Hero aposta em produtos saudáveis e regionais sem destacar raízes suíças

Rob Versloot, diretor-executivo do Grupo Hero desde 2012, explica por que sua empresa optou deliberadamente por não destacar sua herança suíça nem se concentrar exclusivamente no mercado da classe A.
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A maioria das empresas suíças de bens de consumo, como Ricola (pastilhas para tosse), Läderach (chocolate) e Victorinox (canivetes), visa segmentos de mercado premium, capitalizando suas raízes e imagem suíças. O Grupo HeroLink externo, mais conhecido por suas pequenas porções de geleia frequentemente encontradas em hotéis, escolheu uma estratégia bem diferente. Fundada em 1886 em Lenzburg, no cantão de Argóvia, a empresa não promove sistematicamente sua herança suíça, o que resultou em uma falta de reconhecimento das origens suíças da marca em outros países.
Recentemente, a Hero reduziu seu portfólio de produtos e decidiu focar em mercados mais restritos, como Europa e Estados Unidos. Além disso, o grupo otimizou a utilização de seus ativos, o que levou, recentemente, ao fechamento de sua fábrica de geleias em Lenzburg.
Ao mesmo tempo, a empresa segue sua estratégia de aquisições internacionais. Entrevistamos Rob Versloot, diretor-executivo do Grupo Hero desde 2012, na sede da empresa em Lenzburg, para discutir os desafios que a companhia enfrenta e onde ele enxerga o sucesso futuro.

swissinfo.ch: A Hero não é a típica empresa suíça internacional, que tende a focar em segmentos premium. Como vocês se posicionam internacionalmente?
Rob Versloot: A Hero é muito diferente das empresas suíças que enfatizam seu caráter suíço. Nosso grupo é uma “casa de marcas”. Em alguns países, usamos a marca Hero, mas, em muitos outros, operamos com marcas como Organix (alimentos para bebês), Corny (lanches) e Vitrac (geleias). Somos percebidos como uma empresa suíça na Suíça, mas, em outros países, mesmo onde usamos a marca Hero, somos vistos como uma empresa local, sem raízes suíças. Também adotamos uma abordagem premium para alguns produtos e marcas, mas uma abordagem mainstream para outros. Dada essa configuração, acreditamos que usar a marca Hero em todos os lugares seria um erro.
swissinfo.ch: Historicamente, o seu grupo tinha um portfólio muito amplo. Isso mudou. Agora vocês têm um foco mais restrito. Como isso aconteceu?
R.V.: O principal desafio da Hero é selecionar bem as categorias de produtos e escolher os mercados geográficos onde temos o “direito de vencer”, ou seja, um segmento no qual temos grandes chances de ser bem-sucedidos. Como somos menores que nossos principais concorrentes, multinacionais como Nestlé, Danone, Unilever ou Mondelez, nossa estratégia é focar de forma inteligente.
Atualmente, concentramos nossos esforços em três categorias de produtos: alimentos para bebês e crianças, lanches saudáveis e cremes naturais. Esses produtos representam 75% de nossas vendas totais. Como a demanda por produtos saudáveis e por lanches (ou seja, consumo fora das três refeições tradicionais) é forte, vemos grandes oportunidades de crescimento. Para aproveitar ainda mais essas tendências, adquirimos recentemente a Deliciously Ella, uma pioneira britânica em lanches veganos.

swissinfo.ch: Em 2023, 71% das suas vendas foram na Europa, seguidas pela América do Norte (16%). Onde você vê oportunidades futuras para crescimento lucrativo?
R.V.: Nossa estratégia também é focar em alguns países, o que é análogo à nossa abordagem em relação às categorias de produtos. O principal motivo é que vendemos principalmente por meio de supermercados, e, na maioria dos países, as redes de supermercados são altamente concentradas. Na Suíça, por exemplo, Migros, Coop, Aldi e Lidl representam grande parte do mercado. Para negociar com esses gigantes, precisamos de “marcas indispensáveis”, que sejam líderes ou vice-líderes em uma categoria. Especificamente, continuaremos focando na Europa, nos EUA e no Oriente Médio, em vez de mercados emergentes. Vemos muitas oportunidades de crescimento em nossas áreas de força.
swissinfo.ch: Você acabou de fechar sua fábrica de geleias em Lenzburg, o que afetou cerca de 48 funcionários. Acredita que isso impactará a imagem da empresa junto aos consumidores? Seus consumidores se importam onde seus produtos são feitos?
R.V.: Não só não somos percebidos como uma marca suíça (exceto na Suíça), mas a maioria dos consumidores sequer sabe onde nossos produtos são fabricados. Quanto à produção de porções de geleia em Lenzburg, o fechamento ocorreu devido à utilização insuficiente da capacidade. No entanto, mais da metade dos produtos vendidos na Suíça ainda é produzida na Suíça ou em Liechtenstein.

swissinfo.ch: Os consumidores buscam produtos que sejam saborosos e saudáveis. Como vocês garantem que essas condições sejam atendidas? Penso, por exemplo, no teor de açúcar dos lanches para bebês Organix.
R.V.: É possível combinar sabor e saúde. Em muitos de nossos produtos, usamos apenas o açúcar natural das frutas. Até mesmo em nossos cremes, introduzimos versões com baixo teor de açúcar ou sem açúcar, cujas vendas estão crescendo rapidamente.
swissinfo.ch: Na categoria de cremes naturais, que inclui produtos como Hero, Queensberry e Casa de Mateus, muitos consumidores preferem marcas de supermercado, que são mais baratas. Como vocês planejam lidar com essa tendência?
R.V.: Nas categorias de alimentos para bebês e lanches saudáveis, as marcas de supermercado (também conhecidas como “private labels”) têm baixa participação de mercado, já que a maioria dos consumidores prefere marcas confiáveis como a nossa. Na categoria de cremes naturais, as marcas próprias têm maior participação, mas, globalmente, nossos produtos de marca continuam com uma posição muito forte.

swissinfo.ch: Os consumidores estão dispostos a pagar mais por produtos sustentáveis ou com baixo impacto ambiental?
R.V.: A maioria dos consumidores considera a sustentabilidade importante, mas não está disposta a pagar um prêmio por isso. Ainda assim, estamos comprometidos em alcançar zero emissões líquidas de gases de efeito estufa em toda a cadeia de valor até 2050. Também relatamos nosso progresso anual em nosso relatório voluntário de sustentabilidade, com base no ano de 2019.
swissinfo.ch: Quão desafiador é ser responsável por seus fornecedores?
R.V.: Somos 100% responsáveis pelo abastecimento de nossos produtos. Por isso, nossos colegas encarregados do controle de qualidade verificam tanto a conformidade das matérias-primas quanto a qualidade dos produtos acabados antes de serem enviados ao mercado. A segurança alimentar é uma questão muito sensível, especialmente para alimentos infantis. No entanto, apesar de nossos esforços, nenhuma empresa é perfeita. Quando problemas ocorrem, é fundamental ter processos corretos, como informar rapidamente o consumidor e, se necessário, realizar o “recall” (devolução) de produtos.

swissinfo.ch: Quais são as vantagens e desvantagens de ter sua sede em Lenzburg, uma cidade rural com cerca de 10 mil habitantes?
R.V.: Nosso grupo se originou em Lenzburg, mas, como o mercado suíço representa apenas uma pequena parte das vendas do grupo, essa não é a razão de estarmos sediados aqui. No entanto, a Suíça oferece talentos internacionais, uma forte concentração da indústria alimentícia, serviços públicos e infraestrutura excelentes, além de tributação competitiva. Lenzburg está a apenas 20 minutos de Zurique. Atualmente, nossa sede emprega cerca de 60 pessoas.
swissinfo.ch: A Hero não está mais listada na bolsa de valores suíça (SIX Swiss Exchange). Por que vocês ainda publicam relatórios anuaisLink externo detalhados que seus concorrentes provavelmente examinarão?
R.V.: O principal motivo é que acreditamos que a transparência e a publicação deliberada de informações extensas fazem parte de uma boa governança.
swissinfo.ch: Onde você vê a Hero daqui a dez anos?
R.V.: Estou confiante de que definimos a estratégia certa para o futuro e apostamos nas categorias de produtos corretas, especialmente alimentos para bebês e lanches saudáveis. Estou otimista de que continuaremos a crescer.
Adaptação: DvSperling


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