aplicadas de Zurique, e Peter Mösch Payot, da Universidade de Lucerna, avaliaram 51 sentenças em 39 casos relacionados ao HIV ou à aids proferidas por tribunais suíços desde 1990.

Segundo os resultados do estudo financiado pelo Fundo Nacional Suíço (SNF) em cooperação com a ONG Ajuda Suíça contra a Aids, 36 casos referiam-se à transmissão do HIV através de contato sexual sem preservativo, a maioria de homem para mulher (apenas cinco entre homossexuais).

Quase todos os contatos sexuais ocorreram voluntariamente – em apenas três casos houve estupro ou outro tipo de violação. Nem sempre o parceiro foi contagiado, às vezes houve só uma tentativa nesse sentido.

Responsabilidade unilateral

De acordo com um comunicado do SNF, na maioria dos casos, o portador de HIV havia informado seu parceiro sobre a doença. Em vários casos, porém, portadores foram condenados apesar de terem informado seu status de HIV ao parceiro e este ter concordado com o ato sexual.

Em 21 dos 39 casos, as sentenças basearam-se no artigo 231 do Código Penal Suíço (propagação de doenças perigosas). Na opinião dos autores da pesquisa, isso discrimina os portadores de HIV, que estariam sendo responsabilizados unilateralmente pelos tribunais.

Pärli e Payot advertem que essa prática jurídica contradiz a política de prevenção à aids da Suíça e sua mensagem de que ambos os parceiros são igualmente responsáveis. Assim, portadores de HIV não são estimulados a lidar abertamente com seu estado de saúde e sim a ocultá-lo, explicam os autores.

Mudar a lei

Por isso, os pesquisadores recomendam que o artigo 231, considerado internacionalmente uma particularidade da legislação suíça, seja riscado do Código Penal. Especialmente porque, nos casos em que foi aplicado, as penas foram bastante duras – entre dois e quatro anos de prisão, dependendo do cantão (estado).

Com sua recomendação, os autores vão um passo além das medidas que estão sendo discutidas na atual revisão da Lei sobre Epidemias, que prevêem uma amenização do artigo 231, em vigor desde 2003.

Segundo Pärli e Payot, até recentemente, os tribunais suíços praticamente não consideravam a pouca probabilidade de contágio através de apenas um ato sexual não protegido.

De acordo com especialistas, novos medicamentos garantem que o vírus nem seja mais comprovado no sangue. Por isso, no final de 2008, a Comissão Suíça para Questões Ligadas à Aids informou que, em sua opinião, tais pessoas podem ter sexo sem camisinha, desde que vivam com um parceiro fixo.

Segundo Pärli e Payot, essa recomendação – inédita no mundo – e novas avaliações já permitiram inocentar acusados, por exemplo, no cantão Genebra. Eles lembram, no entanto, que, mesmo depois dos debates acirrados dos anos de 1990, não há consenso entre os especialistas sobre a penalização da transmissão do HIV.

Geraldo Hoffmann, swissinfo.ch (com SNF)

Na Suíça vivem entre 16.000 e 20.000 portadores de HIV. Anualmente são diagnosticados 700 a 800 novos casos.

Segundo o professor Rolf Rosenbrock, do Centro de Pesquisas Sociais de Berlim, o número de novos casos de aids na Suíça permanece estável, mas, por milhão de habitantes, é três vezes superior ao da Alemanha.

Rosenbrock apresentou nesta quarta-feira, em Berna, um estudo internacional sobre o Programa Suíço Antiaids 2004-2008. Os especialistas recomendam a criação de uma organização de saúde voltada aos homossexuais para diminuir os novos casos de infecção, bem como o desenvolvimento de uma estratégia coerente de testes antiaids no país.

“Vamos tentar considerar as conclusões do estudo na próxima estratégia”, disse o diretor do departamento de aids da Secretaria Federal de Saúde, Roger Staub.

O programa antiaids implementado desde 2004 foi prorrogado até 2010. A partir de 2011 será adotada uma nova estratégia.

swissinfo.ch

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