Eles dariam a vida pelo Papa (III)
Depois dos escândalos, a Guarda Suíça Pontifícia quer se modernizar para atender às exigências atuais da segurança.
Os recrutas ganham o correspondente à 1.300 dólares, mas não pagam nenhum centavo de impostos sendo cidadãos do Vaticano. Para os recrutadores, o principal atrativo do posto é “estar perto” do Papa.
A Guarda Suíça resolveu passar a limpo sua história e quer se modernizar.
Os primeiros sinais de que essa várias vezes centenária instituição está se arejando foi o engajamento do primeiro soldado de pele escura na Guarda Suíça.
Dhani Bachmann, um jovem de 23 anos, adotado por pais suíços depois de ter nascido na Índia, fez seu juramento em maio e pretende servir pelo menos dois anos.
“Esse processo foi complicado pois os soldados da Guarda Suíça devem ser homogêneos. Para mim, apesar da sua aparência estrangeira, Bachmann é um suíço como os outros. Além disso, ele cumpre todos os requisitos de admissão”, explica Karl-Heinz Früh, responsável pelo Centro de Informações e Recrutamento da Guarda Suíça (IRS), em Neuhausen am Rheinfall, uma pequena cidade localizada na fronteira com a Alemanha.
Outro sinal é a formação profissional dos soldados. Agora, montar guarda com o uniforme tradicional em locais estratégicos do Vaticano e servir de modelo para turistas do mundo corresponde apenas a 30% das tarefas da Guarda Suíça.
A maior parte do tempo é dividido entre serviços diversos para o Papa como guarda em visitas de autoridades, acompanhamento de viagens internacionais ou a segurança do Papa em civil, misturando-se com as multidões na Praça de São Pedro. Nesse caso o soldado da Guarda Suíça atua como um guarda-costas, equipado com armamento e modernos equipamentos de comunicação.
“Poucos sabem, mas o trabalho dos soldados está continuamente sob grande pressão. As trocas de posto são feitas pontualmente e os jovens têm de correr para substituir um colega que encerra o serviço. Tudo é organizado para garantir a segurança do Papa”, conta Karl-Heinz Früh.
Cursos de especialização em segurança
Com os escândalos e a dificuldade crescente de encontrar vocações religiosas na juventude, a Guarda Suíça precisa se tornar mais atraente para os suíços. O mais difícil é convencê-los a trocar os elevados salários na economia privada pelos soldos limitados do Vaticano.
“Um recruta ganha o correspondente a 1.300 dólares. O salário não é realmente um atrativo, porém lembro sempre aos candidatos que os soldados não precisam pagar impostos sendo cidadãos do Vaticano. No final das contas, o dinheiro possibilita um nível de vida normal para a Itália”.
Outra tentativa é melhorar a inserção profissional dos soldados, depois que eles abandonam o serviço ativo.
Depois de três anos (o período mínimo de serviço é de dois), os soldados têm a possibilidade de prestar concurso para receber o Diploma de “Agente Federal de Segurança”, reconhecido na Suíça. Em 2002, três soldados da Guarda Suíça conseguiram ser aprovados.
“Uma grande parte dos jovens suíços que atuam no Vaticano vai trabalhar posteriormente na área de segurança, seja na polícia ou em empresas particulares. Esse diploma possibilita até o trabalho autônomo como agente”, conta Früh.
Para apoiar ainda mais as condições de vida dos soldados da Guarda Suíça até mesmo uma fundação foi criada. Seus membros são personalidades como Flavio Cotti, antigo presidente da Confederação Suíça, Daniel Vasella, presidente do gigante do setor químico-farmacêutico Novartis.
No ano passado ela conseguiu angariar fundos para montar uma sala de musculação na caserna da Guarda Suíça. Outra tarefa foi a profissionalização do recrutamento, com a impressão de material de propaganda e a criação de um serviço de “head-hunter”, ou seja, profissionalizar a seleção (e evitar que outro Cédric Tornay surja no Vaticano).
Poucos podem ir para o Vaticano
Servir em Roma e trajar o uniforme desenhado pelo próprio Michelangelo é um privilégio para poucos.
As exigências no recrutamento são muitas e lembram os requisitos de outras guardas pretorianas: os recrutas precisam ser cidadãos suíços, saudáveis, solteiros, católicos, ter mais de 1,74 de altura, ficha “limpa” na polícia, ter concluido uma formação profissional, ter entre 19 e 30 anos e ter realizado o curso de formação básica do exército suíço.
Atualmente 110 soldados da Guarda Suíça estão servindo em Roma. “Esse é o número máximo, pois não dispomos de mais alojamento ou espaço”, completa Früh.
O período mínimo de serviço é de dois anos. Nesse tempo, o recruta divide com outro colega um quarto na caserna no Vaticano e pode ter uma jornada de trabalho que ultrapasse 12 horas por dia, caso alguém fique doente. Depois do prazo mínimo de desligamento, o soldado da Guarda Suíça pode continuar servindo, tendo a possibilidade de subir na hierarquia militar.
Porém nem o pagamento, nem as condições de trabalho parecem espantar os novos candidatos.
“Na seleção eu explico já de antemão que servir na Guarda Suíça é um privilégio, o privilégio de estar próximo do Papa João Paulo II”, conclui Karl-Heinz Früh.
swissinfo, Alexander Thoele
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