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O Yogi suíço que nunca mais retornou

O suíço que emigrou à Índia em 1952 para estudar meditação e se tornar um guru. Nunca mais retornou ao seu país de origem. Malcolm Tillis

A mãe dele queria que ele se tornasse um banqueiro, mas Hans Hablützel renunciou às ambições mundanas para embarcar em uma jornada espiritual da Suíça à Índia, da qual nunca retornou.

“É a riqueza e o amor que controlam o mundo. O mundo todo gira ao redor desses dois poderes”, Hans Hablützel ainda se lembra de ouvir sua mãe dizer.

O pai de Hablützel, um próspero contador juramentado de Zurique, morreu de tuberculose quando ele tinha apenas três anos, deixando a mãe sozinha a cuidar deles. Ela queria que o filho se tornasse um diretor de um banco, para que pudesse controlar o fluxo de dinheiro e assim tomar conta do próprio destino.

A história, porém, não quis que fosse assim. Em 1952, aos 23 anos, ele partiu da Suíça rumo à Índia determinado a encontrar um guru que o ajudasse a achar paz interior. Duas semanas antes de partir, ele contou seus planos à mãe e aos amigos e pediu que não o procurassem por 12 anos. Ninguém o levou a sério e pensaram que ele chegaria no máximo até à Grécia. Hablützel não voltaria a ver nenhum deles.

Cinquenta anos depois, ele mesmo se tornou um guru, com seus próprios seguidores à procura de iluminação. Ele morreu em novembro do ano passado, na cidade de Dehradun, no norte da Índia. Ele foi enterrado em um vilarejo próximo, sentado com as pernas cruzadas na posição tradicional dos Swamis.   

Um pouco mais jovem, meditando no Himalaia. courtesy

“Ele era totalmente devoto a Deus e não acreditava em fama, ou em criar o seu próprio ashram”, disse, diretamente de Dehradun, Sudhakar Mishra em uma entrevista por telefone com a swissinfo.ch.

Mishra, que conheceu Hablützel inicialmente em 1971, descreve a si mesmo como “discípulo, seguidor e amigo” de Swami Jnanananda – o nome de monge dado a Hablützel pelo guru dele. Mishra até escreveu um livro sobre ele, chamado “Um Swami com uma diferença”, que descrevia o desinteresse de Hablützel em se tornar um guru-celebridade em meio a todas as armadilhas da fama.

De acordo com Mishra, a maioria dos discípulos de Hablützel eram indianos, apesar de haver alguns ocidentais. Um deles é o americano Swami Bodhichitananda, que mora na região indiana dos Himalaias desde 1991 e hoje possui seu próprio ashram, centro para retiros espirituais. Conforme conta Bodhichitananda, o seu guru não gostava de falar da vida na Suíça.

“Enquanto Sannyasis (desapegados) somos encorajados a não falar muito da nossa vida Poorvashram, a vida antes da renúncia”, ele explicou à swissinfo.ch por e-mail.

Em resposta aos curiosos, ao invés de falar, Hablützel mostrava sua biografia “Jornada de Transcendência”; quando sentia que seu passado poderia servir de inspiração para outros progredirem na vida espiritual.

Atração do Oriente

A autobiografia de Hablützel’s não revela muito de sua vida suíça. Entretanto, swissinfo.ch conseguiu confirmar que ele estudou por um ano no internato Instituto Montana, no cantão suíço de Zug. Ele foi colocado lá por sua mãe, enquanto ela viajava para visitar amigos pela Europa.

Durante os bombardeios da Segunda Guerra Mundial, as propriedades da família na Alemanha foram destruídas e a situação financeira tornou-se preocupante. Hablützel teve que ser matriculado na escola pública local.

A morte prematura do pai despertou nele o interesse por questões do além. Mas foi uma experiência muito próxima da morte que o levou à espiritualidade. Ele estava andando de patins na rua da sua casa em Zurique, quando ouviu uma voz lhe mandando parar. Ele obedeceu, pulando sobre a calçada para reduzir a velocidade. Escapou por pouco de ser atropelado por um caminhão que passava por ali. Depois disso, Hablützel se convenceu de que “a vida está de fato nas mãos da divina providência”.

Quando era adolescente, Hablützel buscava contemplação às margens do rio Sihl, perto de Zurique, e meditava como os mestres orientais sobre os quais lia nos livros. E foi um livro – “A Autobiografia do Yogi”, de Paramahansa Yogananda – presenteado por sua tia, que despertou nele o desejo por uma vida diferente. Ele chegou à conclusão de que só encontraria satisfação espiritual na Índia com a ajuda de um guru local e decidiu embarcar em uma jornada de três meses por terra para o sub-continente, passando pela Itália, Grécia, Turquia e Paquistão.

Vida na Índia

Uma semana após a chegada na Índia, Hablützel conseguiu encontrar seu guru – Swami Atmananda – e estabeleceu-se no monastério dele na cidade de Calcutá, leste da Índia. Pouco depois de três anos, ele foi ordenado monge hindu e batizado de Swami Jnanananda. Ele viveu uma vida de renúncia, meditando, ouvindo discursos espirituais e fazendo peregrinações a locais sagrados. Ele permaneceu com seu guru por 12 anos, até a morte do mestre. 

Hablützel (à esquerda) com o famoso guru Swami Atmananda (centro) courtesy

Hablützel então tornou-se um nômade espiritual, vagando por locais sagrados como o rio Ganges e os Himalaias, absorvendo os ensinamentos de diversos homens e mulheres santos que viviam por ali. A vida não foi fácil para o jovem monge. Ele dependia da generosidade de estranhos para sobreviver, uma vez que já tinha esgotado todas suas economias. Ele também ficou doente, contraindo difteria, o que o obrigou a só consumir alimentos líquidos por um tempo. Outros perigos incluíam animais selvagens como ursos nas florestas do Himalaia e o risco de picadas de escorpião. Finalmente, ele desistiu do estilo de vida nômade e se estabeleceu em uma cabana numa floresta próxima da vila de Mussoorie, no Garhwal dos Himalaias. Eventualmente, após insistência de um discípulo, ele desceu para a planície, se mudando para a cidade de Dehradun, onde passou seus últimos anos.

“Ele gostava muito de música de devoção e à tardinha os seus seguidores se juntavam a ele para a música da oração”, diz Mishra.   

Hablützel não tinha arrependimentos por ter deixado a Suíça. Ele dizia que a Suíça estava dentro dele. Ele também não lamentava ter sacrificado uma vida confortável na Europa para tornar-se um monge hindu.

“Acredito que chegará um tempo em que apenas aqueles que meditarem serão capazes de dormir à noite. A total dependência do dinheiro e a segurança – que imaginamos que ele traz- é absoluta ignorância, pois temos medo de ficarmos sozinhos, sem possessões materiais”, disse em uma entrevista.

Glossário espiritual:

Ashram: local de retiro espiritual ou residência que seguidores montam para um guru

Guru: líder espiritual e professor, que instrui aqueles buscando iluminação. Pode ser formal, baseado em uma tradição pré-estabelecida, ou informal, baseado em afinidade.

Yogi: praticante de yoga ou outras práticas de meditação relacionadas ao espírito

Swami: um yogi que foi formalmente iniciado em uma ordem monástica por um guru

Sadhu: Aquele que renunciou ao mundo material e vive uma vida de desapego

Sanyassi: Um “desapegado” como um sadhu que participa das dez ordens estabelecidas pelo filósofo hindu Shankara no século oitavo

Hablützel começou como um Yogi e se tornou um Sanyassi, após isso recebeu o nome de Swami Jnanananda e finalmente se tornou um guru no fim da vida. Ele não tinha um ashram mas morava na casa de um discípulo. 


Adaptação: Marina Wentzel

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