Suíça calcula perdas e danos do ‘tarifaço’ de Trump

Os exportadores suíços foram nocauteados com um aumento drástico e inesperado de tarifas de até 32% sobre os produtos que vendem nos Estados Unidos. Empresas, políticos e economistas estão se esforçando para calcular o custo exato para o país alpino.
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As consequências de mudanças tarifárias repentinas podem atingir a população comum gerando insegurança em certos empregos e alterando preços de inúmeros produtos.
A imposição de impostos comerciais tão pesados pelos EUA fez com que alguns setores da economia suíça reclamassem, principalmente os setores de relojoaria, máquinas de precisão e dispositivos médicos.
Mas o custo final das tarifas do presidente Trump não será revelado até que se conheça a reação dos países do mundo todo.
Ameaça iminente
Os EUA impuseram tarifas muito mais altas à Suíça do que a outros países da Europa. As exportações da União Europeia enfrentam uma cobrança de 20%, a Grã-Bretanha apenas 10% e a Noruega 16%.
Os cálculos dos EUA que embasam essas taxas (uma resposta às barreiras comerciais percebidas contra os produtos dos EUA) têm sido altamente contestados pela Suíça e por outros países. No entanto, os exportadores suíços enfrentam o duplo golpe do aumento das tarifas e uma desvantagem competitiva com os países vizinhos.
Isso significa que as empresas suíças menores “correm o risco de perder completamente esse mercado [os EUA]”, alertou o grupo de lobby de engenharia tecnológica e ferramentas de precisão Swissmem. Os fabricantes também serão atingidos por uma tarifa separada de 25% dos EUA sobre peças de automóveis.
Quase 17% das exportações de relógios suíços foram para os EUA no ano passado, o que faz do país, de longe, o maior mercado. Os EUA também compraram 23% dos dispositivos médicos suíços exportados.
“As barreiras à exportação não apenas prejudicam as empresas, mas também os empregos, a inovação e a segurança no fornecimento”, disse Adrian Hunn, diretor da Swiss Medtech.
Até o momento, os medicamentos foram poupados das tarifas dos EUA, mas Trump indicou que novas taxas de exportação poderiam ser cobradas em um futuro próximo. No ano passado, a indústria farmacêutica suíça vendeu para os EUA quase metade de todo o valor das exportações do setor (CHF 31,2 bilhões).
Perdas e danos
Para as empresas menores que dependem do mercado dos EUA, mas não têm instalações de produção no país, as tarifas dos EUA são uma ameaça concreta.
A medida do governo estadunidense pode gerar um impacto potencialmente negativo sobre os empregos nos próximos meses na Suíça. A Swissmem solicitou ao governo que permita que mais trabalhadores tenham suas horas de trabalho reduzidas subsidiadas pelo Estado.
Cerca de um terço das 1.300 empresas representadas pelo grupo de lobby de engenharia mecânica Swissmechanic já havia reduzido as horas de trabalho dos funcionários antes do anúncio das tarifas.
A taxa de desemprego na Suíça, de 2,9%, é atualmente menos problemática do que em países vizinhos, como a Alemanha. O Instituto Econômico Suíço KOF previu no mês passado que a taxa de desemprego atingiria um pico de 3% este ano, mas esse número ainda não foi atualizado desde que as tarifas foram anunciadas.

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O que são as tarifas aduaneiras?
Os sindicatos ainda não parecem alarmados. “As tarifas dos EUA são, de fato, um incômodo para a indústria de exportação suíça. Mas dramatizá-las em excesso é inapropriado”, escreveu o economista-chefe da Federação Sindical Suíça, Daniel Lampert, em um post no blog.
Em outubro, a KOF divulgou cálculos de como as tarifas previstas dos EUA poderiam afetar a Suíça. Partindo do pressuposto de uma tarifa de 60% contra os produtos chineses e de 20% para o resto do mundo, a KOF previu que o crescimento econômico da Suíça diminuiria entre 0,2% e 0,3%.
Essa queda equivaleria a uma perda econômica anual de CHF 200 por habitante. Em entrevista à emissora pública suíça SRF, o economista da KOF, Hans Gersbach, disse que a tarifa de 32% tem o potencial de resultar em perdas maiores.
O que a Suíça vai fazer?
A resposta suíça às tarifas alarmantemente altas foi tipicamente subestimada, ao contrário de outros países.
A China entrou com uma ação na Organização Mundial do Comércio (OMC) e impôs tarifas de 34% sobre as exportações dos EUA. O Canadá também ameaçou com tarifas retaliatórias.
Taiwan e Espanha anunciaram apoio financeiro do Estado para proteger os setores atingidos pelas tarifas dos EUA.
A presidente da Suíça, Karin Keller-Sutter, declarou em uma coletiva de imprensa que a versão americana de condições comerciais “injustas” com a Suíça era semelhante a fazer com que “um mais um fosse igual a três”. No entanto, ela alertou que uma retaliação impulsiva poderia causar danos maiores à economia.
Em vez disso, o governo optou por analisar o impacto das tarifas de forma “mais detalhada” antes de tomar uma decisão. O Ministério da Economia também foi encarregado de “iniciar os trabalhos preparatórios para uma possível solução com os EUA”.
A Suíça declarou que está “comprometida com mercados abertos, condições estruturais estáveis e segurança jurídica”.
Lado positivo?
Desde que o mundo não entre em uma guerra comercial total, a Suíça está razoavelmente bem posicionada para absorver o pior impacto das novas tarifas dos EUA, disse Stefan Gerlach, economista-chefe do banco EFG, à SWI swissinfo.ch.
O franco forte dá às exportações suíças alguma vantagem sobre os concorrentes da zona do euro. E os clientes globais devem manter o apetite por produtos suíços de alta qualidade, mesmo que os preços sejam mais altos.
“As exportações suíças em geral, e particularmente as de artigos de luxo, não são muito sensíveis a preços. Os fabricantes podem contornar os problemas redirecionando seu comércio para outros países, especialmente na Europa”, disse ele.
Ele também espera que os consumidores dos EUA sofram o impacto do aumento dos preços dos produtos, que será repassado em parte pelos fabricantes.
“Um resultado mais provável é o efeito deflacionário da interrupção do comércio, que poderia contrair o crescimento econômico em todo o mundo”, disse Gerlach
“Na pior das hipóteses, a recessão global, impulsionada por tarifas internacionais retaliatórias e uma escalada dos EUA, poderia trazer graves consequências para um país dependente de exportações como a Suíça. Mas, no momento, estamos muito longe de tal situação”, acrescentou.
A OMC estima que as tarifas de Trump vão reduzir o comércio global em cerca de 1% este ano.
Edição: Marc Leutenegger/fh
(Adaptação: Clarissa Levy)

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