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A Suíça é severa com os “propagadores” da Aids

Especialistas de todas as partes do mundo participam da conferência no México. Keystone

Os especialistas reunidos na Conferência Internacional sobre Aids, que termina nesta sexta-feira no México, discutiram a criminalização da transmissão do vírus. ONGs helvéticas denunciam o recrudescimento das leis.

Os profissionais da prevenção não deixam de ter humor ou gostam de fazer referências. No México, durante o quarto dia da 17ª Conferência Internacional de Aids, um tema debatido era intitulado, de uma forma quase shakespeariana, “Transmitir ou não transmitir – é essa verdadeiramente a questão? Criminalização da transmissão do HIV”.

Isso, pois vários especialistas e, sobretudo, membros das ONGs, denunciam uma “criminalização crescente” das relações sexuais não protegidas. Essa é a opinião da “Ajuda Suíça contra a Aids” (ASS, na sigla em francês). “Condenar pessoas pela transmissão do vírus é uma falsa mensagem de prevenção”, declara Thomas Lyssy, porta-voz da ONG. “Isso significaria dizer que as pessoas que são seronegativas não deveriam se preocupar e não exigir o preservativo.”

Negligência…culpável

De fato, essa é a conclusão a que se pode chegar após a leitura de uma recente sentença do Tribunal Federal (a instância mais elevada da justiça helvética). Ela demonstra um recrudescimento inegável da jurisprudência sobre a questão.

Durante o processo em segunda instância, um zuriquense foi condenado por ter contaminado sua parceria com o vírus do HIV. O Tribunal Federal havia justificado que o acusado de 76 anos, mesmo sem saber que era seropositivo (uma outra parceira ocasional havia dito precedentemente que tinha o vírus), teria que ter comunicado à sua nova parceira a possibilidade de contaminação e pedido a ela para respeitar as regras do “sexo seguro”.

Quando os juízes do supremo dão razão à ASS, que propaga as regras do “sexo seguro”, como o uso do preservativo, por que então esconder esse veredicto? “Pois os juízes não levam em conta o fato de que a parceira contaminada havia aceitado ter relações sexuais não seguras, ou seja, ela não respeitou as regras básicas do chamado “safer sex”, avalia Thomas Lyssy.

A negligência se transformou, nesse contexto, em um motivo de condenação. O Tribunal Federal estima hoje em dia que as pessoas possam ser condenadas por lesões corporais graves, se for provado que houve negligência na transmissão do vírus.

Severidade helvética

A jurisprudência na Suíça só surpreende quando vista em contexto internacional, como foi apresentado na México, sob um título quase cinematográfico – “Sex, lies and prosecutions” (Sexo, mentiras e ações judiciais): junto com a Áustria e a Suécia, a Suíça é o país europeu que condena mais severamente a transmissão do vírus da Aids.

Mais de 30 processos foram contabilizados para cada um desses três países, contra menos de cinco condenações na França, por exemplo. Na Suíça, que é o primeiro país a ter julgado um tal caso (há 16 anos), mais de vinte pessoas já foram condenadas.

Thomas Lyssy, da ASS, não consegue explicar essa situação. O estudo mostra que, de forma global, as condenações marginalizam geralmente as pessoas que não têm uma boa integração social na Suíça, em grande parte os estrangeiros. Mas na Suíça, a maior parte das condenações foi de pessoas com o passaporte vermelho e a cruz branca.

Contra a penalização

Segundo a ASS, a transmissão da Aids não deveria nunca ser motivo de uma condenação penal. “O Código Penal não deveria substituir a prevenção”, ressalta Lyssy.

No contexto da revisão da Lei sobre as Epidemias, a ONG pede que o Art. 231 do Código Penal (propagação de uma doença humana perigosa e transmissível) não seja mais aplicável aos casos de infecção com o vírus HIV.

“Infelizmente, não podemos fazer nada contra a utilização do Art. 122, que sanciona lesões corporais graves”, acrescenta o porta-voz, “porém nós pedimos que esse motivo só seja incluído no caso de transmissão voluntária como, por exemplo, por vingança ou pura maldade.”

swissinfo, Ariane Gigon

17ª Conferência Internacional de Aids ocorre de 3 a 8 de agosto no México.

Segundo um estudo realizado em quarenta países europeus sobre as modalidades de ações judiciais e condenações relacionadas à transmissão do vírus da Aids, a Suíça faz parte dos países mais severos nesse campo.

Junto com a Áustria e a Suécia, a Suíça já contabiliza mais de 30 processos pela transmissão do vírus, contra menos de cinco condenações na França, por exemplo.

Mais de 20 acusados foram condenados na Suíça a penas que levam até ao encarceramento.

A Suíça foi o primeiro país a julgar alguém nesse domínio. O primeiro processo ocorreu em 1988.

Segundo a ONG “Ajuda Suíça contra a Aids”, cinco pessoas foram julgadas entre setembro de 2003 e setembro de 2004, das quais quatro foram condenadas. Isso marca um aumento dos processos na Justiça.

Estima-se em 13 mil o número de pessoas que vivem com o vírus do HIV na Suíça.

Dois artigos do Código Penal podem ser utilizados para julgar e condenar a propagação do HIV: o Art. 22 sobre lesões corporais graves e o Art. 231, sobre a propagação de uma doença humana.

O Tribunal Federal (instância suprema da justiça na Suíça) julgou há pouco tempo que a negligência também pode ser motivo de condenação. Qualquer pessoa que mantenha relações sexuais não protegidas, apesar de um estilo de vida potencialmente arriscado, pode ser condenado por lesões corporais graves se transmitir o vírus.

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