Canarinhos deixam saudade em Weggis
Foram apenas duas semanas de sonho, mas o suficiente para transformar os habitantes de Weggis em torcedores da seleção canarinho.
Se o Brasil ganhar na Copa, o vilarejo suíço pode até se transformar em local de romaria. Leia aqui uma crônica do absurdo, engraçado e lucrativo em Weggis.
A festa acabou em Weggis. Os porcos de Alfred Stückli já podem retornar ao terreno localizado nas proximidades do Estádio Thermoplan, utilizado nos treinos da seleção brasileira por duas semanas. Ele havia esvaziado a pocilga para não incomodar ninguém com o cheiro dos animais.
O balneário suíço volta ao seu ritmo normal, tão tranqüilo como as águas do Lago dos Quatro Cantões. Muitos dos habitantes estão aliviados pelo fato de Weggis não estar mais no umbigo do mundo esportivo. Apenas alguns jovens do time local lembram com saudade que Ronaldinho e Ronaldo estiveram jogando naquele gramado verde, tão próximos a ponto de poder encostar neles. A febre do futebol tomou conta até das meninas de Weggis, como aquelas que passaram vários dias dando embaixadinhas na entrada da sala da imprensa e posando para os jornalistas.
Na despedida em 4 de junho, o técnico Carlos Alberto Parreira e Cafu, capitão da seleção brasileira, agradeceram. “As condições foram perfeitas. Todos os nossos pedidos foram atendidos. Apenas o tempo ruim não deu para controlar”, declarou Parreira. Para Cafu, o mais importante foi o contato com a torcida. “Nós sentimos aqui o calor da torcida. Foi um bom preparo para a Copa”.
Também Ronaldinho, o jogador mais bem pago da seleção brasileira, não poupou elogios. “Nessa fase dura de preparação, acho que foi bom sentir o carinho de todo mundo, incentivando a gente”, disse à swissinfo, sem sequer reclamar do assédio pesado durante as duas semanas em Weggis. “Nós brasileiros temos esse costume de contato intenso com a torcida”.
Fatos esdrúxulos
Idealizada como treino, o pré-Copa em Weggis acabou se transformando numa mistura de espetáculo e carnaval fora de hora. Só o final do torneio pode dizer se as duas semanas foram positivas para a seleção brasileira.
A única certeza é que a equipe ganhou simpatia internacional pela sua abertura e contato com o público. Outras, como a alemã e a holandesa, também treinaram na Suíça, mas em total reclusão. Alguns jornalistas se perguntavam “o que eles estariam escondendo”.
O verde-amarelo se transformou mais uma vez nas cores do verão. Nas arquibancadas em Weggis o que mais se via eram crianças européias vestindo a camisa da seleção e gritando o nome dos jogadores. Ronaldinho era o mais aclamado. Ele também percebeu que até na Suíça, terra onde a população geralmente adora ignorar celebridades, ele é visto como um semideus. Todos procuraram tocá-lo, tirar fotos ao seu lado ou mesmo aproveitar um pouco da sua imagem. Alguns até exageravam.
Ao chamar o cabeleireiro Beat Fuchs para dar uma encurtada na sua juba, Ronaldinho não podia esperar que o salão e o jornal sensacionalista suíço “Blick” iriam sortear duas mechas suas. Centenas de interessados participaram da loteria eletrônica enviando torpedos pelo celular. Por sorte do jogador, dessa vez o objetivo não era ganhar com a sua imagem: os lucros da ação foram revertidos para a Liga do Câncer da Suíça.
O Park Hotel Weggis também tentou faturar. Apenas poucas horas depois da partida da Seleção Brasileira, o estabelecimento de cinco estrelas estava recebendo um grupo seleto de torcedores, que havia comprado através do site de leilões eBay um pernoite nos quartos utilizados por alguns dos jogadores.
O quarto do ronaldo levou a maior soma: 1.010 francos suíços. Em segundo lugar ficou o quarto do Ronaldinho, onde o comprador desembolsou 850 francos. Mais barato terminaram sendo os quartos de Kaka, Adriano e Roberto Carlos
No total, o leilão resultou em 3.200 francos, soma entregue posteriormente por Peter Kampfer, diretor do hotel, ao técnico Carlos Alberto Parreira. O dinheiro será revertido para a entidade de assistência brasileira Água Viva, fundada por um cidadão suíço.
Para os compradores dos quartos, a alegria não ficou apenas em sentir o “espírito” da seleção nos quartos, mas sim através das camisas autografadas pelos jogadores entregue a cada um deles.
Pagode para relaxar
Apesar do cerco dos jornalistas e da intensidade dos gritos das tietes nas arquibancadas, Weggis conseguiu relaxar e animar os jogadores brasileiros. Um dos fatores primordiais foi a trilha sonora tocada na concentração e também nas barraquinhas do camelódromo.
No único dia que a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) autorizou os jornalistas a visitar os jogadores no Park Hotel Weggis, em 2 de junho, Ronaldinho não escondeu como ocupava suas horas livres. “Aqui a gente está sempre fazendo pagode”, contou o jogador.
Outros jogadores preferiram organizar campeonatos de playstation e de ping-pong. Juninho Pernambuco foi o campeão de um deles. Ele revelou seu segredo: – “Apostei na agressividade já que não era favorito”. Dessa forma o meia desbancou Ronaldo. Sua maior inspiração foi o tenista Guga, como revelou à swissinfo (ouvir o áudio).
Roberto Carlos e um grupo de jogadores preferiam escapar da vida espartana na concentração. Eles viraram manchete no “Blick” ao se mostrar na noite de Lucerna e por uma historia, não confirmada, de uma noite “quente” passada com duas torcedoras brasileiras (ver reportagem “Pega na mentira”). Detalhe picante da história: eles haviam contado aos jornalistas e treinadores que iriam passar a noite de folga no hotel.
Romaria do esporte
As duas semanas em Weggis foram um bom negócio para CBF. Além de não ter tido gastos com a seleção, ela ainda recebeu 3,5 milhões de francos: 1,5 milhões de francos suíços em espécie e mais 2 milhões pelos direitos de transmissão de TV.
O valor não é tão impressionante levando-se em conta o que ela ganhou da TV Globo pelo direito exclusivo de transmissão dos jogos da seleção brasileira: 100 milhões de francos suíços.
A Kentaro Group, empresa que organizou a vinda da seleção, os 14 treinos e os dois amistosos, teve um faturamento de 17 milhões de francos. Segundo o jornal Blick, o lucro deve ter sido de dois milhões. O diretor Philippe Huber já havia explicado à swissinfo o motivo da alegria: “…nada mal para apenas dez dias de trabalho”. Só o amistoso entre o Brasil e a Nova Zelândia chegou a ser transmitido por 100 estações de TV.
O único ator a não ter lucros com a festa em Weggis foi o comitê de organização. Apesar da boa movimentação nas barracas, o prejuízo ficou na faixa de 100 mil francos no orçamento de um milhão. Devido ao mau tempo, 50 mil francos deixaram de ser recolhidos no estacionamento improvisado. O trabalho da polícia também custou 50 mil. Porém a prefeitura já declarou que irá cobrir o que falta. Afinal, nunca se falou tanto de Weggis no mundo.
Weggis rejuvenesce
A fama que Weggis ganhou durante as duas semanas se vê nos números: 112 mil visitantes, 900 jornalistas de várias partes do mundo e 35 mil pernoites, o que representa uma lotação de 85%, rara nessa época do ano.
Para Dominic Keller, diretor da Secretaria de Turismo de Weggis, um dos resultados mais positivos para o vilarejo é o “rejuvenescimento” da sua imagem. “Muitos das crianças e jovens que vieram nesse dias, ficaram tão felizes com o evento que já disseram que vão voltar para Weggis”.
Para desenvolver o “turismo esportivo”, a prefeitura da cidade assinou um contrato de dez anos com a Kentaro Group, onde a agência de marketing esportivo tem exclusividade no uso do campo de futebol para a organização de eventos internacionais. Em julho já está programada a vinda do Olympique Lyonnais, o time campeão do futebol francês, que irá se preparar durante três dias no local para o próximo torneio.
Se o Brasil ganhar a Copa do Mundo, Edwin Rudolf, presidente do comitê de organização, promete que irá organizar uma segunda festa brasileira. Talvez Weggis se transforme num local de peregrinação para os fiéis da bola.
swissinfo, Alexander Thoele
Weggis deu lucro à CBF. No total, ela desembolsou 3,5 milhões de francos: 1,5 milhões em dinheiro e mais 2 milhões de francos pelos direitos de transmissão de TV.
A Kentaro Group, empresa que organizou a vinda da seleção, os 14 treinos e os dois amistosos, teve um faturamento de 17 milhões de francos. O lucro deve ter sido de 2 milhões.
Para Weggis o evento foi um sucesso: 112 mil visitantes em duas semanas, 900 jornalistas de várias partes do mundo e 35 mil pernoites, o que representa uma lotação de 85%, rara para essa época do ano.
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