Clubes não querem pagar gastos com hooligans
A violência nos estádios suíços e imediações ocasionam custos de segurança cada vez mais altos. Em vários cantões (estados), as autoridades estimam que não cabe ao contribuinte pagar os custos dos hooligans.
Se não cabe ao contribuinte, então quem vai pagar? Os clubes pretendem que sejam as autoridades, mas estas se recusam.
A violência em torno dos eventos esportivos continua a suscitar debates e divergências na Suíça. Recentemente, 26 hooligans de Basiléia (noroeste) foram condenados por participar das violências escandalosas ao final da partida de futebol entre Basiléia e Zurique, em 13 de maio de 2006.
As imagens desses confrontos entre torcedores do Basiléia e policiais foram vistas em todo o país e colocaram em cena o problema difícil da violência no esporte.
Atualmente o problema do hooliganismo continua sem solução. Praticamente todos os finais de semana ocorrem incidentes em estádios suíços de futebol e de hóquei no gelo. Os custos de mobilização de policiais e de danos materiais são cada vez mais altos.
Braço de ferro em Neuchâtel e Friburgo
No cantão de Neuchâtel, as autoridades reagiram e resolveram cobrar do FC Neuchâtel Xamax 60% a 80% dos custos de segurança, ou seja, de 300 mil a 400 mil francos suíços por ano. “É intolerável”, afirma Silvio Bernasconi, que estima que o clube já tem uma carga fiscal pesada imposta pelas autoridades cantonais e comunais.
Silvio Bernasconi ameaça se demitir da presidência do Neuchâtel Xamax – e com ele todo o conselho de administração – se o governo não voltar atrás. Se a demissão ocorrer, um dos clubes mais emblemáticos do futebol suíço poderá morrer. Bernasconi é um dos homens mais ricos de Neuchâtel e mecenas do clube.
No cantão de Friburgo, as autoridades querem cobrar os custos de segurança do clube de hóquei HC Gottéron, especialmente nos clássicos com maior rivalidade com o clube de Berna. Na temporada 2007/2008, os custos da mobilização policial das cinco partidas contra o CP Berna foram de 430 mil francos.
Um debate democrático
“É inimaginável pagar despesas adicionais. Seria o fim do Gottéron na Liga Nacional A” (ndr.: elite do hóquei suíço), adverte o presidente do clube, Daniel Baudin. O secretário de Segurança, Erwin Jutzet, tenta acalmar os ânimos. “Queremos simplesmente abrir um debate democrático. Cabe aos cidadãos decidir se consideram normal pagar as despesas ocasionadas por um clube que, certamente, é uma glória do cantão, mas que também deixa muita gente indiferente.”
As federações apóiam o combate dos presidentes de clubes. “A segurança fora dos estádios é incumbência dos poderes públicos. Todo tipo de manifestação deve ser tratada da mesma maneira”, afirma Edmond Isoz, presidente da Liga Suíça de Futebol.
A mensagem é a mesma na Liga Suíça de Hóquei, que lembrou às autoridades de Friburgo o dever oficial em matéria de segurança pública.
No cantão de Berna, onde cinco clubes de futebol e de hóquei jogam na elite (FC Young Boys, FC Thun, CP Berna, HC Langnau e HC Biel), a polícia cantonal manda as contas de seus serviços às cidades de origem dos clubes. Até agora, a administração comunal transferiu os custos para os respectivos clubes.
“São somas enormes que não teríamos como pagar”, afirma Daniel Villars, presidente do HC Biel, promovido recentemente à elite do hóquei suíço. “Temos a sorte de contar com o apoio das autoridades da nossa cidade, o que nem sempre é o caso alhures.”
Diferença de tratamento
A diferença de tratamento de uma região a outra provoca problemas de equidade financeira que acabam incidindo sobre a equidade esportiva, segundo Edmond Isoz. “O federalismo nesse caso é nocivo. É necessária uma harmonização entre os cantões”, concorda Erwin Jutzet. De fato, as somas em jogo são importantes para os clubes, que geralmente têm dificuldades orçamentárias.
Em Basiléia, onde a violência em torno dos jogos de futebol está freqüentemente nas páginas dos jornais, o clube paga 2,20 francos por ingresso no estádio e mais uma soma fixa de 100 mil francos para as partidas consideradas de risco, para cobrir uma parte dos custos de segurança.
Esse tipo de acordo também foi concluído em Lucerna. No entanto, muitos clubes não querem aumentar o preço dos ingressos, temendo ver as arquibancadas vazias. Os torcedores já pagam mais para assistir aos jogos, pois o preço dos ingressos subiu nos últimos anos com a construção de novos estádios.
Uma luta onerosa
A luta contra o hooliganismo é cara, mas o fenômeno ultrapassa em muito o contexto esportivo e deve, portanto, ser assumido pelos poderes públicos, na opinião dos meios esportivos, se possível de maneira eficaz. “Se houvesse uma verdadeira vontade política, o problema teria sido resolvido há muito tempo”, afirma Edmond Isoz.
As federações não teriam também um papel a desempenhar na erradicação da violência em torno dos estádios? “Podemos elaborar regulamentos e sancionar severamente os clubes, mas cabe aos poderes públicos resolver esse problema social”, responde o presidente da Liga Suíça de Futebol.
“Edmond Isoz não está errado”, afirma o secretário do cantão de Friburgo, Erwin Jutzet. “A pequena minoria de fanáticos que causa transtornos freqüentemente nada tem a ver com o esporte. Mesmo assim, não se pode tirar totalmente a responsabilidade dos clubes.”
swissinfo, Samuel Jaberg
Em 2006, o Parlamento aprovou um pacote de medidas para lutar contra a violência durante a Eurocopa 2008 e o Campeonato Mundial de Hóquei em 2009.
Entre as medidas estão a criação de um banco de dados para os hooligans, obrigatoriedade de se apresentar à polícia antes dos jogos e proibição de viajar para o estrangeiro para ver um jogo.
Essas medidas têm prazo limitado a dezembro de 2009, devido a dúvidas sobre a constitucionalidade de certos artigos.
Dada a competência estadual em matéria de policial, o Parlamento considerou que cabe aos estados (cantões) formular um acordo intercantonal com as mesmas medidas. A maioria dos estados já adotou essas medidas.
Na parte francesa da Suíça, um grupo de trabalho tem mandato da Conferência latina dos secretários de justiça e polícia elabora atualmente um projeto para obrigar os clubes a arcar com alguns custos dos excessos de seus torcedores.
Vários países europeus aprovaram leis específicas para combater o hooliganismo.
A Inglaterra, confrontada a uma onda de violência nos anos de 1980, foi o primeiro país a adotar medidas muito severas para contê-la.
De maneira geral, os custos de segurança são assumidos pelo poder público nos vizinhos europeus.
Na França e na Alemanha, o Estado assume os custos de segurança fora dos estádios. Os clubes são responsáveis por garantir a ordem dentro dos estádios, como é o caso na Suíça.
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