“Swatch quase não têm concorrentes”
Após um longo declínio iniciado em meados dos anos 1990, a marca Swatch poderá atingir este ano um recorde histórico de vendas. Um renascimento que se deve ao lançamento, há dois anos, do “Moonswatch”, mas também a uma inovação industrial que recentemente celebrou seu décimo aniversário.
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Em muitos setores da economia, as empresas suíças são mundialmente conhecidas por seus produtos de alta qualidade. Este é particularmente o caso quando se trata de relógios. No entanto, a indústria relojoeira suíça tenta manter uma forte presença nos segmentos de preços mais acessíveis, sobretudo graças aos relógios Swatch.
Embora os volumes exportados no segmento de entrada tenham sido reduzidos pela metade em vinte anos (de 22,8 milhões de unidades no ano 2000 para 9,3 milhões em 2023), a chegada do “Moonswatch”, uma versão acessível (cerca de 250 francos) do Speedmaster MoonwatchLink externo da Omega, comercializado pela Swatch há dois anos, deu um novo fôlego aos relógios suíços de baixo custo.
Mas a volta por cima da marca SwatchLink externo – que, segundo analistas, pode pela primeira vez, já em 2024, ultrapassar um bilhão de francos em receita – também se deve a uma importante inovação industrial lançada há cerca de dez anos: os movimentos Sistem51Link externo, produzidos e montados de maneira totalmente automatizada, permitiram manter certa competitividade nesse segmento de preço.
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Esses movimentos Sistem51 são produzidos pela empresa ETALink externo, um dos braços industriais do Grupo Swatch. A ETA emprega aproximadamente seis mil funcionários na Suíça, e seus movimentos Sistem51 equipam todos os relógios mecânicos da marca Swatch, incluindo os modelos Scuba Fifty Fathoms, fruto de uma colaboração entre a Swatch e a Blancpain.
Foi no parque industrial das empresas de produção do Grupo Swatch em Boncourt, no cantão do Jura, que Damiano Casafina, diretor-executivo da ETA, recebeu a swissinfo.ch para uma entrevista.
Damiano Casafina ingressou no Grupo Swatch em 2018; desde 2021, ele dirige a subsidiária ETA SA Manufacture Horlogère Suisse, especializada em novas tecnologias de industrialização e na fabricação de movimentos de quatzo e mecânicos Swiss Made em 16 unidades de produção localizadas nas encostas do Jura, bem como nos cantões do Valais e do Ticino.
Anteriormente, Damiano Casafina trabalhou principalmente para a empresa Röhm (tecnologias de fixação) em uma infinidade de países: México, Reino Unido, Polônia, França, Hungria, Cingapura, China, Alemanha e Suíça. Sua formação acadêmica inclui a Escola Superior de Tecnologia e Gestão (esg), a escola de gestão de Swissmem e a escola Minerva.
swissinfo.ch: A ETA raramente recebe a imprensa. Isso se deve ao apreço pelo segredo relojoeiro?
Damiano Casafina: A relojoaria não é tão secreta assim, mas a vocação de uma empresa de produção como a ETA não é ocupar o centro do palco: são as nossas marcas de relógios que devem estar sob os holofotes.
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swissinfo.ch: Como vocês conseguiram alcançar a automação completa da produção e a montagem dos movimentos Sistem51?
D.C.: Os movimentos mecânicos Sistem51, que possuem 17 patentes, são, com efeito, os únicos no mundo a serem produzidos e montados integralmente de forma automática, e seu conceito é único e revolucionário. Para isso, utilizamos recursos tecnológicos e processos únicos no mundo da relojoaria.
Mais especificamente, para realizar essa façanha tecnológica, nossos engenheiros começaram do zero, desenvolvendo um conceito de construção baseado em cinco módulos interdependentes. Isso permitiu reduzir drasticamente o número de componentes, de 150, em um movimento mecânico tradicional simples, para apenas 51.
swissinfo.ch: Por que esses movimentos são únicos no setor?
“A automação completa dos movimentos Sistem51 não reduziu de modo algum o emprego”.
D.C.: Por exemplo, esses movimentos têm apenas um parafuso. Para fixar a maioria dos componentes, recorrermos a processos de soldagem. Para que isso seja possível, desenvolvemos os esboços em uma liga ternária, composta de cobre, zinco e níquel. Além de permitir a soldagem, esse material apresenta a vantagem de não necessitar de tratamento galvânico contra a corrosão.
swissinfo.ch: Considerando que o processo de soldagem é irreversível, como garantir que não haja erros durante a montagem?
D.C.: Controlamos a qualidade em cada etapa e para cada peça. Desenvolvemos um processo no qual cada peça intermediária é fotografada, e algoritmos analisam essas fotos para detectar possíveis defeitos. Em caso de problema, uma operadora ou operador ajusta imediatamente as máquinas, por exemplo, substituindo uma ferramenta desgastada.
swissinfo.ch: Quais são as competências-chave para se alcançar tal automação?
D.C.: O mais importa são as competências humanas. É por isso que um treinamento muito específico tem sido essencial, inclusive para nossos aprendizes, que podem aprender processos exclusivos. Felizmente, a região do Jura está repleta de pessoas altamente qualificadas; também empregamos muitos colegas de países fronteiriços.
swissinfo.ch: Qual é o impacto sobre o emprego devido à automação da produção e montagem?
“Para realizar o feito tecnológico dos Sistem51, nossos engenheiros começaram do zero”.
D.C.: Esta automação completa não reduziu de forma alguma o emprego; no entanto, muitas profissões foram adaptadas. Estou pensando, por exemplo, em mecânicos, polimecânicos, engenheiros de automação, especialistas em qualidade e engenheiros mecânicos.
swissinfo.ch: A automação total tem impacto no percentual de componentes terceirizados, por exemplo, na Ásia?
D.C.: A Swatch produz quase tudo internamente, o que é lógico para uma empresa inteiramente dedicada à relojoaria, com grandes volumes e uma ampla gama de produtos complementares. Em outras palavras, a automação não afetou o grau de terceirização dos componentes. Naturalmente, os movimentos do Sistem51 atendem aos critérios do Swiss Made e são totalmente produzidos e montados na Suíça.
swissinfo.ch: A Swatch poderia implementar um sistema de produção e montagem completamente automatizado no exterior?
D.C.: Essa questão nem sequer se coloca. A Swatch é uma empresa suíça com unidades de produção na Suíça cuja vocação é fabricar relógios de alta qualidade. Por que deveríamos fazer algo no exterior quando dominamos isso perfeitamente bem aqui na Suíça?
swissinfo.ch: Como vocês evitam a imitação de uma automação tão avançada pelos concorrentes?
D.C.: Para alcançar um desenvolvimento tão revolucionário, centenas de pessoas altamente qualificadas trabalharam para resolver uma série de desafios. O investimento em recursos humanos e dinheiro foi colossal, e isso é provavelmente suficiente para desencorajar nossos concorrentes.
De qualquer modo, ninguém ainda imitou um movimento como o Sistem51. Aliás, mesmo no que concerne aos movimentos tradicionais, há muito poucas empresas relojoeiras suíças especializadas nessa área.
swissinfo.ch: Vocês podem quantificar o investimento financeiro necessário para implementar o Sistem51, incluindo seu local de produção e montagem?
D.C.: Não divulgamos essa informação, mas estamos falando de dezenas de milhões de francos suíços, como se pode imaginar.
swissinfo.ch: Os movimentos do Sistem51 poderiam ser usados em relógios mais sofisticados?
D.C.: O movimento Sistem51 foi projetado especificamente para a marca Swatch e não é concebível usá-lo em relógios de última geração. Contudo, ao industrializar o Sistem51, aprendemos muito, o que beneficia muitas outras empresas de nosso grupo.
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Por exemplo, graças ao Sistem51, agora podemos atingir reservas de marcha de 90 horas, ajustar a cronometria a laser (com uma precisão de -5 a +15 segundos por dia) e garantir a estabilidade da precisão ao longo do tempo.
swissinfo.ch: Seria viável para a ETA fornecer serviços de produção e montagem automáticos para outras indústrias?
D.C.: Mesmo que outras empresas nos procurem regularmente, nós nos concentramos no que sabemos fazer melhor, isto é, fabricar relógios.
swissinfo.ch: De maneira geral, quem são os principais concorrentes dos relógios Swatch?
D.C.: Em seu segmento de relógios fabricados na Suíça, a Swatch não tem concorrentes e está sozinha na liderança, graças, em parte, às suas inovações tecnológicas e desempenho únicos. Quando se fala de Swatch, fala-se de grande flexibilidade e criatividade em termos de design e volumes.
Quanto a esse último ponto, também posso assegurar que todas as nossas fábricas estão operando a plena capacidade, e não apenas aquelas envolvidas na fabricação dos relógios MoonSwatch.
Edição: Samuel Jaberg
Adaptação: Karleno Bocarro
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